Título: Calote em automóveis
Autor: Martins, Victor
Fonte: Correio Braziliense, 29/02/2012, Economia, p. 10/11

O atraso no pagamento da prestação do carro vem puxando para cima a taxa de inadimplência das pessoas físicas. Segundo dados divulgados ontem pelo Banco Central, o índice de atraso das obrigações vencidas há mais de 90 dias atingiu 7,6% em janeiro. Foi o patamar mais alto desde dezembro de 2009, quando a taxa havia cravado 7,7%. O chefe do Departamento Econômico do BC (Depec), Túlio Maciel, creditou parte do aumento do calote aos financiamentos para aquisição de carros. As pessoas estão com maior dificuldade para pagar as prestações de seus veículos.

Pelos dados do BC, no caso do crédito para automóveis, está em alta tanto a taxa que mede o atraso entre 15 e 90 dias, quanto o percentual para as operações vencidas há mais de três meses. Para o período mais curto, a inadimplência nas operações de financiamento de veículo passou de 7,6% em dezembro de 2011 para 8,1% em janeiro. No prazo mais longo, o calote subiu de 5% para 5,3%.

Na avaliação do chefe do Depec, a disparada da inadimplência decorreu das medidas macroprudenciais adotadas pelo governo no fim de 2010 — e retiradas no ano passado —, que puniram as compras com prazo de pagamento superiores a 60 meses. Também contribuiu para o atraso maior o aperto financeiro enfrentado pelas famílias diante do encarecimento das despesas de início do ano. Segundo Maciel, ficou mais difícil encaixar no orçamento já comprometido por dívidas os gastos com matrícula e materiais escolares, por exemplo. "Por isso, a inadimplência está resistindo em recuar", admitiu.

Estragos O elevado patamar do calote vem causando outros estragos. O spread bancário — diferença entre o que os bancos pagam aos investidores e o que cobram dos devedores — também subiu, o que, por sua vez, se refletiu em taxas de juros mais elevadas. Assim, depois de dois meses de queda, os encargos cobrados pelo sistema financeiro voltaram a subir.

Tanto consumidores quanto empresas estão pagando mais caro pelo dinheiro que tomam emprestado. No caso das empresas, o aumento foi de 0,5 ponto percentual, com os juros médios passando de 28,2% para 28,7% ao ano em janeiro. Para as pessoas físicas, a alta foi ainda maior: 1,3 ponto, com os juros batendo em 45,1% ao anuais.

Até mesmo as operações de crédito consignado, sem qualquer risco para os bancos, tiveram aumento: a taxa saltou de 27% para 27,5% ao ano. A exceção foi o cheque especial. Menos clientes recorreram a essa modalidade de crédito, porque ainda estavam com dinheiro no bolso, graças ao recebimento do 13º salário em dezembro. Os juros do especial recuaram 2,2 pontos percentuais, fechando janeiro em inacreditáveis 185,9% ao ano.

Planalto quer spread menor O presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, deixou claro ontem, em audiência pública na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, que o governo fará todo o esforço possível para reduzir o spread bancário. A taxa se refere à diferença entre o que as instituições pagam aos investidores e o que cobram nos empréstimos. Segundo ele, reduzir esse custo é prioridade para a presidente Dilma Rousseff e para a autoridade monetária. O spread só engorda os lucros dos bancos e impede que mais pessoas tenham acesso a crédito mais barato. "Esse tema tem sido uma preocupação da presidente Dilma e, sob a orientação dela, temos trabalhado com ações importantes para reduzir tal custo", disse Tombini. Ele citou a criação do cadastro positivo e de outros mecanismos que devem melhorar a qualidade das informações de crédito e derrubar o spread, além de medidas adotadas recentemente para diminuir o custo de captação das instituições financeiras.