O globo, n.30693 , 19/08/2017. PAÍS, p.3

PRENDE, SOLTA, PRENDE, SOLTA

JULIANA CASTRO

KARLA GAMBA

 

 

Gilmar desautoriza Bretas e concede, pela segunda vez, prisão domiciliar a Jacob Barata Filho

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes mandou, pela segunda vez em menos de 24 horas, libertar o empresário Jacob Barata Filho. A decisão de conceder a prisão domiciliar ao empresário levou a forte reação da força-tarefa da LavaJato no Rio, que entrou com pedido para que Gilmar seja considerado suspeito para atuar no caso, já que foi padrinho do casamento da filha de Barata.

A decisão beneficiou também o expresidente da Fetranspor Lélis Teixeira, assim como Barata Filho réu na Operação Ponto Final, que investiga o pagamento de propina por parte de empresários de ônibus a políticos.

Anteontem, Gilmar havia acolhido o pedido da defesa e mandado libertar Barata Filho e Teixeira, mas o juiz Marcelo Bretas, responsável pelos processos da Lava-Jato no Rio, expediu em seguida novos mandados relativos a outros casos em que Barata Filho e Teixeira são investigados e nos quais a prisão já havia sido determinada anteriormente. Ontem, o ministro do STF mandou soltar os dois pela segunda vez.

Na decisão de ontem, o ministro Gilmar Mendes determina aos dois réus o recolhimento domiciliar, retenção de passaporte e proibição de contato com outros investigados na ação. Procurado, Bretas disse que, como determina a Lei Orgânica da Magistratura Nacional, não comentaria decisão de outro magistrado.

Ontem, antes da nova determinação de Gilmar, a força-tarefa da Lava-Jato no Rio já havia reagido, em nota, à decisão do ministro do STF. Os procuradores manifestaram apreensão “diante da possível liberdade precoce de empresários com atuação marcante no núcleo econômico de organização criminosa que atuou por quase dez anos no estado” e “que detêm poder e meios para continuarem delinquindo".

SUSPEIÇÃO DE GILMAR

Barata Filho foi preso no dia 2 de julho, quando tentava embarcar no Aeroporto Tom Jobim para Portugal, por dois motivos. Já havia uma ordem de prisão contra ele, expedida pelo juiz Bretas, por causa das investigações. Mas, como na ocasião da prisão ele carregava € 10.050, US$ 2.750, e 100 francos suíços, valores acima do limite e que precisariam ter sido declarados, também foi detido em flagrante por evasão de divisas.

A primeira ordem de soltura de Gilmar dizia respeito à prisão ordenada por Bretas no âmbito da Lava-Jato, mas não tratava da questão da evasão de divisas. Depois da decisão do ministro do STF, o juiz do Rio expediu novo mandado de prisão de Barata, pelo caso do dinheiro não declarado. Gilmar, então, ampliou ontem o benefício também para esse caso.

Em mais um capítulo da queda de braço entre procuradores e o ministro, a força-tarefa da Lava-Jato no Rio encaminhou pela segunda vez ao procuradorgeral da República, Rodrigo Janot, ofício solicitando que entre com uma ação pedindo o impedimento de Gilmar em recursos relativos à Operação Ponto Final.

A força-tarefa cita o fato de Gilmar ter sido padrinho do casamento de uma filha de Barata Filho, Beatriz, com Francisco Feitosa Filho, sobrinho de sua mulher, Guiomar.

— Vocês acham que ser padrinho de casamento impede alguém de julgar um caso? Vocês acham que isto é relação íntima, como a lei diz? — afirmou o ministro antes da nova decisão.

Na documentação em que pede a suspeição do ministro do STF, o MPF do Rio elenca outros fatos contra Gilmar. Afirma que um dos advogados de Barata Filho já atuou em ação em favor do ministro e continua sendo seu advogado. Os procuradores alegaram ainda que Barata Filho é sócio de Francisco Feitosa de Albuquerque Lima, cunhado do ministro, e que os dois “possuem íntimo relacionamento pessoal, tratando-se como amigos e compadres em diálogo travado dias antes da prisão do empresário". O MPF cita que o contato da mulher de Gilmar está no celular de Barata Filho.

Em nota, Gilmar disse que os requisitos para impedimento e suspeição não estão preenchidos no caso e que o contato com a família Barata ocorreu somente no dia do casamento. Sobre a relação de sociedade do cunhado com o empresário de ônibus, o ministro afirmou que "não há relação com o paciente e/ou com os negócios que este realiza".

“Ademais, não há tampouco amizade íntima com os advogados da presente causa”, afirmou ainda o ministro.

A defesa de Barata Filho afirmou que a decisão de Gilmar “revogou uma prisão manifestamente ilegal". O GLOBO não conseguiu contato com a defesa de Lélis Teixeira.