Correio braziliense, n. 19852, 29/09/2017. Economia, p. 7.

 

Executivo terá de cobrir gasto dos demais poderes

Rosana Hessel

29/09/2017

 

 

Governo repassará R$ 2,1 bilhões, em 2018, ao Legislativo e ao Judiciário, que devem estourar o limite estabelecido pela emenda constitucional que fixou teto para o crescimento das despesas da União. Previsão está na proposta orçamentária do ano que vem

 

 

O governo vai ter um grande desafio para fechar as contas de 2018 e cumprir o teto de gastos e a meta fiscal, apesar de ter ampliado a previsão de deficit nas contas públicas de R$ 129 bilhões para R$ 159 bilhões. Nessa empreitada, o Executivo não terá a ajuda dos demais poderes, porque eles devem estourar os limites orçamentários. Ao contrário, será chamado a compensar o excesso de despesas do Legislativo e do Judiciário até 2019. No ano que vem, a fatura será de R$ 2,1 bilhões, conforme previsto no Projeto de Lei Orçamentária Anual (Ploa) de 2018.

O valor está abaixo do limite de compensação projetado para o próximo ano, de R$ 3,2 bilhões. Mesmo assim, preocupa especialistas, porque a tendência é que ele continue crescendo após 2020. Para os analistas, Judiciário e Legislativo estão aproveitando esse espaço para ampliar despesas e conceder aumentos salariais, no  momento em que o Executivo tenta adiar os reajustes do funcionalismo. “É um péssimo sinal, porque, no quarto ano, não terá mais compensação. O que deveria acontecer é o oposto, com as despesas começando a diminuir em grau mais acelerado”, criticou um economista do governo.

O limite de compensação para os demais poderes equivale a 0,25% do teto do Poder Executivo, conforme estabelecido na Emenda 95, que instaurou o limite de crescimento dos gastos federais e o Novo Regime Fiscal. Neste ano, esse valor é de R$ 3,1 bilhões, e, no ano que vem, de R$ 3,3 bilhões.

Na avaliação do economista Bráulio Borges, da LCA Consultores, os poderes Legislativo e Judiciário estão adiando um problema ao não se enquadrarem no teto. “A estratégia é não tentar ajustar muito agora, mas, quando chegar a 2020, vai ter um buraco muito grande. Na verdade, eles estão encomendando a necessidade de um ajuste mais draconiano”, alertou.

A economista Vilma da Conceição Pinto, pesquisadora do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV), lembrou que o teto de gastos deste ano vai ser cumprido porque o governo está fazendo um contingenciamento grande no orçamento, de R$ 45 bilhões. No ano que vem, contudo, não há espaço para um bloqueio desse tamanho.

“O teto ficará cada vez mais comprometido, porque não existe muita margem para cortes”, destacou Vilma, lembrando que o Ploa de 2018 prevê apenas R$ 65 bilhões de despesas discricionárias. A mensagem modificativa com a nova meta fiscal do  próximo ano, que o Ministério do Planejamento deve enviar ao Congresso, poderá ampliar um pouco essa margem, segundo Vilma.

Para a economista Monica de Bolle, pesquisadora do Petterson Institute for International Economics, de Washington, é bem provável que a meta fiscal de 2018 não seja cumprida. “O deficit pode facilmente passar de R$ 170 bilhões no ano que vem, porque todos sabem que ano eleitoral é ano de gastança”, alertou. Ela acrescentou que os riscos de o teto não ser cumprido também são crescentes, principalmente, se o próximo governo não for reformista como o mercado espera.

O teto para o aumento das despesas primárias do governo é de 7,2% neste ano e de 3% em 2018. Dados do Tesouro Nacional divulgados ontem mostram que nem mesmo o Executivo conseguiu cumprir a determinação da Emenda 95. As despesas acumuladas no ano somaram R$ 806,4 bilhões, valor 7,4% acima do contabilizado no mesmo período do ano passado. As do Legislativo cresceram 6,4% e as do Judiciário, 5,7%.

A secretária do Tesouro Nacional, Ana Paula Vescovi, disse que as despesas ficaram acima do teto “pontualmente”, porque existe uma margem de R$ 29 bilhões para o Executivo cumprir a regra em 2017. “Só no fim do ano que a gente vai atestar o cumprimento do limite. Essa oscilação pontual de agosto tende a convergir para 4,8%”, previu. Ana Paula acrescentou que, nessa conta, considera a liberação de R$ 12,8 bilhões do orçamento, possibilitada pela ampliação do rombo fiscal deste ano para R$ 159 bilhões. O detalhamento dos órgãos contemplados com os recursos sai hoje no Diário Oficial da União. (Colaborou Hamilton Ferrari)