O Estado de São Paulo, n. 45270, 27/09/2017. Política, p.A6

 

 

 

Mau presságio

A decisão do Tribunal Regional Federal da 4.ª Região, que confirmou a condenação de José Dirceu e elevou em dez anos a pena imposta a ele pelo juiz Sérgio Moro, é um mau sinal para o ex-presidente Lula em vários aspectos. O mais relevante deles está em um trecho do voto do relator, desembargador João Pedro Gebran Neto. Disse ele sobre o tipo de crime pelo qual o ex-ministro foi condenado: “Embora nestes casos dificilmente haja provas das vantagens indevidas, adoto a teoria do exame das provas acima de dúvida razoável”.

Trata-se do caminho que deve ser seguido pela corte também para a análise da sentença de Moro contra Lula no caso do triplex do Guarujá. Essa teoria contraria a principal alegação da defesa de Lula, a da falta de provas na condenação do petista. Toda a construção da decisão sobre Dirceu, seguida por vários desembargadores, também ratifica as teses erigidas pela Lava Jato quanto ao uso do governo para a obtenção de propinas e vantagens pessoais para caciques do partido. “Os esquemas criminosos descobertos na Operação Lava Jato foram escancarados e violaram princípios norteadores da administração pública como a legalidade, a moralidade e a eficiência”, consignou Gebran.

Se vale para um dos principais ministros e suas relações com uma empreiteira após deixar o governo, deverá valer para Lula, reconhecem investigadores e advogados que atuam na operação. A decisão sobre Dirceu, aliada ao avanço da delação de Antonio Palocci e à juntada, por sua defesa, de recibos com datas inexistentes ao processo do imóvel de São Bernardo, formam conjunto bastante negativo para o ex-presidente.

 

NO STF

Decisão sobre Dirceu pode ser ‘gancho’ para rever prisões

Ministros do STF podem usar a decisão do TRF-4, que ratificou a condenação de José Dirceu, como gancho para provocar a rediscussão em plenário da jurisprudência que permite o cumprimento de pena de prisão a partir da condenação em segunda instância.

 

DEIXA ESTAR

PGR pode insistir em denúncia contra Padilha e Moreira

Raquel Dodge deve esperar o arquivamento da denúncia contra Michel Temer pela Câmara para apresentar uma nova ao STF contra os ministros Eliseu Padilha e Moreira Franco. A ideia é não defender o fatiamento agora, para não atrasar a análise da peça.

 

AGORA VAI?

Tucanos vão usar decisão do STF para forçar saída de Aécio

A ala do PSDB incomodada com a permanência no governo Michel Temer e com a licença prolongada de Aécio Neves da presidência do partido vai usar o novo afastamento do mineiro do Senado, determinado pelo STF, para forçá-lo a renunciar já ao comando da sigla, antecipando a sucessão. O movimento conta com a simpatia velada do presidente interino dos tucanos, senador Tasso Jereissati, que rompeu com Aécio e tem atuado para desmontar sua estrutura no partido.

 

GESTÃO

Doria faz agenda para se aproximar do setor produtivo

Estrategistas da pré-campanha à Presidência de João Doria Jr. identificaram uma certa desconfiança quanto à viabilidade da postulação do prefeito de São Paulo por parte de segmentos do setor produtivo. Doria vai intensificar nas próximas semanas a agenda de aproximação com entidades representativas da indústria e do agronegócio, como CNI, Fiesp, CNA e Iedi.

 

 

 

 

Condenação de Dirceu vai a 30 anos

Tribunal de 2ª instância da Lava Jato amplia sentença do juiz Sérgio Moro em 10 anos; corte eleva 1/3 das penas da 13ª Vara de Curitiba

Por: Julia Affonso / Ricardo Brandt / Gilberto Amendola

 

Julia Affonso

Ricardo Brandt

Gilberto Amendola

 

O Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF-4) aumentou, ontem, em 10 anos, a pena imposta ao ex-ministro da Casa Civil José Dirceu em processo na Operação Lava Jato. A decisão segue tendência da corte de ampliar 1/3 das penas de primeira instância. A condenação atingiu 30 anos e 9 meses de prisão. Ele havia sido condenado pelo juiz federal Sérgio Moro, em primeira instância, a 20 anos e 10 meses de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro.

