Correio braziliense, n. 19884, 31/10/2017. Política, p. 3

 

O ocaso da delação da JBS

Bernardo Bittar 

31/10/2017

 

 

PODER EM CRISE » Depois de rescindida pelo ex-procurador Rodrigo Janot, colaboração premiada dos irmãos Batista perde sentido e os prazos

Terminou ontem o prazo para a entrega dos anexos das delações premiadas de Joesley Batista e Ricardo Saud, da J&F. Rescindidas em 14 de setembro pelo ex-procurador-geral da República, Rodrigo Janot, uma parte da colaboração deles deveria ter sido enviada ao Ministério Público Federal (MPF) até o dia 30 de outubro. Mas, como a dupla perdeu os benefícios, a delação parou de fazer sentido. A Procuradoria-Geral da República (PGR) informou que “o processo está suspenso”, mas, internamente, acredita-se que a instituição está sem saber o que fazer.

A situação é inédita. A entrega dos anexos foi acertada quando a delação ainda estava valendo. Como eles perderam os benefícios e não devem mais colaborar, não há mais sentido. “Eles não vão ajudar nas investigações. Primeiro, porque não vão receber mais nenhum benefício. Segundo, porque, embora os depoimentos deles tenham ajudado bastante, eles não têm mais credibilidade perante a Procuradoria, porque omitiram informações quando deveriam ter feito o oposto”, disse um procurador ligado ao gabinete do ex-chefe do MP Rodrigo Janot. “Foi o primeiro caso, a primeira delação cancelada. Isso é bom para os suspeitos entenderem que não são intocáveis, mas pode tirar a credibilidade desse processo, por torná-lo frágil. Mas a verdade é que ninguém sabe o que fazer”, afirmou.

Omissão

Segundo a PGR, a falta de interesse dos acusados em entregar novas pistas pode acabar qualificada como omissão de provas e piorar ainda mais a situação dos executivos. Joesley tinha se comprometido em ajudar a Justiça assim que suas empresas começaram a ser citadas em depoimentos da Lava-Jato, Wesley, irmão e sócio, mantinha-se distante do processo, e o executivo Ricardo Saud também vivia sem grandes complicações. O Supremo Tribunal Federal (STF) homologou o acordo em 18 de maio de 2017, a partir da delação premiada com Joesley e Wesley Batista e outros executivos da empresa. Ninguém havia sido preso.

O acordo, inclusive, foi bastante criticado porque Joesley havia se mudado para os Estados Unidos enquanto as investigações envolvendo a empresa dele ainda engatinhavam. Meses depois da mudança, áudios entregues por engano à PGR culminaram na prisão dos três executivos. As gravações reproduziam conversas entre o time JBS, advogados e até alguns integrantes do Ministério Público.

Qualificando os áudios como “extremamente graves”, Janot pediu o cancelamento do acordo com os irmãos Batista. Descobriu-se, pouco tempo depois, que a família teria usado informações privilegiadas para fraudar o mercado financeiro. A Justiça pediu a prisão de Joesley e Wesley, que estão em São Paulo; e Ricardo, atualmente em Brasília. O Correio tentou entrar em contato com um dos advogados da dupla, Pierpaolo Bottini, mas ele não retornou as ligações até o fechamento desta reportagem.