O Estado de São Paulo, n. 45258, 15/09/2017. Política, p. A5.

 

Joesley tem benefícios da delação rescindidos

Breno Pires / Beatriz Bulla / Rafael Moraes Moura

15/09/2017

 

 

A SEGUNDA DENÚNCIA / Janot vê omissão de fatos relevantes e pede que acusação contra dono da J&F e executivo sigam para Moro; Fachin decreta preventiva da dupla

 

 

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, informou ontem ao Supremo Tribunal Federal que rescindiu o acordo de delação premiada de Joesley Batista e Ricardo Saud – dono e ex-executivo do Grupo J&F, respectivamente. Ele também pediu o encaminhamento dos casos para o juiz Sérgio Moro. A rescisão do acordo em virtude de omissão de fatos relevantes precisa ser homologada pelo ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato na Corte.

Fachin ontem acatou pedido da PGR e converteu a prisão temporária, de cinco dias, dos dois delatores para preventiva – sem prazo determinado. Fachin justificou que há “receio de que, em liberdade, destruam ou ocultem provas”. A prisão, segundo o ministro, se justifica para diminuir a chance de que eles voltem a cometer crimes. Fachin destacou que os delatores não explicaram a omissão de informações no acordo de colaboração.

A decisão pela rescisão – que leva à perda dos benefícios concedidos a Joesley e Saud, como a imunidade penal – foi tomada após processo de revisão do acordo, em decorrência do surgimento de fatos “gravíssimos” na divulgação da gravação de uma conversa entre os dois delatores, segundo Janot. O procurador-geral uniu os delatores Joesley e Saud ao presidente Michel Temer na denúncia do crime de obstrução da Justiça, sob a acusação de compra do silêncio do operador Lúcio Funaro.

Segundo Janot, teria havido omissão em ao menos cinco pontos, a começar pelo auxílio que a PGR aponta ter havido por parte de Marcello Miller, ex-procurador, à J&F na preparação do acordo de colaboração. Outro ponto é o não envio de áudios que Joesley posteriormente reconheceu ter escondido. Janot também indica omissão em relação à existência de conta bancária no exterior, bem como o uso de seus recursos por Saud e informação inverídica do executivo em depoimento prestado ao MPF.

 

Provas válidas. Para o procurador-geral, contudo, a validade das provas continua. “Havendo rescisão de acordo de colaboração premiada por descumprimento das cláusulas as quais, por exemplo, proíbem a omissão deliberada, a má-fé, o dever de transparência dos colaboradores, perde o colaborador os benefícios auferidos, mas mantêm-se hígidas e válidas as provas já produzidas”, diz Janot na acusação.

A PGR afirmou não ter concluído a revisão do acordo de delação do diretor jurídico do Grupo J&F, Francisco de Assis e Silva, porque ainda faltariam elementos para tomar uma decisão.

No inquérito por obstrução, Janot disse que a iniciativa de comprar o silêncio de Funaro e do deputado cassado Eduardo Cunha partiu de Joesley, mas que a continuidade desse pagamento teria sido “instigada” por Temer no encontro no Palácio do Jaburu, em março. Em certo ponto da conversa gravada por Joesley, destaca a denúncia, o presidente diz: “Tem que manter isso aí”. Janot afirmou ainda que na busca e apreensão realizada na casa de Roberta Funaro, irmã de Funaro, foram apreendidos R$ 1.6 milhão para silenciá-lo.

 

Detido. Joesley Batista foi preso no domingo passado em SP

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Defesa diz que Janot age como Poder Judiciário

Rafael Moraes Moura / Breno Pires / Beatriz Bulla

15/09/2017

 

 

O advogado Antônio Carlos de Almeida Castro, conhecido como Kakay, defensor dos delatores Joesley Batista e Ricardo Saud, disse em nota divulgada ontem que o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, tratou de usurpar a competência do Supremo Tribunal Federal (STF) ao querer rescindir de forma unilateral o acordo de colaboração premiada homologado pelo ministro Edson Fachin.

“A Procuradoria, já há tempos, tem tentado agir como se fosse o próprio Poder Judiciário. E, ao que parece, todo esse turbilhão de acontecimentos e medidas drásticas e nada usuais, tomadas claramente de afogadilho, evidentemente por estar o procurador em final de mandato, parece demonstrar certa desconfiança com a nova gestão, pois trata-se de criar fatos bombásticos, a atrair toda a atenção da imprensa e dos Poderes da República, na busca de um gran finale”, afirmou Kakay.

De acordo com o advogado de Joesley e Saud, seus clientes “acreditaram na boa-fé do Estado” e “se entregaram à segurança jurídica que julgavam ter o instituto da delação”.