Correio braziliense, n. 19845, 22/09/2017. Política, p. 3.

 

Dodge tem a primeira baixa

Renato Souza

23/09/2017

 

 

A primeira semana de Raquel Dodge à frente do Ministério Público Federal chegou ao fim com uma baixa em sua equipe. O procurador da República Sidney Pessoa Madruga pediu exoneração após ser flagrado durante um encontro, em um restaurante de Brasília, com a advogada Fernanda Tórtima, que atuou na delação da JBS.

Sidney tinha sido nomeado na terça-feira para o cargo de coordenador do Grupo Executivo Nacional da Função Eleitoral (Genafe). Mas, com apenas três dias de trabalho na equipe de Raquel Dodge, ele se encontrou com a advogada que atuou na defesa dos executivos da empresa de carnes. A conversa entre o integrante do MPF e a advogada foi testemunhado por uma equipe de reportagem da Folha de S.Paulo, durante o horário do almoço, na Asa Sul.

Na conversa, de acordo com a reportagem, Sidney afirmou que a tendência da PGR seria abrir investigação contra o procurador Eduardo Pelella, ex-chefe de gabinete do ex-procurador-geral Rodrigo Janot. O diálogo ocorreu em um local mais reservado do restaurante. Eduardo foi o braço direito de Janot durante sua gestão à frente do Ministério Público. Ele atuou nos processos da Lava-Jato, inclusive nos acordos de colaboração fechados com os executivos Wesley e Joesley Batista.

As declarações de Sidney Pessoa abriram uma crise dentro da cúpula do MPF. Ao saber do caso, Eduardo Pelella enviou um ofício para o gabinete de Raquel Dodge. No documento, ele diz estar disponível para esclarecimentos referentes ao trabalho que desenvolveu na gestão anterior. “Informo a Vossa Excelência que, a exemplo do que ocorreu durante todo o período de transição, estou à disposição para qualquer esclarecimento que se entenda necessário.”

Ao assumir o cargo, Raquel Dodge deixou apenas dois nomes que já estavam na força-tarefa da operação Lava-Jato em Brasília. Outros cinco procuradores que integravam a gestão de Rodrigo Janot vão permanecer no grupo de trabalho por 30 dias, para realizar a transição. Durante esse período, eles vão repassar às novas equipes documentos, gravações e relatórios apresentados por delatores e pelas empresas envolvidas no esquema de corrupção que atingiu a Petrobras. Raquel já teve acesso aos documentos, assim como integrantes de sua equipe. No entanto, devido à quantidade de dados físicos e virtuais, apenas uma pequena parte do conteúdo foi analisada pelos novos integrantes da operação no Distrito Federal.

Gravações

Em um áudio em que Joesley Batista conversa com o executivo Ricardo Saud, também da JBS, o nome de Fernanda é citado. De acordo com Joesley, ele avisou para Fernanda que apresentaria em seu acordo de delação o envolvimento de integrantes do Supremo Tribunal Federal (STF) em esquemas de corrupção. “A advogada surtou. Disse que implicaria os amigos dela”, afirmou Joesley. Ele não sabia que o aparelho de gravação estava ligado quando fez as declarações.

Na mesma conversa em que Fernanda é citada, Joesley fala em “usar o procurador Marcelo Miller para chega até Janot”. O caso levou à prisão de Joesley Batista e de Ricardo Saud, acusados de omitir informações em depoimentos prestados ao Ministério Público. A prisão foi decretada pelo ministro Edson Fachin, relator da operação Lava-Jato no STF.

Em nota publicada no fim da tarde de ontem, a PGR afirmou que o procurador Sidney Pessoa “não atua em matéria criminal e não teve acesso a nenhuma investigação ou ação penal conduzidas pela atual equipe do Grupo de Trabalho da Lava-Jato, em Brasília”. Procurada pelo Correio, em seu escritório, Fernanda Tórtima não retornou as ligações.

Gilmar mantém
irmãos na cadeia

O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), negou ontem dois pedidos de liberdade e manteve presos os irmãos Joesley e Wesley Batista, sócios da J&F. Gilmar é o relator do caso. Joesley e Wesley foram presos no início do mês e protocolaram o habeas corpus no Supremo após terem pedidos de liberdade negados pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), na quinta-feira. Em várias ocasiões, Gilmar Mendes criticou o acordo de delação premiada firmado entre os irmãos Batista e a Procuradoria-Geral da República (PGR), assinado em maio no âmbito da Operação Lava-Jato. Na decisão, Gilmar entendeu haver risco de novos crimes e não considerou a medida desproporcional.