Título: São Paulo virou um mero trampolim
Autor: Lyra, Paulo Tarso de
Fonte: Correio Braziliense, 05/03/2012, Política, p. 2

Na disputa para comandar a principal cidade do país, importa mais aos candidatos se cacifarem para voos maiores em 2014, seja ao Planalto ou ao Bandeirantes

Uma cidade com 11 milhões de habitantes, 17 mil quilômetros de rodovias, 40 hospitais públicos, 1.500 escolas e 1.796 estabelecimentos de saúde já embute, em si própria, uma miríade infinita de problemas para qualquer administrador público. Se essa mesma cidade conta com o terceiro orçamento do país — atrás apenas do Federal e o do estado do qual é capital —, o desafio torna-se um pouco mais palpável. Mesmo assim, a disputa pela prefeitura de São Paulo, que acontecerá em outubro, foi relegada a segundo plano.

Os partidos postulantes ao cargo — PT, PMDB, PSDB e outros coadjuvantes — sonham com a prefeitura apenas como um atalho para o governo do estado e a Presidência da República, em 2014. "São Paulo não pode transformar-se em um mero tabuleiro de xadrez, a cidade precisa ser respeitada em si mesma", defende o candidato do PMDB à prefeitura, Gabriel Chalita. Mas a própria legenda que o abriga pensa diferente.

Apesar do discurso de que está pensando nos problemas cotidianos dos moradores da capital paulista, o PMDB aposta alto em Chalita como uma maneira de resgatar o prestígio do partido no maior estado do país e mostrar força para pleitear a permanência na chapa presidencial de Dilma Rousseff daqui a dois anos.

No interior de São Paulo, o PMDB sempre foi forte, herança de um período de ascendência quercista — Orestes Quércia, ex-governador, com base eleitoral em Campinas e morto em 24 de dezembro de 2010. Na capital, no entanto, a legenda não existe. Não tem sequer um vereador. O próprio vice-presidente da República, Michel Temer, o maior entusiasta da candidatura Chalita, foi eleito em 2006 graças ao quociente eleitoral. O posto de vice na chapa de Dilma Rousseff em 2010 evitou a possibilidade de novo vexame.

O partido tenta esquivar-se das críticas, transferindo para o PT e o PSDB o discurso de nacionalização da disputa municipal. "O Serra (José Serra) é quem está mais pensando dessa forma. Na própria entrevista na qual confirmou sua pré-candidatura, ele disse que o desejo de ser presidente, está, por enquanto, "dormitando"", criticou um interlocutor de Chalita.

Eles também sabem que, se falharem na missão de eleger Chalita ou se a candidatura do PMDB "melar" a campanha do petista Fernando Haddad, o PSB está prontinho para pleitear a vaga de vice de Dilma Rousseff em 2014. "O PSB faz promessas mas vota contra o governo no Congresso. Nós temos candidatura mas permanecemos alinhados ao Planalto", provocou um peemedebista.

Governo à vista O PT foi o primeiro que entabulou, inspirado no discurso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a tese de que a disputa pela prefeitura de São Paulo não envolve apenas o direito a administrar a maior cidade do país. É um primeiro passo para que o partido conquiste o inédito Palácio dos Bandeirantes (sede do governo estadual), completando o ciclo hegemônico Brasil-São Paulo-cidade de São Paulo. Um dos coordenadores do programa de governo do PT, o deputado Carlos Zarattini (SP), também tenta isentar seu partido. "Nós vamos fazer uma campanha preocupados com os problemas concretos da cidade, toda segunda e sexta o Haddad tem visitado a periferia para saber as carências", disse Zarattini.

No PSDB, o clima esquentou com a chegada de José Serra para a disputa das prévias. A primeira troca foi a alteração da data das prévias, marcada inicialmente para 4 de março e transferida para o dia 25. "Se as prévias tivessem acontecido ontem (dia 4), o Serra ficaria em terceiro. E tenho minhas dúvidas se esse quadro se altera até o dia 25", disse o pré-candidato do PSDB José Aníbal. Ele acusa o adversário interno de querer nacionalizar a disputa. "A presidente Dilma escapou da armadilha e afirmou não ser "candidata a prefeita e sim, presidente da República". E vem o Serra dizer que não desistiu da disputa presidencial", criticou Aníbal.

Até o PRB do ex-deputado Celso Russomano foi jogado no turbilhão. Para atrair a simpatia da legenda e dos evangélicos para a candidatura de Fernando Haddad, Dilma nomeou Marcelo Crivella como novo ministro da Pesca. "Toda vez que isso acontece, quem fica esquecido é o povo. Essas pessoas precisam entender que é uma honra governar uma cidade que tem o terceiro maior orçamento do país", disse Russomano.

Hegemonia O Palácio dos Bandeirantes é considerado pelos petistas o bunker nacional tucano. Tudo porque o PSDB conseguiu emplacar os últimos quatro governadores paulistas — desde 1994, o pleito estadual tem um peessedebista como vencedor. A hegemonia começou com a eleição de Mário Covas em 1994 e 1998. Continuou com Geraldo Alckmin em 2002 e José Serra, em 2006. O ciclo se manteve em 2010, com o retorno de Alckmin à ribalta.

Quem está de olho no cargo

PT Fernando Haddad » Ex-ministro da Educação do governo Lula e professor licenciado do Departamento de Ciências Políticas da USP, foi o nome escolhido pelo ex-presidente para derrotar o tucanato em São Paulo.

PRB Celso Russomanno » Ex-deputado federal e jornalista, aparece bem colocado nas pesquisas de intenção de voto para a prefeitura. É apresentador de programas jornalísticos com cunho popular, voltados para os direitos do consumidor, principalmente.

PMDB Gabriel Chalita » Ex-tucano e ex-PSB, Chalita foi secretário de Educação do governo de Geraldo Alckmin (PSDB) e atualmente é deputado federal.

PCdoB Netinho de Paula » Cantor de pagode e apresentador de televisão, Netinho de Paula é vereador por São Paulo.

PPS Soninha Francine » Ex-apresentadora de televisão em programas de música e comentarista de futebol em canais esportivos, foi subprefeita de São Paulo durante a gestão de Gilberto Kassab (PSD).

PSDB* José Serra » Ex-prefeito, ex-governador, ex-ministro da Saúde e ex-ministro do Planejamento, foi derrotado em duas eleições presidenciais.

Ricardo Tripoli » Ex-vereador, ex-presidente da Assembleia Legislativa de São Paulo e aliado do falecido Mário Covas, exerce atualmente o mandato de deputado federal.

José Aníbal » Deputado federal e ex-líder do partido na Câmara, é o atual secretário estadual de Energia de São Paulo.

*O PSDB vai realizar prévias para definir o candidato em 25 de março