Correio braziliense, n. 19850, 27/09/2017. Política, p. 3.

 

Palocci compara PT a "seita"

27/09/2017

 

 

Ex-ministro pede desfiliação, sugere que Lula tenta transferir responsabilidades nas acusações e diz que Dilma destruiu a economia

 

 

O ex-ministro Antonio Palocci, homem-forte dos governos do PT e fundador do partido, enviou ontem à senadora Gleisi Hoffmann, presidente nacional da legenda, uma carta na qual oferece sua desfiliação e faz um duro relato pessoal, em tom emotivo, sobre o “acúmulo de eventos de corrupção” nos governos Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff. Em pouco mais de três páginas, Palocci provoca o que foi descrito por um alto dirigente petista como uma “hecatombe” ao dizer que viu Lula se dissociar do “menino retirante” e “sucumbir ao pior da política”.

Ele conta detalhes sobre suposto pedido de propinas à Odebrecht na biblioteca do Palácio da Alvorada, compara o PT a uma “seita” submetida à “autoproclamação do ‘homem mais honesto do país’” e sugere que o ex-presidente tenta transferir a responsabilidade por ilegalidades à ex-primeira-dama Marisa Letícia, morta em janeiro. Ele diz ainda que Dilma destruiu programas sociais e a economia e afirma que o PT precisa fazer um acordo de leniência se quiser se reconstruir.

Palocci coloca nas mãos de Gleisi a decisão sobre sua desfiliação do partido. Na semana passada, o PT de Ribeirão Preto, pressionado pela direção nacional, abriu o processo de expulsão do ex-ministro. Na sexta-feira, o diretório nacional decidiu suspendê-lo provisoriamente por 60 dias. Na carta, Palocci acusa o PT de só punir quem ataca o partido e seu líder máximo e ignorar as denúncias de corrupção contra petistas.

O Instituto Lula não havia respondido às acusações do ex-ministro até a conclusão desta edição. Segundo a assessoria do ex-presidente, Palocci apenas voltou a dizer “mentiras” contra o ex-presidente com o objetivo de fechar um acordo de delação premiada com a Lava-Jato. Ontem, Palocci completou exatamente um ano de cadeia. No texto ele confirma que está em negociação com o Ministério Público.

Gleisi respondeu com uma nota dura, na qual também acusa o ex-ministro de mentir para se safar da condenação de 12 anos, dois meses e 20 dias de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. “Política e moralmente, Palocci já está fora do PT”, diz a nota da senadora.

 

“Traição”

Os demais dirigentes, parlamentares e ex-integrantes dos governos petistas evitaram comentar as novas acusações de Palocci. Sob a condição de anonimato, no entanto, muitos admitem que as punições internas ao ex-ministro foram um “tiro no pé”, já que deram a Palocci mais um palco para disparar contra Lula e o partido. Quase todos demonstraram indignação com o que consideram uma “traição” do ex-ministro.

Para grande parte dos líderes petistas, a carta de Palocci é mais um elemento a dificultar a participação de Lula na eleição do ano que vem. Alguns chegaram a descrever o ataque do ex-ministro como o mais duro já sofrido pelo partido justamente por ter vindo de um de seus principais quadros.

 

Principais pontos

Confira alguns tópicos da carta enviada pelo ex-ministro Antonio Palocci

 

1 Mostra-se favorável a que o PT feche um acordo de leniência na Lava-Jato

2 Afirma que as declarações dadas no depoimento ao juiz Sérgio Moro “são fatos absolutamente verdadeiros”, situações que presenciou, acompanhou ou coordenou, “normalmente junto ou a pedido do ex-presidente Lula”

3 Considera um “erro” a eleição e a reeleição de Dilma Rousseff, que “destruiu cada conquista social e cada um dos avanços econômicos tão custosamente alcançados”

4 Houve uma evolução e acúmulo de corrupções nos governos a partir do segundo mandato de Lula