Título: Cala-boca e demissão
Autor: Nunes, Vicente ; Vieira, Marta
Fonte: Correio Braziliense, 01/03/2012, Economia, p. 11

Palácio do Planalto enquadra comandantes do BB e da Previ, mas sacramenta substituição de vice-presidente do banco

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, gastou boa parte do dia de ontem para pôr em prática as determinações da presidente Dilma Rousseff. Ele não só mandou Aldemir Bendine, presidente do Banco do Brasil, e Ricardo Flores, presidente da Previ, o fundo de pensão dos empregados da instituição financeira, pararem de brigar em público, como os avisou que há uma determinação para demiti-los caso insistam em manter acesa a briga por poder que está criando um enorme desgaste político para o governo. "O recado do ministro foi claro: ou eles calam a boca ou serão demitidos sumariamente. A presidente não quer mais saber de intriga envolvendo o maior banco do país e o principal fundo de pensão da América Latina", disse um assessor do Palácio do Planalto.

Até ontem pela manhã, havia a determinação dentro do governo de afastar Ricardo Flores do comando da Previ, por entender que ele havia alimentado a disputa com Bendine. Mas negociações políticas convenceram o Planalto a não anunciar qualquer decisão até que se apure, a fundo, de onde estão partindo todas as informações que transformaram o BB e a Previ em um campo minado. A Fazenda também está colhendo dados para saber qual deles está envolvido no vazamento dos extratos bancários protegidos por sigilo do ex-vice-presidente do BB Allan Toledo Simões. Os documentos estão circulando livremente pela Esplanada dos Ministérios, mostrando que ele movimentou quase R$ 1 milhão no primeiro semestre de 2011. Apesar de garantir que o dinheiro é legal, Simões está sendo investigado pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf).

O Planalto não terá, porém, a mesma condescendência com Ricardo Oliveira, vice-presidente da área de Governo. A demissão dele está praticamente sacramentada e deve ser anunciada pelo presidente do Conselho de Administração do banco, Nelson Barbosa, nos próximos dias. Para uma ala de assessores de Dilma e do PT, é ele quem está por trás das intrigas que varreram Brasília. Oliveira teria acumulado o arsenal desde a escolha do substituto de Roger Agnelli para o comando da mineradora Vale no início do ano passado. Bendine tentou ocupar o cargo, mas acabou sendo vetado por Flores, presidente do Conselho de Administração da empresa. O escolhido foi Murilo Ferreira.

Depois de ouvir argumentos de todos os lados, Dilma optou por não tomar nenhuma medida precipitada, pois estão no rolo duas instituições fortes e superavitárias. O BB registrou, em 2011, o maior lucro da sua história, R$ 12,1 bilhões. A Previ detém patrimônio de mais de R$ 150 bilhões.

Porém, a presidente deverá ser obrigada a cortar cabeças mais rapidamente, pois já há grupos ligados ao PT e ao PMDB que cobiçam cargos no banco e na fundação aproveitando a briga entre Bendine e Flores para obter ganhos — ou seja, cargos no governo. Assim, o fim da crise com o silêncio determinado por Dilma pode não ocorrer, ampliando o desgaste que tem tirado o sono de Mantega.

Interesses O que não falta são cabeças que gravitam em torno da República candidatas aos cobiçados cargos na Previ, no BB e na Vale. A possibilidade de afastamento de Flores do comando do fundo de pensão já fomentou as apostas sobre sua substituição na presidência do Conselho de Administração da mineradora. É possível que o cargo venha a ser ocupado por Nelson Barbosa, secretário executivo da Fazenda. Também há movimentações em torno do vencimento, no fim de maio, dos mandatos do presidente e de mais dois integrantes do Conselho Deliberativo da Previ, que tem a responsabilidade de nomear a Diretoria Executiva da fundação, da qual Flores é o presidente.

Assessores do Planalto admitem que o PT paulista, liderado por José Dirceu, ex-ministro da Casa Civil, está trabalhando pesado para blindar Ricardo Flores. Mas, nas conversas com o presidente da Previ e com Bendine, Mantega avisou que tudo o que a presidente Dilma não quer é politizar o comando do BB e de seu fundo de pensão. "Foi dura a missão de despolitizar o banco e a Previ. Portanto, não há porque recuar. Se houver mudanças, será para acabar com as atuais intrigas, por meio de demissões e escolhas de substitutos técnicos. Foi assim que fizemos na Vale", frisou um ministro muito próximo de Dilma.

Preço alto Para o Planalto, indiferentemente do presidente do Conselho de Administração, a Vale está em boas mãos. "Murilo Ferreira tem se empenhado para atender os pleitos dos acionistas, mas com uma gestão equilibrada", disse um diretor da mineradora. "O que não queremos e não podemos aceitar é que a briga entre os presidentes do BB e da Previ nos atinja. Já chega o desgaste que passamos com a demissão de Roger Agnelli. A empresa foi punida pelos investidores", acrescentou.

O BB e a Previ já pagam um preço alto pela guerra por poder. A definição de negócios importantes das duas instituições tem ficado em segundo plano, pois seus principais executivos têm ficado por conta de avaliar os estragos gerados pela divulgação das intrigas e a possibilidade de perderem os cargos. No BB, reuniões do alto comando têm sido quase diárias para discutir o assunto, revelou um dirigente à agência internacional Reuters. "Tudo o que queremos é que essa onda passe logo. Torcemos para que as ordens da presidente Dilma, repassadas pelo ministro Mantega, encerrem de vez os problemas, mesmo que, para isso, cabeças tenham que rolar", acrescentou um técnico encarregado de abastecer o Planalto de informações.

Busca por apoio Próximo do secretário-geral da Presidência, Gilberto Carvalho, e do ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares, o vice-presidente de Governo do Banco do Brasil, Ricardo Oliveira, é ligado ao presidente da instituição, Aldemir Bendine. Ele cuida de operações com estados e municípios. Daí o seu livre trânsito com parlamentares de diversos partidos, aos quais recorreu nos últimos dias para garantir sua permanência no cargo. Mas parece não ter tido sucesso. Sua cabeça será a primeira a ser entregue para a presidente Dilma Rousseff.