Dirceu, que ficou preso entre 2015 e 2017 e aguardava o recurso em liberdade graças a habeas corpus concedido pelo Supremo Tribunal Federal, ainda pode recorrer ao próprio TRF-4, em Porto Alegre. A defesa pode entrar com embargos de declaração. A execução da pena, que cabe a 13.ª Vara de Curitiba, só se dará após o julgamento desse recurso pelo tribunal.

O TRF-4 é a corte de apelação dos casos da Lava Jato. Essa é a 18.ª apelação criminal da operação julgada pelo tribunal. É o TRF-4 que analisará a condenação em primeira instância do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva – o petista foi sentenciado por Moro a 9 anos e 6 meses de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso do triplex do Guarujá (SP).

 

Tendência. O resultado das 18 apelações contra as sentenças de Moro mostra que a 8.ª Turma do TRF-4 tende a manter as sentenças do juiz ou revisá-las para cima. A maioria dos 81 apelantes não teve mudanças nas decisões de primeira instância. Em 28 vezes, as penas ou absolvições foram mantidas e, praticamente, a mesma quantidade de penas foram revistas para cima (27). No caso de Dirceu, a pena do ex-ministro foi aumentada porque o tribunal aplicou o concurso material nos crimes de corrupção em vez de continuidade delitiva.

Considerada ponto fora da curva é a absolvição, pela segunda vez, do ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto . Até agora, menos de 9% dos apelantes são absolvidos em segunda instância – e apenas 12% têm suas penas reduzidas pelo tribunal.

O julgamento, concluído ontem, havia sido iniciado no dia 13 deste mês e teve pedido de vista do desembargador federal Victor Luiz dos Santos Laus. O relator do caso no TRF-4, desembargador João Pedro Gebran Neto, havia votado por dobrar a punição imposta a Dirceu – 41 anos de cadeia.

Gebran Neto foi o que estipulou as penas mais altas para os réus, que foram diminuídas em função dos votos dos outros dois desembargadores membros da 8.ª Turma, Leandro Paulsen, revisor, e Victor Luiz dos Santos Laus.

 

‘Esquemas criminosos’. Segundo o relator no TRF-4, “os esquemas criminosos descobertos na Operação Lava Jato foram escancarados e violaram princípios norteadores da administração pública como a legalidade, a moralidade e a eficiência”. Dirceu é acusado pelo Ministério Público Federal de receber propina em contratos da Petrobrás. Neste caso, recursos ilícitos teriam sido acertados com a empreiteira Engevix, que teria pago propina em contratos superfaturados com a Diretoria de Serviços da Petrobrás.

Segundo a denúncia, a Engevix foi uma das empreiteiras que teriam formado um cartel para ajuste prévio de preços,

fraudando as licitações da Petrobrás a partir de 2005. De acordo com a sentença de Moro, proferida em maio do ano passado, parte da propina paga era redirecionada ao grupo político comandado por Dirceu no PT.

 

‘Vitória’. Na avaliação da defesa do ex-ministro José Dirceu, apesar do aumento da pena na segunda instância, a decisão de ontem do TRF-4 “não deixa de ser uma vitória, já que caminhávamos para mais de 40 anos de condenação”. “Há muito trabalho pela frente e acredito no sucesso”, declarou o criminalista Roberto Podval, defensor de Dirceu.

Tiveram as condenações confirmadas o ex-diretor da Petrobrás Renato Duque (pena foi aumentada de 10 anos para 21 anos e 4 meses) e o ex-vice-presidente da Engevix Gerson de Mello Almada (pena passou de 15 anos e 6 meses para 29 anos e 8 meses de detenção). Ao todo, eram dez réus nesta ação.

