Título: Cruz Vermelha desiste de trégua
Autor: Garcia, Larissa
Fonte: Correio Braziliense, 29/02/2012, Mundo, p. 17

Equipe retirou britânico da zona de combate, mas paradeiro de francesa seguia incerto

O Comitê Internacional da Cruz Vermelha abandonou ontem as negociações para a retirada de feridos da cidade de Homs, na Síria, bombardeada há 25 dias pelas forças do regime. A organização alegou falta de segurança para a equipe que chegou à cidade na última segunda-feira na tentativa de obter uma trégua humanitária que permitisse a remoção das vítimas para atendimento médico. Ainda assim, o fotógrafo britânico Paul Conroy conseguiu cruzar a fronteira do Líbano por uma passagem ilegal, com a ajuda de opositores sírios. A França chegou a anunciar que a jornalista Edith Bouvier, ferida com Conroy, também tinha conseguido deixar o país, mas o presidente Nicolas Sarkozy corrigiu a informação e afirmou que "não há confirmação de que ela se encontre em segurança no Líbano".

As Nações Unidas atualizaram, de 5 mil para 7,5 mil, o balanço dos mortos na repressão aos protestos contra Al-Assad, iniciados em abril de 2010. Apenas ontem, segundo os Comitês Locais de Coordenação, que articulam as manifestações, foram registradas mais 104 vítimas.

Sarkozy desculpou-se com os franceses e lembrou que a situação na Síria é "extremamente complexa". Até o fechamento desta edição, as autoridades francesas ainda não tinham notícias precisas do paradeiro de Edith. Ela e o britânico foram feridos na semana passada, em um bombardeio no qual morreram a jornalista americana Marie Colvin e o fotógrafo francês Rémi Ochlik. A fuga de Paul Conroy foi confirmada pelo governo britânico e pelo jornal The Sunday Times, do qual ele é colaborador. O pai do fotógrafo havia revelado horas antes que o filho conversara com sua mulher e parecia "animado".

Neste contexto, a ONU convocou uma reunião de emergência que continua hoje em Genebra, na Suíça, para debater uma solução para a crise na Síria. A expectativa dos diplomatas é aprovar uma proposta que garanta o ingresso de ajuda humanitária na região. O embaixador sírio, Faisal Hamwi, retirou-se da reunião alegando que se tratava de um "debate estéril", após a alta comissária da ONU para Direitos Humanos, Navi Pillay, ter pedido um cessar-fogo imediato. "O único objetivo desse período de sessões é atiçar as chamas do terrorismo e potencializar a crise em meu país com medidas de apoio a grupos armados", argumentou. Em seu discurso, Navi declarou que está "chocada" com as atrocidades cometidas pelo exército sírio contra civis.

Impasse A Rússia e a China, que já vetaram no Conselho de Segurança dois projetos de resolução que condenavam o regime do presidente Bashar Al-Assad, denunciaram "a politização" da ONU e rechaçaram "qualquer intervenção externa" no conflito. Os diplomatas dos dois países, apoiados por Cuba, Venezuela e Equador, sustentaram que é responsabilidade da população síria resolver a situação. Os projetos vetados por Moscou e Pequim previam que Al-Assad ordenasse a retirada das tropas das cidades e entregasse o poder ao vice, dando início à transição para a democracia. A Rússia classificou o texto como tendencioso e destinado a "promover a mudança de regime". A Síria compra armas da Rússia, a quem cede uma base naval.

Na última segunda-feira, o grupo Amigos da Síria, formado por cerca de 70 países ocidentais e árabes — entre eles o Brasil —, reuniu-se para tentar pôr fim ao derramamento de sangue no país, mas não teve avanço significativo. A conferência pediu o fim imediato da violência, mas não determinou prazos nem medidas concretas. A Tunísia ofereceu asilo político para Al-Assad, caso ele aceite deixar o poder. A secretária de Estado norte-americana, Hil-lary Clinton, afirmou que há argumentos suficientes para que o presidente da Síria seja acusado de crimes contra os direitos humanos, mas confessou o receio de que uma acusação dessa natureza possa acirrar o conflito.

"O único objetivo (das discussões na ONU) é atiçar as o terrorismo e potencializar a crise em meu país"

Faisal Hamwi, embaixador da Síria perante as Nações Unidas em Genebra