STF DEVE LIVRAR DA CADEIA MÃES COM FILHOS ATÉ 12 ANOS

CAROLINA BRÍGIDO

Habeas corpus pode definir soltura também de grávidas presas

 

 

 O Supremo Tribunal Federal (STF) deve conceder hoje um habeas corpus que pode beneficiar até 4.560 mulheres presas em todo o país. Em uma só ação, o Coletivo de Advogados em Direitos Humanos (CADHu) pediu a transferência para a prisão domiciliar de mulheres gestantes, lactantes, ou que tenham filhos de até 12 anos. O caso será julgado na Segunda Turma do STF, composta de cinco ministros. A tendência é a maioria conceder o habeas corpus, que atingiria apenas presas provisórias — ou seja, que ainda não foram condenadas. A discussão passará mais pelo direito das crianças de terem uma vida digna, do que pelo direito à liberdade das mães.

Confirmado este resultado, os ministros vão começar a discutir a hipótese de levar o assunto para o plenário, que é formado pelos 11 integrantes da Corte. A ideia é editar uma súmula vinculante para tornar regra que mulheres grávidas, ou com filhos de até 12 anos, fiquem em prisão domiciliar. A súmula admitiria exceções. Ou seja, uma criminosa muito perigosa poderia ser levada para a cadeia nessas condições, se o juiz fundamentar o decreto de prisão com os motivos que o levaram a tomar essa atitude. O pedido no STF foi feito após o benefício ter sido obtido pela exprimeira-dama do Rio de Janeiro Adriana Ancelmo, em março do ano passado.

O assunto ganhou força recentemente, quando a rádio CBN revelou o caso de Jéssica Monteiro, de 24 anos. Ela foi flagrada em São Paulo com 90 gramas de maconha e foi presa. Um dia depois, entrou em trabalho de parto em uma cela com condições insalubres. Foi levada a um hospital e, dois dias depois de ter parido, voltou a ser presa. Jéssica é ré primária e mãe também de um menino de três anos. Ela está em prisão domiciliar.

 

MÃES ATÉ 12 ANOS SÃO 10% DAS PRESAS

O pedido de habeas corpus coletivo chegou ao STF em maio de 2017 e está sob a relatoria do ministro Ricardo Lewandowski. A ação era genérica, mas o ministro pediu que os estados enviassem os nomes e a quantidade de presas nessa situação, para que o habeas corpus pudesse beneficiar cada uma delas. Como os estados enviaram os números sem um padrão, não é possível saber ao certo quantas mulheres trocarão as celas pela prisão domiciliar no caso da concessão do habeas corpus. Sabe-se, no entanto, que o universo de mães de crianças de até 12 anos, gestantes e lactantes vivendo em prisões é de 4.560 mulheres. O número foi obtido pelo Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM); o Instituto Terra, Trabalho e Cidadania (ITTC); e a Pastoral Carcerária Nacional. Segundo o levantamento, a quantia representa quase 10% do total de mulheres presas no país.

Para julgar o assunto, os ministros levarão em conta também um documento do Ministério dos Direitos Humanos revelando casos específicos de tratamento desumano a grávidas e a mães presas. O relatório foi enviado ao STF na última sexta-feira e revela “casos individuais com fortes indícios de tortura contra mulheres e adolescentes gestantes e com filhos nas unidades de privação de liberdade do país”. Foram feitas visitas a 83 unidades de privação de liberdade do país de 17 estados brasileiros.

Entre os casos relatados está o de uma adolescente que estava grávida há três meses e já tinha um filho de quatro meses, que era cuidado pela mãe dela. Quando foi apreendida, passou quatro dias na delegacia em cela masculina, com homens adultos. Em outro caso, uma presa foi levada à delegacia com gestação avançada, “onde sofreu tortura que consistia em golpes, ameaças e procedimento de molhá-la com mangueira na cela, durante a noite”.

O relatório também traz informação de que, durante o trabalho de parto, as mulheres de uma unidade são algemadas “desde a saída da cela até o hospital”. E que, logo depois do parto, são novamente algemadas. Há ainda três casos de mulheres que pariram nas celas, por conta da demora para as escoltas chegarem. O Ministério Público Federal é contra a concessão do habeas corpus coletivo: “Não se desconhece as condições carcerárias em que tais mulheres precisam se submeter. No entanto, o habeas corpus não pode ser utilizado como política pública prisional, nem para garantir ‘direitos individuais homogêneos’ ou ‘direitos difusos’”.