Correio braziliense, n. 19872, 19/10/2017. Política, p. 04.

 

Briga pelo comando do PSDB

Natália Lambert

19/10/2017

 

 

PODER EM CRISE » Após ajudarem Aécio a retomar o mandato, tucanos querem que ele abra mão da presidência do partido. Tucano se defende no plenário

 

 

Menos de 24 horas depois de derrubarem as punições impostas ao senador Aécio Neves (MG) pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), lideranças do PSDB cobraram o apoio, pedindo que o mineiro abra mão da presidência da legenda, o que expõe ainda mais o racha interno. No início da noite de ontem, após o parlamentar retornar à Casa e discursar rapidamente em plenário, tucanos se reuniram no gabinete do presidente interino do partido, Tasso Jereissati (CE), para pedir que Aécio reflita sobre a situação e dê uma resposta na próxima semana.

Junto aos integrantes da bancada, Jereissati explicou que os senadores fizeram uma análise profunda dos últimos acontecimentos e sobre o futuro próximo do partido. “A decisão final ficará a critério do senador Aécio Neves, que vai fazer uma avaliação política e pessoal sobre todas as questões colocadas”, explicou. “Vivemos um momento muito delicado e isso exige uma definição. Não podemos mais ficar em situações provisórias mesmo diante do curto prazo para a eleição da nacional”, acrescentou. O PSDB fará eleição da Executiva Nacional em 9 de dezembro, e há uma forte briga interna: parte apoia a condução de Tasso ao comando, enquanto outra defende o nome do governador de Goiás, Marconi Perillo.

Apesar de Aécio ter deixado a reunião mais cedo dos que os colegas, o presidente interino da legenda disse que não houve constrangimentos e que ele teria saído por causa de uma viagem. “O senador tem plena consciência do que vivemos e da crise que o próprio partido vive. Ele tem consciência dos deveres dele para com o país, com a história dele e com o partido e vai fazer uma avaliação”, disse, projetando o prazo da semana que vem para uma resposta.

 

Malvisto

Pela manhã, Jereissati e Cássio Cunha Lima (PSDB-PB) já haviam defendido a renúncia do tucano mineiro da presidência da legenda. O cearense está à frente do partido desde 18 de maio, quando Aécio foi afastado do mandato pela primeira vez por determinação do ministro do STF Edson Fachin. Em áudios divulgados na delação de Joesley Batista, ele apareceu pedindo R$ 2 milhões ao empresário, que, segundo a Procuradoria-Geral da República, seria propina. O tucano alega ter pedido um empréstimo, oferecendo, inclusive, um apartamento da família em troca.

A atitude de Jereissati foi malvista na ala governista do PSDB na Câmara. “Essa pressão do Tasso é traição. Viu que o Aécio teve uma vitória e quer enfraquecê-lo. Ele não tem mais condições de representar o partido como um todo, já que está defendo o interesse só de alguns e dele próprio”, comentou um tucano, que prefere manter o anonimato. Para ele, a legenda tem quatro desafios à frente: a votação da denúncia contra o presidente Michel Temer no plenário, a eleição dos líderes das bancadas, a escolha da Executiva Nacional e a definição do candidato à Presidência da República. “São quatro grandes obstáculos que, assim que superados, o partido estará unido e forte novamente”, ressaltou.

Já o outro lado do PSDB, os chamados cabeças-pretas, também defende a renúncia do mineiro e a condução definitiva de Tasso à presidência da legenda. “O Aécio não tem mais condições de permanecer atuando e tomando decisões em nome do partido. Atualmente, ele tem sido mais um ponto desestabilizador do que agregador”, afirmou um outro tucano, da ala contra o governo de Michel Temer. Apesar dos discursos contrários, nos bastidores entende-se que o tucano mineiro deve permanecer no comando da legenda até o fim do mandato, que termina no próximo mês.

 

Discurso

No fim da tarde de ontem, Aécio retornou ao plenário do Senado após receber o apoio de 44 colegas para voltar às atividades parlamentares. Sem subir à tribuna, em pé, ao microfone, agradeceu o voto dos parlamentares e se disse vítima de uma ardilosa armação. “Uma criminosa armação perpetrada por empresários inescrupulosos, que enriqueceram às custas do dinheiro público e não tiveram constrangimento de acusar pessoas de bem na busca dos benefícios em uma inaceitável delação suspensa em razão de parte da verdade estar vindo à tona”, discursou.

Durante a breve fala, o tucano aproveitou para atacar o ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot, ao dizer que ele contribuiu para a trama ardilosa, mas o mineiro não citou o nome do desafeto explicitamente. Ao fim, afirmou que trabalhará durante o resto do mandato para provar a inocência. “Fui, sim, alvo dos mais vis e graves ataques nos últimos dias, mas não retorno a esta Casa com rancor ou com ódio. Venho acompanhado da serenidade dos homens de bem, daqueles que conhecem a própria história. E a minha história é honrada, é digna e de dedicação, ao longo de quase 40 anos, aos mineiros e ao Brasil.”

 

Frase

“Vivemos um momento muito delicado e isso exige uma definição. Não podemos mais ficar em situações provisórias”

Tasso Jereissati, presidente interino do PSDB