Título: Irã tenta contornar sanções
Autor: Garcia, Larissa
Fonte: Correio Braziliense, 01/03/2012, Mundo, p. 18

O regime islâmico do Irã vai adotar uma nova estratégia para contornar as sanções econômicas impostas pelo Ocidente contra seu programa nuclear. Mahmud Bahmani, presidente do Banco Central iraniano, informou que o país deve aceitar ouro como pagamento pelo petróleo exportado. "O Irã não se limita ao dólar americano. Nosso parceiro pode pagar com sua própria moeda e, se desejar, pode pagar até em ouro. Nós aceitaremos ouro sem nenhum problema", frisou Bahmani, em entrevista à agência estatal Irna. A decisão, porém, não tem efeito em outra frente de pressão externa contra o regime dos aiatolás: ontem, mais uma organização de defesa dos direitos humanos reportou o crescente abuso por parte da autoridades contra a população.

Segundo a Iran Human Rights, no ano passado o Irã realizou 65 execuções públicas, o maior número em uma década. Os "eventos", denuncia a organização, são assistidos por adultos e crianças, com o objetivo de alimentar na sociedade uma cultura do medo. "O governo tem lançado mão dessa prática para aterrorizar os iranianos. Quando vão executar os condenados em público, fazem um grande estardalhaço, para que o máximo possível de gente compareça", disse ao Correio Mahmood Amiry-Moghaddam, porta-voz da organização. Para o especialista, isso também indica que o regime teme pela própria sobrevivência. "Eles afirmam estar lutando contra o crime, mas na verdade estão usando a força para se manter no poder", assinala Moghaddam.

Para tentar legitimar as execuções, a República Islâmica afirma estar combatendo o tráfico de drogas: oficialmente, 80% dos executados foram condenados por esse crime. O problema é que a maioria não tem o nome completo divulgado. "Elas são identificadas pelas iniciais ou pelo primeiro nome. Como a Corte Revolucionária julga a portas fechadas, não há como verificarmos o que realmente ocorreu", explica o porta-voz da Iran Human Rights.

As arbitrariedades não param por aí. Conforme a Iran Human Rights, muitos executados pertencem a famílias pobres, que não têm recursos sequer para pagar o enterro. "São as vítimas perfeitas para o regime, pois, em muitos casos, não têm ninguém que se preocupe com eles", aponta Moghaddam. Além das 65 execuções públicas, o governo cumpriu mais 611 sentenças de morte em 2011, segundo os dados oficiais. Em 416 casos, elas foram anunciadas como grandes eventos. Os números, afirma Moghaddam, aliados ao temor de um levante contra o regime, fazem crer que a frequência das execuções deve aumentar ao longo do ano.

Um dos réus mais ameaçados é o pastor Yousef Nadarkhani, 33 anos. Ele se converteu ao cristianismo e foi condenado por apostasia — o abandono da fé (islâmica, no caso). No Brasil, a ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, disse que o governo vai questionar as autoridades iranianas sobre o caso. "Nós já temos feito contato com nosso embaixador no Irã e o Itamaraty também tem feito contato, para saber efetivamente qual é a causa da prisão e levar os nossos posicionamentos sobre a defesa dos direitos humanos", disse a ministra.