Correio braziliense, n. 19907, 23/11/2017. Política, p. 06.

 

 

Ex-governadores na mesma cadeia

Renato Souza

23/11/2017

 

 

PODER » Garotinho e a mulher dele, Rosinha Matheus, foram presos sob acusação de integrarem um esquema de cobrança de propina. O político cumprirá a detenção preventiva no presídio de Benfica, onde está o desafeto Sérgio Cabral

 

 

Preso na manhã de ontem — sob a acusação de integrar um esquema de corrupção envolvendo empresas que repassaram recursos para campanhas eleitorais, o ex-governador do Rio de Janeiro Anthony Garotinho (PR) se juntou a Sérgio Cabral (PMDB) e ao presidente da Assembleia Legislativa (Alerj), Jorge Picciani (PMDB), na cadeia pública José Frederico Marques, em Benfica. Ele foi detido com a mulher, Rosinha Matheus, num desdobramento da Operação Chequinho. Pouco antes de dar entrada na unidade de internação, Garotinho afirmou ter medo de ir para o local. Ele alegou que foi ameaçado por Picciani.

Essa é a segunda vez que o ex-governador é preso desde julho deste ano. Na ocasião, ele foi detido na primeira fase da Chequinho, quando apresentava seu programa diário de rádio. Também não é inédito o político apresentar motivos para escapar da cadeia. Em novembro do ano passado, ele fez “birra” ao ser transferido do Hospital Municipal Souza Aguiar para o Complexo Penitenciário de Gericinó, em Bangu, Zona Oeste do Rio. Ele se recusou a entrar na ambulância para a transferência e teve de ser contido por agentes penitenciários e médicos do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu).

De acordo com o Ministério Público, Garotinho recebeu R$ 3 milhões da JBS para serem usados na campanha dele em 2014. O dinheiro teria sido repassado por meio de contratos fictícios entre o frigorífico e uma outra empresa.

Também foram presos preventivamente ontem Suledil Bernardino, ex-secretário de governo da Prefeitura de Campos dos Goytacazes; Antônio Carlos Ribeiro da Silva, considerado o braço armado da organização; e Antônio Carlos Rodrigues — presidente do Partido da República (PR) e ministro dos Transportes no governo da então presidente Dilma Rousseff —, acusado de cometer irregularidades na prestação de contas. A JBS informou que não vai se pronunciar sobre o caso.

Conforme as investigações, o esquema de repasses de propina envolveu empresas que mantêm contratos com a Prefeitura de Campos dos Goytacazes. O Ministério Público afirmou que o grupo de Garotinho “usava até mesmo armas de fogo para cobrar a propina”. A cobrança de dinheiro permanecia por meses, para garantir a continuidade dos serviços prestados ao estado.

Os envolvidos são acusados de corrupção, concussão, que ocorre quando o agente público comete crime de extorsão, participação em organização criminosa e falsidade na prestação das contas eleitorais. Assim que saiu do Instituto Médico Legal (IML), ainda pela manhã, Garotinho se deparou com vários populares que o aguardavam em frente à unidade policial. Antes de entrar na viatura, ele foi chamado de “bandido” e de “corrupto”.

 

Perseguição

Numa nota enviada à imprensa, Garotinho afirma que a operação “é mais um capítulo da perseguição que vem sofrendo desde que denunciou o esquema do governo Cabral na Assembleia Legislativa e as irregularidades praticadas pelo desembargador Luiz Zveiter”. Em dezembro do ano passado, Garotinho acusou Zveiter de manter um arranjo com o ex-governador Sérgio Cabral para garantir aos magistrados cariocas um salário acima do teto constitucional.

No mesmo documento, o político do PR afirma que sua defesa foi alertada por um agente penitenciário de que Picciani teria dito, em conversa com Cabral, que “ia dar um tiro na cara de Garotinho”. Por meio de um comunicado, a Secretaria de Estado de Administração Penitenciária (Seap) informou que “garante a integridade física dos internos do sistema penitenciário fluminense”.

 

Troca por votos

O nome da operação faz referência ao programa Cheque Cidadão, que, de acordo com a PF, era usado por políticos cariocas como moeda de troca por votos. Cerca de 18 mil novos beneficiários foram incluídos no programa com fins eleitoreiros. As principais atingidas eram famílias de baixa renda, persuadidas a colaborar com o esquema para receber o benefício social.

 

Frase

“É (a operação) mais um capítulo da perseguição que vem sofrendo desde que denunciou o esquema do governo Cabral na Assembleia Legislativa e as irregularidades praticadas pelo desembargador Luiz Zveiter”

Trecho da nota da assessoria do ex-governador