 

Brasília. Ex-ministro da Casa Civil José Dirceu deixa a sede da Polícia Federal em junho deste ano

 

Bendine

O TRF-4 manteve ontem a prisão preventiva de Aldemir Bendine, expresidente do Banco do Brasil e da Petrobrás alvo da Operação Lava Jato.

 

 

 

 

 

 

Eu não me chamo Antonio Palocci’, afirma ex-ministro

Por: Vera Rosa

 

BASTIDORES: Vera Rosa

 

Condenado a 30 anos e 9 meses de prisão, José Dirceu já admite que não terá muito tempo em liberdade, mas disse que jamais fará delação premiada nem acusará o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. “Eu não me chamo Antonio Palocci”, afirmou o exministro da Casa Civil, em recente conversa com amigos.

Ao saber ontem que o ex-ministro da Fazenda pediu desfiliação do PT em carta provocativa, na qual pergunta se o partido virou “uma seita guiada por uma pretensa divindade”, Dirceu não mostrou surpresa. Não é de hoje que ele vem dizendo que Palocci não resistiria ao cárcere e entregaria Lula para se salvar.

Desde que presidia o PT, Dirceu nunca confiou no homem escolhido pelo então presidente para comandar a economia. Lula, porém, sempre preferiu Palocci e, não fosse o escândalo da quebra do sigilo do caseiro Francenildo Costa, seria ele – e não Dilma Rousseff – o candidato do PT à Presidência, em 2010.

Dirceu está escrevendo sua biografia e promete contar bastidores do poder, mas já avisou que quem espera alguma revelação bombástica pode tirar o cavalinho da chuva. “Tenho fidelidade canina a Lula”, costuma dizer. No último dia 6, quando Palocci afirmou, em depoimento ao juiz Sérgio Moro, que Lula recebia propinas, Dirceu – visto como “guerreiro” no PT – enviou a amigos uma mensagem sem meias-palavras. “Só luta por uma causa quem tem valor. Os que brigam por interesse têm preço”, reagiu ele.

 

 

 

Tribunal absolve Vaccari pela segunda vez

Por: Júlia Affonso / Ricardo Brandt

 

Alvo do mesmo processo que o ex-ministro José Dirceu, o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto foi absolvido pelo Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF-4) por insuficiência de provas. Vaccari havia sido condenado a 9 anos de prisão nessa ação pelo juiz Sérgio Moro.

O desembargador Leandro Paulsen, revisor do caso, absolveu Vaccari por “falta de provas do seu envolvimento, especificamente nos fatos julgados na ação sob julgamento”. Paulsen afirmou que as informações dos delatores, neste caso, não têm provas de corroboração e os depoimentos nem sequer dizem respeito aos fatos narrados na denúncia.

É a segunda vez que o tribunal derruba sentença de Moro. Em junho, o ex-tesoureiro do PT havia sido absolvido de outra condenação, de 15 anos de prisão.

A nova absolvição de Vaccari, no entanto, não afeta a sua prisão preventiva, porque ela está determinada em outras sete ações penais que tramitam contra ele, segundo o revisor. O extesoureiro do PT está preso em Curitiba desde 2015.

Após a absolvição, a defesa de João Vaccari Neto afirmou que delações não são provas. “Nunca é demais lembrar que as informações trazidas por delator não são provas, carecendo, pois, de investigação para que o Estado busque provas que confirmem o que o delator falou. Assim, a palavra de delator deve ser recebida com muita reserva e total desconfiança, pois aquele que delata o faz para obter vantagem pessoal, que pode chegar ao perdão judicial”, disse o advogado do ex-tesoureiro, Luiz Flávio D’Urso.

Segundo ele, o tribunal “cumpriu a lei”. “A 8.ª Turma do TRF4, ao reformar mais uma sentença de 1.ª instância, absolvendo novamente o sr. Vaccari, cumpriu a lei e isto é que se espera da Justiça, na qual, o sr. Vaccari e sua defesa confiam.” / J.A. e R.B.