Correio braziliense, n. 19853, 30/09/2017. Política, p. 2

 

Plenário do Supreomo deve rever caso Aécio 

Natália Lambert 

30/09/2017

 

 

Os presidentes do STF, Cármen Lúcia, e do Senado, Eunício Oliveira, definem que a Corte analisará, em 11 de outubro, a suspensão do senador mineiro. Votação prevista no Congresso, assim, deve ser adiada

Diante do conflito causado entre o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Senado por causa da decisão da Primeira Turma da Suprema Corte de suspender o senador Aécio Neves (PSDB-MG) do mandato, os presidentes das duas instituições — ministra Cármen Lúcia e Eunício Oliveira (PMDB-CE) — chegaram a um entendimento. O plenário do STF julgará, em 11 de outubro, a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5.526, que pede à Corte que analise a possibilidade ou não do afastamento de um titular de mandato parlamentar. A análise dos 11 magistrados deve rever a decisão sobre o senador mineiro. Expectativa é de um placar próximo de 7 a 4 a favor do congressista.

A ação ajuizada pelo PP, PSC e o Solidariedade estava parada no Supremo desde maio de 2016, logo após o afastamento do deputado cassado Eduardo Cunha da Presidência da Câmara. A intenção dos partidos é que as medidas cautelares previstas no Código de Processo Penal impostas as parlamentares também tenham que ser autorizadas pela casa legislativa correspondente. O relator, ministro Edson Fachin, liberou o caso para julgamento ontem e a data foi marcada, em seguida, pela presidente do tribunal. Na última quinta-feira, Cármen Lúcia disse que tratará o tema como “prioridade”. “Se Deus quiser, será breve (o julgamento)”, comentou.

A partir do agendamento, a tendência é que Eunício adie a votação no plenário do Senado, prevista para a terça-feira, que pretendia dizer “não” à determinação do STF, o que causaria mais desconforto entre os poderes. Na última sessão, a proposta foi levantada por alguns senadores que alertavam à necessidade de pacificar a questão e aguardar o pleno do STF, considerando que a suspensão do mandato e a determinação pelo recolhimento noturno de Aécio teve o aval de somente três dos cinco ministros da Primeira Turma (Rosa Weber, Luiz Fux e Luís Roberto Barroso). “É de bom alvitre esperarmos pela decisão plenária do Supremo antes de assumirmos uma decisão aqui”, apelou o senador Antônio Carlos Valadares (PSB-SE), na última quinta-feira pela manhã.

Fato consumado

Entretanto, o líder do PSDB no Senado, Paulo Bauer (SC), discorda do adiamento, já que a decisão a ser tomada pelo plenário está baseada em cima de um fato consumado e não em uma condicionante. “Postergar essa decisão seria não cumprir o que está estabelecido na Constituição, que é o dever do Senado de analisar o pedido de prisão. Não há por que retardar uma decisão por causa de uma condicionante. Há um senador privado de liberdade. O Senado tem que se manifestar. Essa é a regra constitucional. Não podemos nos subordinar a um calendário de votações do Supremo”, afirmou.

De acordo com um peemedebista ligado a Eunício, que prefere o anonimato, há um entendimento entre o presidente do Senado e a ministra para que se espere a votação no plenário do Supremo e, caso o PSDB insista em votar a determinação do Supremo na terça-feira, o movimento será prejudicial ao senador mineiro. “Só se eles quiserem fritar o Aécio”, comentou.

Até Renan Calheiros (PMDB-AL), um dos senadores mais contundentes na defesa da votação em plenário, acalmou os ânimos após o agendamento do Supremo. Em vídeo publicado no Twitter, o peemedebista elogiou a postura da presidente do STF e criticou outros magistrados. “Como constituinte, nunca imaginei estar vivo para ver constitucionalistas conhecidos, ministros do STF, graças a Deus, uma minoria, nomeados para fazer o controle constitucional, dizerem que se pode colocar o Código de Processo Penal acima da Constituição. Ora, se o mandato é intangível e há na lei maior uma regra de ouro que diz que só a casa legislativa dele pode dispor, paciência”, destacou.

“Liberou geral”

Já o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) é contra a ADI que será apreciada pelo Supremo. Segundo o parlamentar, o que a ação pede é, na verdade, um “liberou geral”, porque toda medida cautelar que tiver de ser tomada contra um congressista terá de ser aprovada pelos seus pares. “A aprovação dessa ação é o início para a consolidação do fim da Operação Lava-Jato”, disse. Randolfe acrescentou que pedirá ao STF que julgue também uma ação apresentada pela Rede neste ano que pretende que os crimes dispostos no parágrafo 2º, do artigo 53 da Constituição sejam só os relacionados ao mandato e não aos crimes comuns.

Na última terça-feira, a Primeira Turma do STF decidiu por maioria afastar o senador Aécio Neves do mandato e determinou o seu recolhimento noturno. A ação em análise era um pedido da Procuradoria-Geral da República para que Aécio fosse preso por causa de um suposto pedido de propina ao empresário Joesley Batista. O senador mineiro foi gravado durante uma conversa com o dono da JBS na qual pedia R$ 2 milhões para pagar os advogados que o defendem na Operação Lava-Jato. De acordo com as investigações, o dinheiro seria retribuído com favores no Congresso. Aécio afirma que fez um pedido de empréstimo “a um amigo” sem qualquer contrapartida e teria oferecido, inclusive, um apartamento da família em troca.

O que está em análise?

» De acordo com o Artigo 53 da Constituição Federal, os membros do Congresso não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável. “Neste caso, os autos serão remetidos dentro de vinte e quatro horas à casa respectiva, para que, pelo voto da maioria de seus membros, resolva sobre a prisão.”

» Entretanto, a determinação da Primeira Turma do STF foi baseada no Artigo 319 do Código de Processo Penal (CPP), que dá a possibilidade de substituição da prisão cautelar por medidas diversas menos graves como o afastamento da função 
pública e o recolhimento domiciliar no período noturno.

» A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5526, apresentada pelo Partido Progressista (PP), pelo Partido Social Cristão (PSC) e pelo Solidariedade (SD) pretende que os ministros alterem a interpretação da Constituição para que as medidas cautelares, quando aplicadas a membros do Poder Legislativo, também tenham de ser submetidas, no prazo de vinte e quatro horas, para análise do Congresso Nacional.