Título: Acesso vedado às informações
Autor: Amado, Guilherme
Fonte: Correio Braziliense, 30/01/2012, Política, p. 2

Lei que garante a publicação de dados foi sancionada em novembro, mas práticas corriqueiras do governo mostram como sua aplicação será difícil. Órgãos relutam em revelar contratos e até a agenda de autoridades

Uma pesquisa recente da Controladoria-Geral da União (CGU) com 986 servidores de toda a Esplanada revelou que 47,6% deles pensam que a informação pública pertence ao governo. Com isso, dados corriqueiros, como o nome dos ministros que se reúnem com a presidente Dilma Rousseff ou o quanto foi pago em diárias a um procurador da República, são negados como se fossem questões de segurança nacional. Mas a iminente entrada em vigor da Lei de Acesso à Informação Pública, em maio próximo, deve mudar isso. Agora, o texto sancionado pela presidente em novembro passado explicita o que era defendido há anos pela sociedade: o acesso à informação pública deve ser assegurado à sociedade, sem condicionantes.

De acordo com a lei, Executivo, Legislativo e Judiciário, em todos os níveis, órgãos e estatais, devem adotar a transparência como regra e o sigilo, como exceção. Isso inclui respostas a perguntas que, hoje, os Três Poderes se recusam a dar. É o caso de dados sobre as atividades e a organização dos governos ou a implementação e a execução das políticas públicas, que são negados por uma série de ministérios. O empurra-empurra e as alegações como "ainda não é o momento para divulgar" geram o extremo de não se informar o conteúdo de uma reunião. Como em 16 de novembro, quando a chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, e o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, debateram o plano de combate ao crack. Com isso, assuntos de interesse público ficam guardados a sete chaves, como se pertencessem ao governo, e não à sociedade.

Segundo o diretor executivo da ONG Transparência Brasil, o economista Cláudio Abramo, a falta de transparência nesses e em outros dados dificulta a fiscalização pública sobre os governos. Saber com quem exatamente a presidente se reuniu e o que se discutiu permite à sociedade não só entender a que se dedica a pessoa eleita para governar o país, como também com quem ela discute temas públicos. "Esse é o tipo da coisa que faz a gente chegar mais perto da importância dessa legislação. É claro que nem toda reunião que a pessoa tem é pública. Se a Dilma tem um encontro político com o Lula, seria absurdo exigir que se divulgue o conteúdo. É uma questão de bom senso", defende.

Abramo vislumbra uma batalha judicial pela frente, na medida em que as informações, à revelia da lei, continuem sendo negadas pelos órgãos e, talvez, pela própria CGU. Pelo texto, quando um pedido de informação é negado, deve ser dada uma justificativa para a recusa. A partir daí, o cidadão pode recorrer à CGU para reivindicar o dado e, em última instância, à Justiça. "Vai demorar um tempo até que isso seja respeitado direito pelo governo", avalia o economista.

Cultura A existência, entre o funcionalismo público, de uma cultura de que a informação pertence ao governo, e não à sociedade, foi comprovada na pesquisa feita pela CGU no segundo semestre do ano passado. O levantamento, com servidores de diversos escalões, mostrou como é grande o arbítrio pessoal sobre o que é ou não informação pública.

A mesma cultura de falta de acesso impregnada no Executivo predomina no Legislativo e no Judiciário. Seja no Senado ou na Câmara, a cópia de um contrato firmado com uma empresa de manutenção, por exemplo, não é passada ao cidadão que a requisitar. A publicação automática de dados e documentos na internet facilitaria esse acesso. Atualmente, muitas das informações, principalmente do governo federal, estão disponíveis na internet. Mas nem sempre são fáceis de achar.

Os salários dos servidores públicos são um exemplo. Sua publicação já era obrigatória antes mesmo da Lei de Acesso, mas encontrá-los é uma tarefa árdua. No âmbito do governo federal, estão publicados no site do Ministério do Planejamento em uma tabela dentro de um arquivo que deve ser baixado de um segundo site hospedado na pasta. Mas os vencimentos não são informados individualmente. Hoje, apenas a prefeitura de São Paulo divulga o salário de cada funcionário, com o nome ao lado. A prática já foi assegurada por decisão do Supremo Tribunal Federal.

986 Número de servidores da Esplanada que participaram da pesquisa da CGU