Correio braziliense, n. 19854, 01/10/2017. Política, p. 2.

 

Novas eleições para velhos candidatos

Natália Lambert

01/10/2017

 

 

Com um ano de campanha pela frente, caciques partidários insistem em lançar nomes tradicionais para a corrida eleitoral, mesmo com pesquisas que mostram o desejo de renovação por parte do cidadão. Especialistas divergem sobre discursos de uma nova ordem

 

 

A partir deste mês, o país está a um ano das eleições majoritárias. E, desde a primeira disputa após a redemocratização, em 1989, não havia um cenário tão incerto do que sairá como resultado das urnas. A indefinição encontra-se em todos os níveis de poder — das cadeiras de deputados estaduais à Presidência da República. E, mesmo diante de pesquisas e indicativos de que a população quer uma completa renovação, os partidos apontam para velhos e tradicionais nomes da política brasileira como solução.

O discurso sobre o novo se adaptou ao longo dos últimos meses e foi incorporado por aqueles que dominam o cenário há décadas. A promessa agora é “nova política”. O exemplo mais recente é a eleição suplementar ao governo do Amazonas, ocorrida em agosto deste ano. A população escolheu Amazonino Mendes (PDT-AM), que desde 1983 se reveza em períodos na prefeitura de Manaus e no governo do estado. Em segundo lugar, ficou o senador Eduardo Braga (PMDB-AM), outro medalhão da política amazonense.

“Que renovação é essa que leva ao segundo turno Amazonino e Eduardo Braga? Isso não existe. O sistema favorece quem está ali. E vai aumentar com as mudanças da reforma política. Com o fundo eleitoral e a redução no tempo de campanha, aqueles que têm o controle sobre os partidos vão direcionar os recursos para se manter no poder”, diz o diretor de documentação do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), Antônio Augusto de Queiroz. “Quem está chegando terá pouquíssima chance. A eleição reproduzirá o mais do mesmo. Não houve mudança no sistema eleitoral, nem cultural suficientes para mostrar a importância de se eleger um Parlamento não viciado”, acrescenta.

O analista político acredita que a renovação na Câmara dos Deputados, por exemplo, ficará dentro da média histórica, que gira em torno de 40% a 50%. Em 2014, o número chegou a 43,7% — 198 novos deputados e 26 que voltaram, mas não participaram da legislatura anterior. A maior taxa já registrada de chegada de novos políticos à Casa ocorreu em 1990, com 62%. “A renovação não será real. Vai acontecer uma circulação: senador que vai concorrer à Câmara, deputado que vai para a Assembleia, secretário que vai virar deputado, filho que vai assumir a vaga do pai. Tudo continuará nas mãos dos mesmos grupos”, aposta Antônio Queiroz.

 

Exemplo do passado

Já o especialista em marketing eleitoral Marcelo Vitorino acredita em uma renovação em torno de 55% na Câmara. Para ele, diante da crise política e ética que o país enfrenta e com a previsão de uma campanha mais barata, abre-se uma janela de oportunidade para quem quer entrar na política. Vitorino afirma que, para entender o panorama de 2018, basta olhar para o passado: 1989. “Será uma eleição muito parecida. Muitos candidatos e incertezas. Agora, todo mundo estará no mesmo barco do pouco dinheiro. Claro que há colégios eleitorais em que os caciques são muito fortes e isso não cairá, mas o momento é, sim, propício para a novidade”, garante.

Aos 72 anos, o senador Alvaro Dias (Podemos-PR) vê no momento a oportunidade para chegar ao Palácio do Planalto. Pré-candidato, o paranaense já esteve na posição de deputado estadual, federal, governador do estado e cumpre o quarto mandato no Senado. Para ele, o maior desafio das eleições será vencer a descrença da população e o descrédito em relação a partidos. “O que se espera não é o novo em idade ou o novo na política. Até porque o novo em idade tem sido uma decepção. O que a população deseja é o método novo, uma gestão moderna, uma mudança de conceito e da cultura política. E, certamente, uma experiência precedente na atividade pública passa a ser uma vantagem para quem tem um itinerário diferente da maioria”, acredita.

Especialistas ressaltam, porém, os perigos do desejo pela renovação, da falta de opções apresentadas pelas legendas e da descrença com a política. A tendência é a eleição de “salvadores da pátria” e de um grande número de abstenções, votos brancos e nulos. O cenário foi antecipado nas eleições municipais de 2016, quando esse número chegou a 32,5%. “O receio é que cresça essa campanha do ‘Não reeleja ninguém’ e pessoas boas fiquem de fora. Na ânsia de fazer uma coisa melhor, às vezes, se coloca coisa muito pior. Esse movimento dará espaço para gente que se compromete somente com o próprio ego. É preciso renovar com consciência, e não banalizar o voto. A história nos mostra que isso dá errado”, frisa Vitorino.

 

Clima de renovação

Em 1989, o país sofria com uma inflação fora do comum, vivia o governo de José Sarney, que assumiu após a morte de Tancredo Neves, e ainda amargava resquícios do regime militar. Na época, 22 candidatos se lançaram à Presidência da República. Desses, pelo menos seis eram considerados com chances. Ao fim, foram ao segundo turno Fernando Collor (do então PRN) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT), de legendas novas no cenário nacional, e derrubando medalhões como Ulysses Guimarães (PMDB), Leonel Brizola (PDT) e Mário Covas (PSDB).

 

 

Frase

“Agora, todo mundo estará no mesmo barco do pouco dinheiro. Claro que há colégios eleitorais em que os caciques são muito fortes e isso não cairá, mas o momento é, sim, propício para a novidade”

Marcelo Vitorino, especialista em marketing eleitoral

 

32,5%

Percentual de abstenções, votos brancos e nulos das eleições municipais de 2016

 

 

Vagas em disputa

» As eleições no Brasil são regidas pela Lei nº 9.504/97. O primeiro turno é sempre realizado no primeiro domingo de outubro, no caso, 7 de outubro de 2018, e o segundo turno, no último domingo, que cairá em 28 de outubro.

» Quem pretende se candidatar tem que se filiar ao partido pelo qual irá concorrer até seis meses antes do pleito, ou seja, abril do ano que vem.

» Em 2018, 1.653* vagas estarão em disputa. Confira a divisão delas:

 

Cargos majoritários*

Presidência da República  -              1

Governos estaduais

mais o Distrito Federal       -  27

Senado Federal   -  54

 

* Os vices não são contabilizados

 

Cargos proporcionais

Câmara dos Deputados   -  513

Assembleias Legislativas   -               1.035

Câmara Legislativa -            24

 

 

Número de vagas nas Assembleias Legislativas:

Acre      24

Alagoas 27

Amazonas            24

Amapá  24

Bahia     63

Ceará    46

Espírito Santo      30

Goiás     41

Maranhão            42

Minas Gerais       77

Mato Grosso do Sul           24

Mato Grosso        24

Pará       41

Paraíba 36

Pernambuco       49

Piauí      30

Paraná  54

Rio de Janeiro     70

Rio Grande do Norte         24

Rondônia             24

Roraima                24

Rio Grande do Sul              55

Santa Catarina     40

Sergipe 24

São Paulo             94

Tocantins             24