Título: Longe das urnas
Autor: Tahan, Lilian
Fonte: Correio Braziliense, 18/02/2012, Cidades, p. 21

Decisão do STF de assegurar a constitucionalidade da Lei da Ficha Limpa atinge em cheio políticos do DF que renunciaram para escapar da cassação ou que foram condenados pela Justiça. Com isso, o cenário para os próximos pleitos deve ser outro

A decisão dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a constitucionalidade da Lei da Ficha Limpa promete redesenhar o cenário político no Distrito Federal por, pelo menos, as duas próximas eleições. Vários políticos que, mesmo envolvidos em escândalos, se mantinham na vida pública, agora, estão impedidos de concorrer pelo prazo de oito anos, contado a partir das condenações ou do fim do mandato ao qual desertaram na tentativa de escapar da cassação. O ex-governador Joaquim Roriz (PSC) é um dos que serão afastados das urnas com a validade da Lei Complementar nº 135. Mas há outras figuras com expectativa de poder em Brasília que terão de colocar as barbas de molho até o cumprimento do castigo imposto aos políticos que, segundo a Justiça, têm a ficha suja.

O caso de Joaquim Roriz talvez seja o mais notável. Não apenas porque foi governador por 14 anos, tinha grande potencial eleitoral, mas especialmente porque não escondia o desejo de voltar às urnas em 2014. Com o julgamento da última quinta-feira, Roriz fica impedido de concorrer a qualquer cargo eletivo até 2023. O cálculo é feito com base no fim do mandato de senador (de 2007 a 2014), que ele abandonou para evitar a cassação. Quando cumprir o tempo exigido pela Lei da Ficha Limpa, Roriz terá quase 90 anos.

As circunstâncias apontam, portanto, que dificilmente Roriz voltará a disputar uma eleição, o que não tira o seu poder de influenciar nos próximos pleitos. Ao transferir mais de 30% dos votos para a mulher, Weslian, que nunca tinha concorrido a nenhum cargo, o ex-governador demonstrou que preserva importante patrimônio eleitoral. Entre seus herdeiros naturais estão as duas filhas, Jaqueline (deputada federal) e Liliane (distrital), além de Rogério Rosso, que governou o DF por nove meses. Embora naturalmente enfraquecido, uma possível indicação ou mesmo a decisão de não indicar ninguém poderá ajudar a definir os rumos da sucessão em 2014.

Mandato cassado Com uma trajetória que acompanha a Câmara Legislativa desde sua fundação, em 1991, Benício Tavares (PMDB) também será atingido em cheio pelas regras da Ficha Limpa. No ano passado, ele teve o mandato cassado pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE) por abuso de poder econômico e compra de votos. Antes de ser punido com a perda do mandato, no entanto, já havia se enrolado em outros escândalos (veja acima). Acabou absolvido pela Justiça, mas na época, em 2004, quando era o presidente da Câmara Legislativa, teve a imagem muito desgastada. Com a validação da Lei da Ficha Limpa, Benício, que foi distrital nas últimas seis legislaturas, ficará impedido de se candidatar até 2019.

Há dois anos, o escândalo da Caixa de Pandora extirpou da cena política várias figuras até então poderosas na capital. Agora, a Ficha Limpa vai mantê-las afastadas das urnas por um bom tempo. Como renunciaram para escapar de cassação, o deputado das meias, Leonardo Prudente, e o da oração da propina, Júnior Brunelli, ficam afastados do processo eleitoral até, pelo menos, 2018. Situações como o do ex-vice-governador Paulo Octávio e de Cristiano Araújo (PTB) prometem polêmica. Paulo Octávio diz que não havia nenhum processo de cassação em andamento contra ele e que tomou a decisão "em nome de Brasília" e porque a crise atingia o seu partido, o DEM. Com relação a Cristiano Araújo, os assessores jurídicos alegam o princípio da intangibilidade, segundo o qual quem foi julgado e cumpriu pena antes de existir a lei não seria atingido.

Colaborou Ana Maria Campos

Improbidade Com base na lei, a Justiça Eleitoral barrou a candidatura de centenas de políticos nas eleições de 2010. A maior parte dos casos referia-se à condenação por órgão colegiado. Esse era o caso do deputado federal Paulo Maluf (PP-SP), condenado em abril de 2010 por improbidade administrativa, sob a acusação de ter superfaturado uma compra na época em que exercia o cargo de prefeito de São Paulo. Mesmo com o registro indeferido, ele concorreu à reeleição, tendo recebido 497 mil votos.

