Correio braziliense, n. 19867, 14/10/2017. Política, p. 4

 

Doria no olho do furacão

Ezequiel Trancoso 

14/10/2017

 

 

PODER EM CRISE/ Depois de se indispor com políticos do PSDB, prefeito de São Paulo vê as portas se fecharem no DEM. A um ano da eleição, entretanto, o tucano afirma que a disputa pelo Planalto é uma “maratona e não uma corrida de 100 metros”

A menos de um ano para as eleições de 2018, as incertezas em relação aos possíveis candidatos ao Planalto não param de crescer e atingem, cada vez mais, as pretensões do prefeito de São Paulo, João Doria. Desconfortável no PSDB — uma vez que enfrenta a dura concorrência do governador Geraldo Alckmin, o padrinho político, pelo cargo de tucano presidenciável — e assistindo aos índices de aprovação caírem entre os paulistanos, Doria agora perde fichas no DEM. O partido começa a sinalizar que, caso a popularidade do tucano na capital paulista mantenha o viés de queda, outras opções deverão ser priorizadas, como o apresentador Luciano Huck, que já manifestou o desejo de concorrer ao cargo máximo do Executivo.

Em Milão, Doria desdenhou da possibilidade de perder o cargo de presidenciável favorito do DEM. O tucano afirmou, ontem, que a disputa presidencial não é uma “corrida de 100 metros”, mas uma “maratona, que se disputa metro a metro”. “Eu nem me assumi como candidato, como posso desistir? Estamos todos numa corrida eleitoral. O PSDB, meu partido, estará presente. E certamente na condição de favorito. Quem achar que é uma corrida de 100 metros vai cansar rápido”, analisou o prefeito.

Cientistas políticos avaliam que, mesmo que uma eventual reaproximação entre DEM e Doria ocorra, é improvável que o prefeito de São Paulo seja candidato pela legenda. Para os especialistas, o tucano se enquadra no perfil buscado por partidos mais jovens, como o Novo, defensor de uma agenda econômica mais liberal, ou por siglas repaginadas, como o Livres, antigo PSL. “Não apostaria um centavo sequer em uma candidatura do Doria pelo DEM”, opina o cientista político Ricardo Caldas.

“O DEM é um partido antigo, constituído, altamente centralizado. Sempre imaginei o DEM com um nome mais ligado ao sistema político, como o (senador) Ronaldo Caiado”, acrescenta. Para Caldas, as chances de Doria ser candidato pelo seu atual partido, o PSDB, dependem de um eventual enfraquecimento de Geraldo Alckmin, o que só deve acontecer, segundo ele, se eventuais investigações se voltarem contra ele.

Já o cientista político Roberto Romano, professor de Ética e Filosofia na Unicamp, não crê que Doria tenha capital político suficiente para se aventurar em uma campanha nacional, seja no PSDB, no DEM ou em outras legendas menores. “Ele [Doria] não é um produto sólido, porque não tem bases eleitorais fora da cidade de São Paulo”, observa. “Ele tem ido a outros estados, mas não tem a dinâmica, a amplitude que tem aqui. É um candidato precoce”, alerta Romano, que acredita que somente uma sigla tão “insipiente” quanto Doria deverá abrigá-lo em 2018.

A avaliação de que Doria só deve ter penetração em partidos de menor expressão é compartilhada pelo senador suplente José Aníbal (PSDB-SP), ex-presidente nacional do PSDB. “A realidade já mostra que ele (Doria) não é novidade e que, como gestor, está perdendo o capital dele”, salientou Aníbal, que é, ao lado do ex-governador Alberto Goldman — chamado recentemente de “fracassado” por João Doria —, um dos mais contumazes críticos do prefeito no tucanato paulista.

Panorama

Uma alternativa para Doria fora do panorama político tradicional seria o lançamento de uma candidatura avulsa, na qual não há necessidade de vinculação com partidos. A polêmica questão ainda deve ser avaliada pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Apesar de a lei brasileira determinar que apenas candidatos registrados por legendas políticas podem concorrer, o Pacto de São José, do qual o Brasil é signatário, permite candidaturas avulsas.

Na opinião de Ricardo Caldas, esta seria a opção mais sensata no caso de João Doria. “(Uma candidatura avulsa) seria melhor para ele, porque ele ficaria livre dos partidos, que hoje têm um fator inibidor: eles trazem com eles um patrimônio negativo”, alerta o professor da Universidade de Brasília (UnB). “Concorrendo de forma independente, ele tem uma candidatura nova em folha.”