Valor econômico, v. 17, n. 4334, 05/09/2017. Brasil, p. A2.

 

 

Ibama pede mais R$ 104 milhões e já negocia conversão de multas

Daniel Rittner

05/09/2017

 

 

Em meio às discussões de revisão das metas fiscais, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) pediu uma ampliação de R$ 104 milhões no orçamento de 2018. Também quer sinal verde para um concurso público que permita o ingresso de mais 1.630 servidores - sendo 750 analistas ambientais - no quadro de pessoal da autarquia a partir de abril.

A presidente do Ibama, Suely Araújo, enviou ofício ao Ministério do Planejamento advertindo sobre a necessidade de recursos adicionais para áreas como combate ao desmatamento, prevenção de incêndios e licenciamento ambiental. Neste ano, o orçamento aprovado é de R$ 243 milhões, mas houve um bloqueio de 22%.

Atividades como o aumento da fiscalização para outros biomas, além da Amazônia, e a manutenção dos 24 centros de triagem de animais silvestres podem ser diretamente afetadas, se não houver revisão do orçamento.

Em defesa de uma ampliação do contingente, Suely afirma que o número de servidores diminuiu de 5,6 mil para 3,7 mil desde 2010. Outros 879 analistas e técnicos terão condições de se aposentar nos próximos cinco anos.

O Ibama já abriu tratativas com grandes empresas, como Petrobras e Norte Energia, interessadas em aderir ao novo mecanismo que possibilitará a conversão de multas ambientais em ações efetivas de compensação.

Um decreto com esse sistema está praticamente fechado e só depende de assinatura do presidente Michel Temer. O Palácio do Planalto trabalha com a perspectiva de fazer uma cerimônia na volta de Temer e parte do gabinete ministerial da viagem à China. A norma abrirá caminho para que empresas autuadas troquem suas multas por participações nos programas de recuperação ambiental determinados pelo governo. Como benefício, elas poderão receber desconto de 35% a 60% nos valores devidos.

Na avaliação de Suely, todos os envolvidos saem ganhando: as empresas eliminam passivos, o Ibama consegue garantir recursos ao ambiente e projetos importantes podem ser estruturados com um orçamento maior.

O estoque de penalidades por crimes ambientais é bilionário, mas quase tudo vai parar na Justiça: historicamente, apenas 5% dos valores aplicados em multas são recebidos. Do que é pago, 80% seguem direto para o Tesouro Nacional. Só os 20% restantes ficam em um fundo setorial gerido pelo Ministério do Meio Ambiente.

A conversão valerá exclusivamente para infrações que estão no âmbito administrativo e ainda não foram judicializadas. Hoje estima-se em R$ 4,6 bilhões o valor habilitado para a troca, mas Suely lembra que todos os anos são aplicados mais cerca de R$ 3,5 bilhões em novas multas.

Funcionará da seguinte forma: as empresas interessadas poderão comprar "cotas" de um projeto, sem limite máximo, e obter desconto de 60% sobre o valor equivalente de suas multas. Os recursos serão depositados em uma conta-garantia de banco público - Banco do Brasil ou Caixa -, que se encarregará dos repasses. A execução ficará sob responsabilidade de organizações da sociedade civil selecionadas pelo Ibama.

"A gente quer rapidez na execução. Para vingar, esse mecanismo precisa dar resultado logo", afirma Suely. O decreto veda a participação de companhias em algumas situações específicas. Por exemplo: quem foi multado em eventos com perda de vidas humanas - caso da Samarco, na tragédia da barragem de Mariana (MG) - se encaixa nesse critério.

O primeiro projeto de compensação ambiental já foi escolhido. Trata-se de ações de recuperação florestal nas áreas de preservação permanente da bacia do rio São Francisco, especialmente ao lado dos mananciais e no entorno de nascentes. A escolha foi feita com base na grave crise hídrica vivida pela bacia, que levou o reservatório de Sobradinho (BA) a menos de 8% da capacidade máxima e deve entrar no volume morto antes do reinício da temporada de chuvas.

O projeto deverá durar de três a cinco anos. A Agência Nacional de Águas (ANA) e a Codevasf têm ajudado na definição das áreas onde vai ser dada prioridade na recomposição das matas. O pente-fino está sendo feito de modo a identificar regiões em que a infiltração da água no subsolo é maior, possibilitando a recarga do aquífero.

A Petrobras confirmou sua disposição em aderir ao sistema de conversão de multas. "Reconhecemos o alto valor dessa iniciativa e temos muito interesse em aderir de forma articulada com o Ibama", diz a diretora de exploração e produção da estatal do petróleo, Solange Guedes. "É uma proposta inovadora, que muda o paradigma. E é uma forma muito interessante de fazer com que os recursos das multas possam se transformar em ações ambientais relevantes para o país", afirma Solange. Procurada, a Norte Energia - concessionária responsável pela usina hidrelétrica de Belo Monte (PA) - preferiu não comentar.

Para a presidente do Ibama, não há problema nenhum em que as empresas usem sua adesão como propaganda. "Acho isso ótimo", enfatiza. A Sanepar, companhia de saneamento do Paraná, negocia ações de compensação direta com a autarquia ambiental. Para esse tipo de conversão, o decreto estabelecerá desconto de 35% nas multas. Suely pondera que a preferência é por ações indiretas. "Assim podemos pensar em projetos estruturantes."