O Estado de São Paulo, n. 45264, 21/09/2017. Política, p. A6.

 

Na estreia, Raquel ouve críticas ao MPF

Beatriz Bulla / Breno Pires / Rafael Moraes Moura / Carla Araújo

21/09/2017

 

 

Em sua primeira sessão no STF, procuradora-geral se manifesta contra pedido da defesa de Temer; ministros atacam investigações e Janot

 

 

Em sua estreia no Supremo Tribunal Federal, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, encaminhou ontem aos ministros da Corte, um memorial no qual se posicionou contra o pedido dos advogados do presidente Michel Temer que tentavam barrar o envio da acusação à Câmara. Raquel ouviu no plenário críticas contundentes sobre os procedimentos de investigação do Ministério Público Federal, mas foi saudada no início da sessão pela presidente da Corte, ministra Cármen Lúcia.

Entre os críticos do MPF, o ministro Ricardo Lewandowski disse que “as investigações têm sido feitas à margem de qualquer controle jurisdicional”. Foi acompanhado pelo ministro Gilmar Mendes, que destacou uma disputa da instituição com a Polícia Federal.

Gilmar criticou nominalmente o ex-procurador-geral Rodrigo Janot e ainda citou o caso do ex-procurador Marcello Miller, suspeito de ter orientado delatores da J&F antes de deixar a instituição e disse que imagina “o constrangimento que hoje cai sobre a PGR”. “É disso que se cuida aqui, corruptos num processo de investigação. Essa pecha a procuradoria não merecia”, completou o ministro. “Certamente, nós vivemos momentos dos mais diversos. Eu sou da turma de 84 da Procuradoria da República, certamente já ouvimos falar de procuradores preguiçosos, violentos, alcoólatras, mas não de procuradores ladrões”, atacou Gilmar.

Procurada pela reportagem, a assessoria de Miller reiterou que “jamais fez jogo duplo”.

A denúncia contra Temer por obstrução da Justiça e organização criminosa foi enviada ao STF por Janot, no penúltimo dia útil de seu mandato, na quinta-feira. Ele e Raquel são conhecidos desafetos no MP. Até agora, a nova procuradora-geral vem mantendo discrição e silêncio sobre os atos do antecessor.

No memorial que encaminhou por escrito aos ministros, ela defendeu o prosseguimento da denúncia. “A Constituição é rigorosa. As etapas e as instâncias de decisão estão bem delineadas. Não há lugar para impugnar a viabilidade da denúncia fora desse rito constitucional antes da decisão da Câmara dos Deputados", escreveu a procuradora-geral, em sua primeira manifestação sobre o tema.

Usou trecho de livro do ministro Alexandre de Moraes para sustentar que o recebimento da denúncia é “o primeiro ato decisório” a ser praticado pelo STF, o que só acontece “desde que tenha a autorização da Câmara”. Raquel apontou que a Constituição define três etapas para o rito da denúncia contra o presidente: a acusação pela PGR, a autorização do processo pela Câmara e a competência do Supremo para receber a denúncia. “Se este momento ( do recebimento da denúncia) chegar, a defesa terá ampla margem de atuação para suscitar todas as questões que entender necessárias”, escreveu Raquel.

Ela não fez manifestações na sessão plenária, exceto um cumprimento inicial aos ministros.

Cármen Lúcia saudou a nova procuradora-geral no início da sessão e disse que ela é um dos melhores quadros do MPF e tem “extensa folha de trabalhos prestados ao Brasil e à instituição”. A presidente da Corte também destacou que o MPF tem atuado com “destemor” e afirmou estar confiante de que Raquel dará continuidade aos serviços da instituição. A procuradora-geral agradeceu as boasvindas: “Eu gostaria de saudar cada um ( dos ministros) com imenso respeito. Agradeço a calorosa acolhida desse STF e apresento-lhes os cumprimentos de todo o Ministério Público brasileiro, que reconhece o elevado espírito público que preside este tribunal como garantidor de direitos humanos”. 

 

Estreia. Em sua primeira sessão no Supremo, a nova chefe da PGR, Raquel Dodge, recebe as boas-vindas da presidente da Corte, Cármen Lúcia