Correio braziliense, n. 19872, 19/10/2017. Política, p. 02.

 

Temer passa pelo teste na CCJ

Paulo de Tarso Lyra e Guilherme Mendes

19/10/2017

 

 

PODER EM CRISE » Por 39 votos a 26, deputados aprovam relatório do tucano Bonifácio de Andrada, contrário ao prosseguimento da denúncia contra o presidente. Próxima batalha, no plenário da Câmara, está marcada para a quarta-feira

 

 

Depois de dois dias de debates protagonizados pela oposição e ao qual o governo ignorou para ganhar tempo, a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara aprovou, por 39 votos a 26, o relatório do deputado Bonifácio de Andrada (PSDB-MG) contrário ao prosseguimento da denúncia contra o presidente Michel Temer. O placar final, influenciado pela briga política no PSB (leia mais na página 3) é um pouco diferente da análise da primeira denúncia, em julho, quando os governistas venceram por 40 a 25.

“O PSB nos roubou dois votos. Brinquei com o Julinho, meu amigo pessoal (Júlio Delgado, novo líder do PSB) que ele poderia ter mantido a coerência da líder anterior, que explicitou a divisão interna da bancada”, brincou o vice-líder do governo, Beto Mansur (PRB-SP). Segundo ele, conhecido pela paciência e habilidade em mapear votos e dissidências, todos os demais partidos, inclusive o PSDB, repetiram as mesmas votações da denúncia anterior.

Conhecido pela fidelidade ao presidente Michel Temer — chegou a tatuar com hena o nome do peemedebista na época em que a Câmara analisava a denúncia por corrupção passiva —, o deputado Wladimir Costa (PSD-PA) chegou esbaforido à CCJ, tentando, de última hora, substituir o deputado Major Olímpio (SD-SP). Não deu tempo. “O meu voto valeu, eles tentaram me trocar, mas eu já tinha votado”, divertiu-se Olímpio, que chamou o governo de PCP, Primeiro Comando do Planalto, numa alusão à organização criminosa que comanda os presídios de São Paulo.

Em uma tentativa de demonstrar desprendimento em relação ao que acontecia na Câmara — embora tenha escrito uma carta duríssima aos parlamentares dizendo ser vítima de uma conspiração —, Temer afirmou que o decreto sobre transplante de órgãos assinado por ele à tarde era mais importante do que a votação na CCJ. “Neste momento em que nós assinamos esse decreto, eu digo que o ato mais importante do dia de hoje, embora a Comissão de Constituição e Justiça esteja proferindo o seu parecer agora, mas o dia mais importante para mim, o fato mais importante do dia é, precisamente, este ato. De modo que eu fico muito honrado pela oportunidade de ter assinado esse decreto, e tenho absoluta convicção de que ele produzirá os melhores efeitos”, disse Temer, conforme discurso divulgado pela Secretaria Especial de Comunicação Social da Presidência da República, depois de cerimônia restrita no Palácio do Planalto.

Na defesa do próprio relatório na CCJ, Bonifácio afirmou que faltavam “elementos” para comprovar a acusação feita pela PGR contra Temer e seus dois principais auxiliares. O tucano mineiro também rebateu as críticas de que estaria atuando sem imparcialidade, por ser da base aliada. “Eu sou relator, não sou líder do governo. Não tenho de defender A, B ou C, tenho de defender a Constituição”, disse.

Em sua manifestação, o advogado de Temer, Eduardo Carnelós, fez críticas à atuação da PGR e disse esperar “que a era de arbítrio seja banida do país”. Os advogados dos dois ministros seguiram a mesma linha. “Estamos diante de uma denúncia inepta, vazia e de um Ministério Público que obrou de maneira ideológica”, disse Daniel Gerber, que representa Padilha no processo. Para Antônio Pitombo, que defende Moreira Franco, a PGR cometeu “uma série de erros e abusou do exercício de acusar”.

 

Substituições

“Mesmo na CCJ, onde o governo substitui membros pra manipular o resultado, a votação final foi pior do que eles esperavam. No plenário, a votação contra Temer vai aumentar muito, lá não há como trocar membros”, disse o deputado Alessandro Molon (Rede-RJ). Durante a votação e antes do anúncio do resultado, os oposicionistas, segurando cartazes alusivos ao decreto que flexibiliza as regras do trabalho escravo, gritavam “Fora Temer” e “não ao gavetão”.

Ao encaminhar a votação, o deputado Paulo Teixeira (PT-SP) afirmou que houve uma “permuta” entre PMDB e PSDB: em troca do relatório favorável de Bonifácio, o partido de Temer teria ajudado a livrar o senador Aécio Neves (PSDB-MG) das medidas cautelares impostas pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Assim como na primeira denúncia, no entanto, a bancada tucana votou em sua maioria contra Temer na CCJ — foram cinco votos a dois.

Também houve tumulto quando o deputado Ivan Valente (PSOL-SP) acusou o governo de comprar votos para garantir a permanência de Temer na Presidência. Parlamentares da base reagiram aos gritos no plenário. “Veja como eles estão nervosos. Eles sabem que a verdade aparece, mais cedo ou mais tarde”, devolveu Valente.