Título: Bandarra denunciado por transação suspeita
Autor: Campos, Ana Maria
Fonte: Correio Braziliense, 11/02/2012, Cidades, p. 31

Ministério Público Federal protocola nova ação contra o ex-procurador-geral de Justiça do DF. Ele é acusado de deixar de declarar ao Fisco R$ 500 mil que usou para comprar a casa onde mora, no Lago Sul. Do total, R$ 200 mil foram pagos em dinheiro

Uma representação da Secretaria da Receita Federal provocou a mais recente ação penal contra o ex-procurador-geral de Justiça do Distrito Federal Leonardo Bandarra. É a quarta em tramitação na Justiça. Depois de ser acusado de cobrar propina para vazar informações estratégicas de investigações sigilosas, tentar extorquir o ex-governador José Roberto Arruda e interferir no trabalho de um colega, Bandarra responderá agora por uma transação imobiliária considerada suspeita. De acordo com denúncia do procurador regional da República Ronaldo Albo, o ex-chefe do Ministério Público do DF declarou apenas parte do que pagou pela casa em que mora no Lago Sul. Nos documentos oficiais, ele registrou ter desembolsado R$ 830 mil no negócio.

A Receita Federal, no entanto, considera que o imóvel custou R$ 500 mil a mais. Os auditores chegaram a esse número com base no contrato particular de compra e venda da casa, apresentado pela antiga proprietária, no qual a transação teria envolvido a cifra de R$ 1,310 milhão. Bandarra também teria omitido que usou R$ 200 mil em dinheiro vivo para concluir a operação. A aquisição da casa ocorreu no fim de 2008, quando ele era o chefe do Ministério Público do Distrito Federal. Por conta da disparidade de informações, Bandarra foi autuado pelo Fisco. A Receita Federal também já comunicou a suposta irregularidade à Secretaria de Fazenda do Distrito Federal. Ao subavaliar o imóvel, Bandarra também teria deixado de pagar tributo local, parte do Imposto sobre Transações de Bens Imóveis (ITBI) devido.

Bandarra foi denunciado por falsidade ideológica e uso de documento falso. Na ação penal, o Ministério Público Federal sustenta que o promotor apresentou informações inverídicas em cadeia. Ele teria omitido o real valor do negócio no cartório de ofício de notas e depois no de registro de imóveis. Essas informações teriam levado à elaboração de uma escritura com dados que não condizem com a realidade. Em seguida, Bandarra apresentou os documentos considerados ideologicamente falsos no setor de controle interno do Ministério Público do Distrito Federal e estes foram depois repassados ao Tribunal de Contas da União (TCU).

O ex-procurador-geral de Justiça do DF não foi denunciado por sonegação fiscal porque o Ministério Público Federal ainda aguarda o fim do trâmite administrativo do processo na Secretaria da Receita Federal. Conforme estabelece jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF), o contribuinte tem a oportunidade de esgotar até o último recurso, com a possibilidade até de parcelar uma dívida, antes de ser responsabilizado penalmente pelo não pagamento de um imposto. Para o Ministério Público, no entanto, Bandarra já pode ser acusado de crime de falsidade ideológica, o que, pela condição de promotor de Justiça, é ainda agravado.

Fatos descritos nas outras ações penais ocorreram no ano em que Leonardo Bandarra comprou a casa, uma luxuosa propriedade no fim do Lago Sul. Para os procuradores que apuram as denúncias contra ele, decorrentes da Operação Caixa de Pandora, a autuação da Receita é mais uma suspeita envolvendo o ex-chefe do MP. Dessa vez, a acusação não partiu diretamente de Durval Barbosa.

Operação Meses antes de comprar a casa, segundo o Ministério Público Federal, Bandarra e a promotora Deborah Guerner passaram a Durval Barbosa a valiosa informação de que haveria uma operação de busca e apreensão na casa dele, para levantar informações sobre desvios de recursos de contratos de informática. O vazamento da Operação Megabyte teria custado R$ 1 milhão, supostamente repassado em parcelas. Bandarra sempre negou envolvimento nas acusações. Sustenta ser vítima de um plano orquestrado por Durval para prejudicá-lo, uma vez que moveu várias ações penais contra o delator da Pandora quando esteve à frente do Ministério Público do DF.

Por conta das acusações, Bandarra cumpre pena de suspensão das funções como promotor de Justiça, por determinação do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). Está sem receber salário. A pena vence após o Carnaval e Bandarra deverá retornar ao trabalho. Os conselheiros do CNMP determinaram a demissão dele e de Deborah Guerner, mas o desligamento definitivo dos promotores depende de uma decisão da Justiça transitada em julgado. Assim que o Ministério Público Federal ajuizar uma ação por perda de cargo contra os dois promotores, eles ficarão afastados da função até a conclusão da tramitação do processo, o que pode levar anos. Desde o ano passado, o caso está nas mãos de uma procuradora da República que ainda não protocolou a ação.

Corregedoria A autuação da Receita provocou também um novo processo contra Bandarra na Corregedoria-geral do Ministério Público do DF, que pode levar a outra pena de demissão. A advogada do promotor, Gabriela Bemfica, afirmou ontem que Bandarra ainda está se defendendo na Receita Federal e vai comprovar que a transação foi regular.

O valor do imóvel declarado à Receita é o mesmo da escritura e é compatível com um laudo da Caixa Econômica Federal segundo o qual a casa vale R$ 900 mil, argumenta a advogada. Ela acrescenta ainda ter estranhado que apenas Bandarra tenha sido denunciado pelo Ministério Público, quando o negócio envolveu duas partes. Gabriela disse que não poderia dar detalhes sobre os recursos aplicados na transação, uma vez que a denúncia e a operação fiscal estão resguardadas pelo sigilo.

Acusações

» O Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região recebeu no ano passado três denúncias ajuizadas pelo procurador regional da República Ronaldo Albo contra Bandarra, com base em investigações e depoimentos. O ex-procurador-geral de Justiça do DF nega as acusações e se diz vítima de acusações falsas de Durval Barbosa.

» Em maio de 2011, Bandarra virou réu numa ação em que é acusado de advocacia administrativa. Na condição de procurador-geral de Justiça do DF, ele teria interferido em 2008 para impedir o ajuizamento de uma ação de um colega, o promotor Mauro Faria de Lima, relacionada a desvios de recursos na Polícia Militar do DF. O objetivo da suposta interferência, segundo o Ministério Público, seria favorecer o então governador José Roberto Arruda.

» Bandarra e Deborah Guerner são acusados de, em 2008, tentar extorquir Arruda. Eles teriam pedido R$ 2 milhões para não divulgar vídeo em que o ex-governador, então deputado federal, aparece em 2005 recebendo dinheiro das mãos de Durval Barbosa. A denúncia foi recebida em julho de 2011.

» Em setembro do ano passado, Bandarra e Deborah passaram a responder por crime de violação do sigilo profissional, concussão e formação de quadrilha. A acusação é de que ambos repassaram a Durval informações estratégicas sobre a Operação Megabyte, realizada pelo Ministério Público para apurar lavagem de dinheiro. Durval era o principal investigado.