Correio braziliense, n. 19887, 03/11/2017. Política, p. 03.

 

Um partido que se corrói

Natália Lambert

03/11/2017

 

 

A pouco mais de um mês da escolha do novo presidente do PSDB, as diferenças alas começam deixar em caso de derrota

 

 

O episódio da ministra tucana dos Direitos Humanos, Luislinda Valois, que tentou justificar vencimentos de R$ 61 mil, quase o dobro do teto do funcionalismo, por causa de despesas com beleza, colocou mais um redemoinho no mar revolto do PSDB. A polêmica serviu como incentivo aos que defendem o desembarque do governo. “Como se não bastasse a nossa lista de problemas, aparece essa história. A gente precisa se afastar disso tudo, cuidar da gente e focar nas soluções para o país”, comenta um tucano da ala dos cabeças-pretas que prefere não se identificar.

A semana não foi fácil no ninho tucano. A disputa interna está tão intensa que, durante reunião da bancada do Congresso na Câmara, na última terça-feira, deputados se exaltaram e chegaram perto de se agredir. Na ocasião, o problema foi a preferência do presidente em exercício da sigla, senador Tasso Jereissati (CE), em contratar a empresa Ideia Big Data, do marqueteiro Moriael Paiva, para criar um plano de reestruturação de comunicação do partido nas redes sociais.

A empresa foi responsável pela campanha do governador Fernando Pimentel (PT) em 2014, que derrotou o tucano Pimenta da Veiga, apoiado pelo senador Aécio Neves (MG) — presidente licenciado da legenda. Para os tucanos mineiros e goianos, ligados a Aécio, a contratação da agência de comunicação é inaceitável. O episódio foi só mais um dentro de um partido que está em ebulição desde quando Michel Temer assumiu a Presidência da República, em 2016. Parte da bancada não concorda com a decisão de participar do governo. O PSDB tem quatro pastas: Cidades, Relações Exteriores, Direitos Humanos e Secretaria de Governo.

O único consenso que existe atualmente no PSDB é que a convenção, em 9 de dezembro, na qual será eleita uma nova executiva nacional, é o primeiro passo para pacificar a legenda. Em princípio, a disputa está entre Tasso Jereissati — que ainda não confirmou a candidatura —, representante dos chamados cabeças-pretas, e o governador de Goiás, Marconi Perillo, do grupo que apoia o senador Aécio. Em encontro na última quarta-feira, os dois pregaram união e defenderam o desembarque do governo para focar na candidatura à Presidência da República em 2018 — ambos apostam no nome do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, também cotado para o comando do partido.

O deputado Marcus Pestana (MG), aliado a Aécio, acredita que tudo se resolverá após a convenção e vê a disputa interna com naturalidade. Para ele, aliás, melhor seria se o senador Tasso se afastasse da Presidência para deixar o processo “mais justo”. “Venho de uma tradição que acha isso natural e a divisão pode ser uma solução para revitalizar o partido. A disputa é inevitável. Então, o Tasso deveria até se afastar para que haja igualdade de condições. Faltam menos de 40 dias”, comenta.

No outro lado, há também uma expectativa de pacificação após a convenção, desde que o cearense vença a disputa. “Há um movimento muito forte para preparar a debandada caso o lado do Aécio vença. A gente não se alinha a esse PSDB”, comenta um deputado que prefere não se identificar.

O pensamento é o mesmo de economistas históricos filiados ao partido. Recentemente, o ex-presidente do Banco Central Gustavo Franco, um dos formuladores do Plano Real, deixou a legenda e se filiou ao Novo. Elena Landau também garante que sai da sigla se Tasso não continuar no comando. “Ainda estou no PSDB por causa dele, porque acredito que ele pode trazer o nosso partido de volta. É a minha última esperança. O partido escolheu um destino que já não me representa mais”, afirma.