Ficará inelegível até 2023 Joaquim Roriz (PSC)

Renunciou ao cargo de senador em 2007, quando teve o nome envolvido no escândalo conhecido como Bezerra de Ouro. Na época, Roriz foi beneficiado, segundo o Ministério Público, de forma ilegal pelo desconto de um cheque de R$ 2,2 milhões em nome do empresário Nenê Constantino. O responsável pela operação era o então presidente do BRB, Tarcísio Franklim de Moura, que teria atendido a um pedido do ex-governador e autorizado que o cheque do Banco do Brasil fosse pago pela tesouraria do BRB. A negociata veio no bojo das investigações da Operação Aquarela e, para escapar da cassação, Roriz acabou abrindo mão do mandato.

Ficará impedido de concorrer até 2018 Leonardo Prudente (sem partido)

Era presidente da Câmara Legislativa em 2009 quando estourou a Caixa de Pandora. Foi flagrado em vídeo enfiando dinheiro entregue por Durval nas meias, o que lhe rendeu o apelido de o "deputado das meias". Deixou a presidência, renunciou ao partido e ao cargo de distrital. Estava no segundo mandato. Dono de empresas no setor de vigilância e serviços gerais, tinha pretensões de crescer na política.

Ficará impedido de concorrer até 2018 Júnior Brunelli (sem partido)

Filho de pastor, tinha o rebanho de fiéis como sua principal plataforma política. Na Operação Caixa de Pandora, foi acusado por Durval Barbosa de ser um dos beneficiários das mesadas pagas pelo próprio delator. Também foi filmado rezando abraçado a Durval e a Prudente, cena que ficou conhecida como a oração da propina.

Ficará inelegível até 2018 Pedro Passos (PMDB)

O ex-distrital já tem condenações no Tribunal de Justiça do DF por improbidade administrativa, parcelamento ilegal do solo e crime ambiental. Está, portanto, enquadrado na Ficha Limpa. Renunciou ao mandato de deputado em 2007 para escapar de processo de cassação pelo envolvimento nos crimes investigados na Operação Navalha, que apurou favorecimento à construtora Gautama.

Ficará impedido de concorrer até 2016 Cristiano Araújo (PTB)

Foi condenado por abuso de poder econômico nas eleições de 2006. Segundo a denúncia, cabos eleitorais de Cristiano teriam coagido empregados da Fiança, que pertence à sua família, a votar nele. Foi punido com três anos de inelegibilidade. Os advogados de Cristiano alegam o princípio da intangibilidade, segundo o qual quem foi julgado e cumpriu pena antes de existir a lei não seria atingido.

Ficará inelegível até 2019 Benício Tavares (PMDB)

Teve o mandato de distrital cassado pelo TRE em 2011, decisão respaldada pelo TSE. Perdeu o mandato na sexta legislatura, porque foi condenado por abuso de poder econômico e compra de votos. Antes da cassação, havia se envolvido em outros escândalos, como o do desvio de recursos de uma associação de deficientes e a acusação de abuso sexual de menores durante pescaria.

Pode ficar inelegível até 2018 Paulo Octávio (sem partido)

Era o vice-governador quando estourou a Operação Caixa de Pandora. Com a prisão de José Roberto Arruda, em fevereiro de 2010, assumiu interinamente o governo. Com menos de um mês, no entanto, renunciou ao cargo. Paulo Octávio alega que desistiu do posto "em nome de Brasília" e porque a crise da Pandora atingiu o seu partido, DEM. Além disso, ressalta que não havia processo aberto contra ele.

Ficará inelegível por décadas Luiz Estevão (PMDB)

Teve o mandato de senador cassado, em 2000, e chegou a ser preso pelo envolvimento de desvios de dinheiro na construção do TRT de São Paulo. Responde a processos, alguns deles com condenação. Em uma das ações, a 6ª Turma do STJ manteve, em 2010, a condenação de Estevão por corrupção ativa. Tem atuado nos bastidores da política, mas nega com ênfase intenção em voltar a ser candidato.