O Estado de São Paulo, n. 45272, 29/09/2017. Política, p.A4

 

 

Senado adia votação sobre afastamento de Aécio Neves

Poderes. Senadores decidem levar determinação da Primeira Turma do Supremo para o plenário, mas análise será na terça-feira; receio era de placar desfavorável ao tucano

Por: Thiago Faria / Felipe Frazão

 

Thiago Faria

Felipe Frazão

 

O Senado adiou ontem para a próxima terça-feira a votação que pode derrubar a decisão do Supremo Tribunal Federal que afastou o senador Aécio Neves (PSDB-MG) do mandato e determinou o seu recolhimento noturno. Embora um dos argumentos levantados foi o de que o adiamento daria tempo para que a Corte reveja, de alguma forma, as restrições impostas, houve receio de que a votação pudesse ser desfavorável ao tucano.

Apesar do esforço para mobilizar senadores, aliados de Aécio não conseguiram uma margem segura de votos para levar o assunto ao plenário. O requerimento que pedia urgência na análise do caso foi aprovado com o aval de 43 dos 52 senadores presentes na sessão. O placar teve apenas dois votos a mais do mínimo necessário para barrar as medidas restritivas contra o parlamentar tucano.

Ontem, a presidente do Supremo, ministra Cármen Lúcia, indicou que deve dar prioridade ao julgamento de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) que defende a consulta ao plenário do Congresso não só em caso de prisão, mas em caso de medidas cautelares contra integrantes do Poder Legislativo, como é o caso de Aécio.

O ministro da Corte Edson Fachin sinalizou também ontem a Cármen que vai liberar a ação o quanto antes para julgamento.

 

‘Conflito’. Dois dos senadores que votaram a favor do pedido de urgência, porém, indicaram que poderiam votar contra Aécio. Um deles foi o senador Cristovam Buarque (PPS-DF), que defendeu o adiamento em busca de um entendimento que reduza a crise entre os Poderes.

“É um tempo que podemos ganhar para tentar resolver essa questão, sem haver uma votação lá da Primeira Turma e outra votação aqui do plenário ( do Senado), criando um conflito que só interessa a dois grupos: os que são contra a democracia e os que temem a Justiça, têm raiva da Justiça”, disse Cristovam.

Numa tentativa de evitar o atrito com o STF, o presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), conversou com Cármen Lúcia anteontem. “Sou da paz, do amor, da conciliação, da moderação e do equilíbrio”, disse ele ao ser questionado se buscaria um acordo com a Corte. “Vou tentar uma conciliação até o último minuto.” Para o vice-presidente do Senado, Cássio Cunha Lima (PSDB-PB), essa solução poderia vir de um recurso da própria defesa de Aécio.

O tom de conciliação, porém, não foi unânime. O líder do PSDB no Senado, Paulo Bauer (SC), negou haver acordo com o Supremo para que a decisão sobre Aécio seja revista.

O criminalista Alberto Toron, advogado de Aécio, afirmou ao Estado que não cabe recurso da decisão da Primeira Turma ao plenário do Supremo, mas não descartou que algum ministro decida levar o caso ao plenário se for provocado, após os embargos declaratórios que a defesa deve apresentar quando o acórdão for publicado. Esse tipo de recurso não altera a decisão, mas é usado para dirimir dúvidas ou omissões.

Aécio foi notificado oficialmente ontem da decisão.

 

Petistas. O recuo estratégico do Senado também teve como elemento a ausência de mais da metade da bancada do PT. Após o partido defender ontem, em nota, que a Casa confrontasse a decisão do Supremo, cinco dos nove senadores da sigla não apareceram para votar. Dos quatro que votaram, dois foram contra a análise do caso pelo plenário.

O senador Jorge Viana (PT -AC), um dos que votaram a favor do requerimento, negou que o partido tenha voltado atrás e justificou a ausência dos colegas por compromissos assumidos anteriormente. Ele, no entanto, foi na contramão dos que defenderam o confronto e pregou o entendimento com o Judiciário. “Foi o Supremo que criou esse problema, cabe a ele resolver. Um caso como esse requer uma decisão do pleno.”

Com a repercussão negativa da participação do partido em acordo para que o Senado derrubasse a decisão do Supremo, o PT entrou ontem com nova representação contra Aécio no Conselho de Ética do Senado.

 

Decisão. Parlamentares conversam com o presidente do Senado, Eunício Oliveira (centro), durante a sessão na Casa

 

'Ganhar tempo'

“É um tempo que podemos ganhar para tentar resolver essa questão, sem haver uma votação lá da Primeira Turma e outra votação aqui do plenário ( do Senado)”.

Cristovam Buarque

SENADOR (PPS-DF)

 

 

 

 

Cármen Lúcia e Eunício conversam para reduzir impasse

Possibilidade de o Senado rever a decisão da Primeira Turma sobre o senador Aécio Neves é admitida por parte dos ministros do Supremo, mas poderia ser interpretada como um desgaste a mais na relação entre os dois Poderes
Por: Breno Pires / Rafael Moraes Moura

 

BASTIDORES : Breno Pires e Rafael Moraes Moura

 

Após a decisão da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) de afastar o senador Aécio Neves (PSDB-MG) de suas funções parlamentares, a presidente da Corte, ministra Cármen Lúcia, e o presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE),conversaram sobre formas de reduzir a crise e se dispuseram a apostar no diálogo para buscar uma solução para o caso.

A possibilidade de o Senado rever a decisão da Primeira Turma é admitida por parte dos ministros do Supremo, mas poderia ser interpretada como um desgaste a mais na relação entre os dois Poderes.

A hipótese de um recurso de Aécio ser levado ao plenário é descartada pela maioria dos integrantes do STF.

Na busca por soluções, emergiu a possibilidade de a Corte julgar uma ação direta de inconstitucionalidade, de relatoria do ministro Edson Fachin, que poderia esclarecer se o Senado pode rever medidas cau- telares impostas pelo Supremo a parlamentares que não sejam a prisão. Há um vácuo na legislação quanto a esse ponto.

A ação é de autoria de três partidos — o Partido Progressista (PP), o Partido Social Cristão (PSC) e o Solidariedade (SD).

Essas legendas querem que medidas cautelares previstas no Código de Processo Penal – como o recolhimento domiciliar noturno – que venham a ser impostas a membros do Legislativo sejam submetidas ao crivo do Congresso em um prazo de 24 horas. Aécio poderia ser beneficiado com esse entendimento.

No momento, os autos estão no gabinete do ministro Fachin para a elaboração do voto. A presidente do Supremo avalia que é plausível que o relator libere para julgamento em breve. “Seria muito bom essa ação ser julgada prontamente. Se Deus quiser, será breve ( o julgamento)”, afirmou Cármen Lúcia ontem. Ela deixou claro que o item será prioridade na pauta da Corte quando liberado para julgamento.

Questionada pelo Estado sobre a relação com o presidente do Senado, Cármen minimizou desgaste. “Estamos numa boa. Calma. O fim do direito é a paz, a finalidade do direito é a paz. Então, nós construímos a paz. A vida é assim”, disse Cármen.