Correio braziliense, n. 19905, 21/11/2017. Política, p. 6

 

Foro privilegiado em pauta

Natália Lambert 

21/11/2017

 

 

JUSTIÇA » Supremo Tribunal Federal e Senado analisam, nesta semana, restrição à prerrogativa de função. Proposta no STF quer evitar mudanças constantes de instâncias e a no Congresso pretende manter a regra de crimes comuns apenas para presidentes dos três poderes

Quase seis meses depois, o Supremo Tribunal Federal (STF) retoma, na quinta-feira, o julgamento que pode restringir o foro privilegiado e mudar a vida de políticos investigados em tribunais superiores. Em resposta à iniciativa, a Câmara dos Deputados também analisa a Proposta de Emenda à Constituição que acaba com a prerrogativa de função para crimes comuns — texto aprovado pelo Senado em maio. Apesar da expectativa, a tendência, segundo magistrados ouvidos reservadamente pela reportagem, é de que a análise seja adiada novamente no STF por um novo pedido de vista.

O julgamento da Ação Penal 937 entrou na pauta da Suprema Corte em 31 de maio deste ano. O processo é contra o prefeito de Cabo Frio (RJ), Marcos da Rocha Mendes (PMDB-RJ), acusado de compra de votos em 2008. Por causa de mudanças de cargo do réu, a ação vem pulando de instâncias desde então. Diante da situação, o ministro-relator, Luís Roberto Barroso, propôs uma nova interpretação da Constituição Federal. Para ele, a prerrogativa de foro deve ser aplicada apenas para crimes cometidos durante o exercício do cargo e relacionados às funções desempenhadas.

Barroso também sugere que, ao fim da instrução processual, a competência se fixe para evitar o pula-pula de instâncias. Primeiro a votar, o ministro Alexandre de Moraes pediu vistas do processo e ficou com ele até 29 de setembro, quando o devolveu à pauta do plenário. De acordo com um magistrado que prefere não se identificar, o tema cria muitos conflitos com o Congresso, e a presidente da Corte, ministra Cármen Lúcia, não deveria tê-lo pautado neste momento. “Acredito que o sistema precisa mudar, mas o ambiente está muito conflitado, a relação está difícil. Tem que se discutir uma solução, mas não com tumulto. Nessa guerra, ninguém ganha”, afirma.

Já o ministro Marco Aurélio Mello, que antecipou voto favorável à restrição do foro, acredita que sempre é o momento adequado para reinterpretar a Constituição. “Não mudaremos nada, apenas disciplinaremos a prerrogativa. A melhor leitura desta questão é a que obstaculiza esse elevador processual, esse sobe e desce de ação que não chega a lugar nenhum”, defende. De acordo com dados do V Relatório Supremo em Números: o foro privilegiado, da Fundação Getulio Vargas, a mudança de instâncias contribui para que os processos nem sequer tenham o mérito analisado: duas em cada três ações penais, em razão do declínio de competência (63,6%) ou da prescrição (4,7%).

Na Câmara, o presidente da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), Rodrigo Pacheco (PMDB-MG), também pautou a análise do relatório do deputado Efraim Filho (DEM-PB) para a manhã de quarta-feira. Filho indica a admissibilidade da PEC 10/13 e determina a extinção do foro privilegiado para crimes comuns, exceto para os presidentes dos três poderes. Se aprovada, antes de ir a plenário, a matéria ainda será analisada por uma comissão especial que terá até 40 sessões para produzir um relatório.

Em análise

O que muda segundo a proposta do STF

» O parlamentar seria processado e julgado no STF somente se o ato ilícito que ele cometer for durante o exercício do mandato e tiver relação com a função. Por exemplo, se um deputado for acusado de fraudar uma escritura de um imóvel, esse processo irá para a primeira instância porque não tem relação com o cargo. Já crimes associados ao caixa 2, em que políticos teriam recebido dinheiro em troca de favorecimento de empresas, continuariam com foro até que o parlamentar perdesse o cargo.

» Além disso, o relator quer limitar um prazo processual para que o caso mude de instâncias mesmo que o político deixe de exercer o cargo ou seja eleito para outra função.

O que muda segundo a proposta que está na Câmara

» A Proposta de Emenda à Constituição aprovada no Senado extingue o foro por prerrogativa de função para todas as autoridades do país em casos de crimes comuns, com exceção aos presidentes dos Três Poderes.

Números

» Estima-se que cerca de 37 mil autoridades tenham a prerrogativa no país.

» São processados e julgados no STF mais de 800 agentes políticos: o presidente da República, o vice-presidente, 513 deputados federais, 81 senadores, cerca de 30 ministros de Estado, 3 comandantes militares, 90 ministros de tribunais superiores, 9 membros do Tribunal de Contas da União e 138 chefes de missão diplomática de caráter permanente.

» O STF tem atualmente mais de 500 processos abertos contra parlamentares (435 inquéritos e 101 ações penais), dos quais mais de 270 inquéritos tiveram origem nas investigações da Operação Lava-Jato.

» Enquanto na primeira instância o prazo médio de recebimento de uma denúncia é de uma semana, no STF o tempo é de 581 dias.

Fonte: V Relatório Supremo em Números: o foro privilegiado, da Fundação Getulio Vargas

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Renan deve pagar multa

Bernardo Bittar

21/11/2017

 

 

O senador Renan Calheiros (PMDB-BA) foi condenado pela Justiça ao pagamento de R$ 246 mil em multas e perda dos direitos políticos durante oito anos, por improbidade administrativa. A sentença, proferida pelo juiz federal Waldemar Carvalho, da 14ª Vara Federal de Brasília, corria em segredo, mas, ontem, foi tornada pública. O peemedebista negou as acusações e disse que vai recorrer da decisão em segunda instância.

Segundo informou a assessoria do senador, “Renan afirma que a sentença do juiz de primeira instância causa surpresa, pois o Supremo já julgou esse caso e sequer o recebeu por falta de prova. Todos os ouvidos nos autos negaram os fatos. Por isso, o senador vai recorrer com serenidade a quem cabe a palavra final”.

O processo trata do caso em que o senador foi acusado de receber propinas da construtora Mendes Júnior, que pagaria as despesas pessoais da jornalista Mônica Veloso — com quem ele mantinha relacionamento extraconjugal — para beneficiar o senador.

A sentença, de primeira instância, é na área Cível. Também existe um inquérito, apresentado pela Procuradoria-Geral da República , que corre em segredo no Supremo Tribunal Federal. O senador é acusado de peculato. Renan Calheiros responde a outros oito inquéritos na Lava-Jato e três no STF.