O Estado de São Paulo, n. 45250, 07/09/2017. Política, p. A4.

 

Lula fez 'pacto de sangue' por propinas, diz Palocci

Fausto Macedo/ Ricardo Brandt/ Julia Affonso/ Luiz Vassallo

07/09/2017

 

 

Lava Jato. Ao juiz Sérgio Moro, ex-ministro afirma que ex-presidente acertou com a Odebrecht pagamento de R$ 300 milhões para o PT, além de sítio e terreno para instituto

 

 

O ex-ministro Antonio Palocci disse ontem ao juiz Sérgio Moro que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva avalizou, em 2010, um “pacto de sangue” no qual a Odebrecht se comprometeu a pagar R$ 300 milhões em propinas ao PT. O acerto, segundo ele, foi feito no fim do governo do petista e incluiu, além dos R$ 300 milhões, um terreno para o instituto do ex-presidente e o sítio de Atibaia (SP). O exministro afirmou que, com a eleição de Dilma Rousseff, em 2010, a empresa “entrou em pânico”, o que levou o patriarca do grupo, Emílio Odebrecht, a procurar Lula e oferecer esse “pacote de propinas”.

Palocci foi um dos principais auxiliares e homem de confiança do ex-presidente no primeiro mandato do petista. Titular da Fazenda, se tornou o principal interlocutor do PT com empresários e o setor financeiro.

O ex-ministro foi ouvido em Curitiba como réu em uma ação penal da Lava Jato – segundo denúncia do Ministério Público Federal, propinas pagas pela empreiteira chegaram a R$ 75 milhões em oito contratos com a estatal. Este montante, segundo a força-tarefa, inclui um terreno de R$ 12,5 milhões para Instituto Lula e o aluguel de uma cobertura vizinha à residência de Lula em São Bernardo do Campo de R$ 504 mil. Além de Lula e Palocci, são acusados o ex-assessor Branislav Kontic, o advogado Roberto Teixeira, o empreiteiro Marcelo Odebrecht e outras três pessoas.

Palestras. Ontem, o ex-ministro disse que o que chamou de “pacto de sangue” foi firmado entre Lula e Emílio Odebrecht logo após a eleição de Dilma, em 2010. “Ele (Emílio) procurou Lula nos últimos dias de seu mandato e levou um pacote de propinas, com esse terreno do instituto, que já estava comprado, o sítio para uso da família, que estava fazendo a reforma em fase final, e disse ao presidente que estava pronto, e que tinha à disposição para o presidente fazer a atividade política dele R$ 300 milhões”, afirmou.

Do “pacote”, segundo o exministro, fariam parte ainda o pagamento de palestras de Lula e o “prédio de um museu pago pela empresa”. “Envolvia palestras pagas a 200 mil, fora impostos, combinados com a Odebrecht para o próximo ano.”

O ex-ministro disse ter ficado “bastante chocado” com a proposta. O ex-presidente, segundo ele, afirmou que a Odebrecht só estava fazendo aquilo por “receio” de Dilma, já que a empresa temia que o “comportamento” da então presidente eleita “colocasse em risco” os projetos da companhia.

Segundo Palocci, Dilma, quando era ministra da Casa Civil de Lula, “criou um embate” com a empreiteira na construção de duas hidrelétricas no Rio Madeira. Com a atuação de Dilma, relatou, a Odebrecht perdeu uma das licitações e venceu a outra por um preço “ruim”. “Dilma achava que era uma concentração de obras inadequada”, disse o ex-ministro.

‘Italiano’. Emílio, de acordo com Palocci, pediu ao ex-presidente que tratasse dos recursos com o herdeiro do grupo, Marcelo Odebrecht. “Para mim, é aí que surge a tal planilha”, afirmou. No Setor de Operações Estruturadas da Odebrecht, o “departamento de propina” da empreiteira, Palocci era identificado como “Italiano” e Lula como “Amigo” em planilhas, conforme as investigações.

Ontem, o ex-ministro confirmou a alcunha. “O Marcelo nunca me chamou de ‘Italiano’, mas acho que essa planilha, quando ele coloca ‘Italiano’, ele diz respeito a mim. Não sei por que escolheu essa alcunha.”

‘Capítulo’. Questionado pelo juiz sobre seu relacionamento, quando era ministro, com a empresa, Palocci disse que ele era “fluido”. Ele disse também acreditar que, “em princípio”, a “denúncia procede”. “Os fatos narrados nela são verdadeiros. Eu diria apenas que os fatos narrados nessa denúncia dizem respeito a um capítulo de um livro um pouco maior do relacionamento da empresa em questão, da Odebrecht, com o governo do ex-presidente Lula e da expresidente Dilma, que foi uma relação bastante intensa.”

Em junho, Moro condenou Palocci a 12 anos, 2 meses e 20 dias de prisão pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro referente a propinas de contratos firmados pelo Estaleiro Enseada do Paraguaçu – de propriedade da Odebrecht – com a Petrobrás, por intermédio da Sete Brasil. Foi a primeira condenação do petista na Operação Lava Jato.

NA WEB Vídeos. Assista ao depoimento de Antonio Palocci estadao.com.br/e/paloccimoro

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‘Relação PT-Odebrecht era movida a vantagens’

07/09/2017

 

 

Em depoimento ao juiz Sérgio Moro ontem, o ex-ministro da Fazenda e da Casa Civil (governos Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff) Antonio Palocci afirmou que a relação das duas administrações petistas com a Odebrecht foi “bastante movida a vantagens dirigidas à empresa, a propinas pagas a agentes públicos em forma de doação de campanhas, de benefícios pessoais, caixa 1, caixa 2”. Palocci foi interrogado pelo magistrado da Operação Lava Jato em ação penal sobre propinas pagas pela empreiteira.

Segundo Palocci, principalmente nos dois mandatos de Lula, “a Odebrecht, em particular, tinha uma relação fluida com o governo em todos os aspectos”. “Diria partindo dos aspectos de realização de projetos assim como participação em campanhas. As participações em campanhas se davam de todas as maneiras, a maior parte com caixa 1, mas o caixa 1 muitas vezes originário de atitudes e de contratos ilícitos”, afirmou.

Questionado por Moro sobre exemplos de “contratos ilícitos que eventualmente geraram créditos”. Palocci respondeu. “Ah, diversos. Os da Petrobrás quase todos geraram créditos.” O ex-ministro disse ainda que, com o “crescimento” das obras da Odebrecht, aumentaram os “ilícitos”. “A Odebrecht é a maior das construtoras do País. Estive com eles desde 1994 quando o presidente Lula os conheceu. Então, eu tratava de todo tipo de temas com eles, inclusive de temas ilícitos”, afirmou./ F.M., R.B., J.A. e L.V.