Título: Governo vai evitar eventual fracasso
Autor: Caprioli, Gabriel
Fonte: Correio Braziliense, 08/02/2012, Economia, p. 11
Empresas foram agressivas nos lances dos leilões porque poderão contar com o socorro oficial se for necessário
O surpreendente ágio de 348% pago pelos consórcios que arremataram os aeroportos de Guarulhos, Brasília e Campinas pode ter sido estimulado pela expectativa velada dos investidores de que um eventual fracasso nos negócios será evitado pelo socorro do governo. A pesada participação do Estado na operação reforçou a desconfiança de analistas ouvidos pelo Correio em torno da capacidade de as empresas em cumprir as exigências dos contratos. Embora sejam vistas como portadoras de alguma experiência, as companhias são lembradas pelos tropeços, como no caso da argentina Corporación America, administradora de mais de 30 terminais na Argentina e com um histórico de problemas em privatizações. A operadora se associou à Engevix e controlará o terminal Juscelino Kubitschek.
As outorgas dos três aeroportos somaram R$ 24,53 bilhões e serão pagas em parcelas, pelo prazo das concessões, que vão de 20 a 30 anos. Do total de R$ 16 bilhões previstos em investimentos, 80% serão financiados pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). A Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero), dona dos terminais hoje, terá 49% do capital das companhias que explorarão os terminais. Arcará, portanto, com parte das aplicações de recursos e ainda manterá os custos da mão de obra atual, formada pelos servidores da companhia.
O grupo Invepar-ACSA, que garantiu a exploração de Guarulhos por R$ 16,2 bilhões, é composto em 90% pelos fundos de pensão das estatais Banco do Brasil (Previ), Caixa Econômica Federal (Funcef) e Petrobras (Petros). "Mesmo com toda essa mãozinha, a expectativa é de que, se não for bem, o governo socorre as empresas", afirmou um analista.
Para o professor da Universidade de Brasília e ex-presidente da Infraero Adyr da Silva, os estímulos são necessários para atrair a iniciativa privada para um investimento de alto risco e baixo retorno. "O amadorismo dos órgãos públicos levou esse setor a virar o patinho feio da privatização", alfinetou. Amaryllis Romano, sócia da Consultoria Tendências, lembrou que a própria dinâmica das obras reduz o apetite dos investidores. "Além do financiamento da concessão, ainda há o capital de giro. Os juros são altos e a maturação do investimento é demorada", comentou.
Silva ressaltou que outros consórcios não fizeram propostas agressivas, acima de seus valores iniciais. "Algumas empresas brasileiras que estão sempre nos leilões, por exemplo, não embarcaram em um risco acima do calculado. Administradores de aeroportos internacionais, como Cingapura e Zurique, também não entraram na jogada com tanto afinco. Eles são mais cautelosos", destacou.
Parte do mercado financeiro aprovou a atuação dos consórcios que abandonaram a disputa após as propostas com ágio mais alto. Stephen Trent, analista da Citi Corretora, avaliou que "prevaleceu a disciplina do capital". Trent destacou que o lance da CCR e da Zurique foi 54% inferior ao vencedor em Guarulhos, enquanto a oferta da Asur e da Advent ficou em patamar semelhante. "Estamos satisfeitos que as empresas cobertas pelo Citi tenham apresentado disciplina financeira", afirmou.