Correio braziliense, n. 19876, 23/10/2017. Economia, p. 06.

 

PF acusa Pimentel e Coutinho

23/10/2017

 

 

INVESTIGAÇÃO » Relatório da Operação Acrônimo afirma que pagamentos do Casino a empresa foram repassados entre 2012 e 2014 a Carolina de Oliveira, mulher do então ministro do Desenvolvimento, por ter impedido empréstimo do BNDES ao Pão de Açúcar

 

 

Em relatório encaminhado ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) no âmbito da Operação Acrônimo, a Polícia Federal concluiu que o governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel (PT), atuou com a ajuda do ex-presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) Luciano Coutinho para favorecer o Grupo Casino ao não liberar empréstimo para viabilizar a fusão do Pão de Açúcar com o Carrefour. Na época dos fatos investigados, Pimentel chefiava o Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços e presidia o Conselho de Administração do banco público.

Segundo a PF, Pimentel e Coutinho se articularam para impedir a concretização de um empréstimo do BNDES para o empresário Abilio Diniz, que, à época, buscava apoio do banco para a fusão do Pão de Açúcar com o Carrefour. Em fevereiro de 2011, Diniz apresentou o projeto de fusão a Coutinho, que teria autorizado a realização de estudos técnicos sobre a operação. À época, o empresário e os franceses do Grupo Casino disputavam o controle do Pão de Açúcar.

Para inviabilizar a operação de fusão, o Grupo Casino efetuou, segundo a PF, pagamentos para uma empresa em contrapartida à inclusão de uma cláusula em desfavor de Diniz, que tratava da obrigatoriedade de o Pão de Açúcar não possuir qualquer disputa judicial com os franceses para poder ter acesso ao dinheiro do BNDES.

De acordo com o relatório da PF, os valores foram entregues à MR Consultoria, empresa do jornalista Mário Rosa, que intermediou o repasse de 40% do montante para a mulher de Pimentel, Carolina de Oliveira. Em troca da inclusão da cláusula e da manutenção da situação de interesses do grupo, foram pagos R$ 8 milhões pelo Casino à MR Consultoria. A PF concluiu que a empresa intermediou o repasse de parte do valor para a atual primeira-dama de Minas Gerais.

“Todos os indícios obtidos apontam que Fernando Pimentel, utilizando-se do seu cargo, foi auxiliado por Luciano Coutinho com o escopo de atender a solicitação feita pelo ministro do MDIC, para viabilizar a inserção de cláusula condicionante de ausência de litígio no pedido de apoio financeiro apresentado pelo empresário Abilio Diniz junto ao BNDES”, diz o relatório assinado pela delegada Denisse Dias Rosas Ribeiro, coordenadora da Operação Acrônimo.

Ainda no relatório, a PF conclui que a inclusão da cláusula, na prática, significou “a manifestação prévia do BNDES sobre a necessidade de consenso entre o Grupo Casino e a família Diniz para a obtenção do apoio financeiro pleiteado”, o que cancelou antecipadamente a fusão.

Com isso, a PF indiciou Coutinho, Carolina de Oliveira e Mário Rosa por corrupção passiva. Por ter foro privilegiado no Superior Tribunal de Justiça (STJ), devido ao cargo de governador, Fernando Pimentel não foi indiciado. Caberá à corte deliberar sobre isso. Já os executivos Ulisses Kameyama e Eduardo Leônidas, que teriam intermediado os pagamentos, foram indiciados por corrupção ativa. Leônidas era executivo do Casino à época e hoje atua como diretor de Desenvolvimento e Estratégia no Grupo Pão de Açúcar.

 

Cronologia

A PF detalha no relatório a cronologia da contratação da empresa MR Consultoria, do jornalista Mário Rosa, e os pagamentos efetuados pelo Grupo Casino com os posteriores repasses feitos para a OLI Comunicação, empresa da primeira-dama de Minas Gerais. Em 1º de julho de 2011, a MR Consultoria e o Casino assinaram contrato de R$ 2 milhões válidos entre julho daquele ano e junho de 2012. A primeira parcela foi recebida quatro meses depois, em 17 de novembro de 2011.

Em 24 de abril de 2012, Carolina abriu uma conta para a OLI. Na mesma data, ela recebeu um cheque de R$ 85 mil da empresa de Mário Rosa. Esse teria sido apenas um dos repasses. Segundo a Polícia Federal, entre 2013 e 2014, ainda foram identificadas outras 15 transferências da MR Consultoria para a OLI. No total, a empresa da mulher de Pimentel recebeu R$ 2,8 milhões.

Para a PF, “não há nenhum elemento concreto que evidencie a efetiva participação de Carolina na prestação de serviço objeto do referido contrato e que justifique o recebimento de quase metade do valor pago pelo Grupo Casino” à empresa de Mário Rosa. A investigação demonstra que Carolina seria o “elo entre os interesses do Grupo Casino e Fernando Pimentel, então ministro do MDIC, e com influência junto à presidência do banco público”.

A defesa da primeira-dama de Minas considera o relatório “mais uma tentativa de manter de pé uma investigação frágil e eivada de irregularidades, que se arrasta há mais de dois anos e que jamais encontrou qualquer ligação ilícita entre os envolvidos”. “Refutamos veementemente as conclusões da autoridade policial nesse inquérito e reafirmamos nossa confiança na Justiça, que saberá examinar com a necessária isenção e, ao final, rejeitar as acusações, todas elas desprovidas de qualquer fundamento”, comentou o advogado Thiago Bouza.