Valor econômico, v. 17, n. 4335, 07/09/2017. Brasil, p. A2.

 

 

Acordo prevê alívio de R$ 63 bi em contas do RJ

Fábio Pupo, Edna Simão, Bruno Peres e Rodrigo Carro

07/09/2017

 

 

Após sucessivos déficits nos últimos anos, o Estado do Rio de Janeiro conseguiu obter do governo federal um socorro que envolve empréstimos e suspensão de dívidas com a União em troca da obrigação de aumentar receitas e reduzir despesas. Os moldes do pacote, que prevê eliminação de R$ 63 bilhões em contas a pagar nos próximos seis anos, podem ser estendidos a outros Estados.

O primeiro passo do plano de recuperação fiscal com o Rio é conceder, em cerca de 30 dias, um empréstimo para que o Estado pague contas atrasadas - incluindo pagamentos a fornecedores e salários de funcionários. Além disso, neste ano o Rio obterá uma moratória temporária de R$ 5 bilhões na dívida com a União. No total, entre 2017 e 2020, estão previstos R$ 11 bilhões em empréstimos e R$ 30 bilhões em suspensões de débitos com o governo federal (ver tabela abaixo).

O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, explicou que os empréstimos serão coordenados pelo BNDES e terão como garantia, em parte, a Cedae - empresa de saneamento em processo de privatização. "No momento em que for vendida, a Cedae terá recursos que serão usados para a liquidação do empréstimo. Nesse processo pode intervir o Tesouro Nacional através de concessão de garantia, tendo como contragarantia as ações da empresa", frisou.

Em troca pela suspensão da dívida e pelos empréstimos, o Estado do Rio deve colocar em prática medidas que aumentem as receitas em cerca de R$ 22 bilhões ao longo deste e dos próximos anos - como aumento de alíquotas tributárias (em gás natural, por exemplo) - e outras que diminuam R$ 4,77 bilhões em despesas, como gastos com pessoal. No total, as quatro frentes do pacote (empréstimos, suspensão de dívidas com a União, aumento de receitas e corte de despesas) vão ser responsáveis por eliminar a projeção de R$ 63 bilhões em contas a pagar ao fim de 2020 - equilibrando-se, assim, as contas do Estado.

Perguntado sobre quais as garantias de que o RJ cumpriria suas obrigações ao longo do acordo, Meirelles respondeu que um comitê irá monitorar a execução do plano - tendo poder, inclusive, de suspender o pacote de ajuda financeira. O grupo será composto por representantes da União, do Tribunal de Contas da União, da Controladoria Geral da União e do governo do Rio.

Como o ajuste se baseia de maneira forte na projeção de aumento de receitas, o Tesouro fez ressalvas ao recomendar a aprovação do acordo. No parecer, o órgão recomenda alternativas caso o Estado não obtenha sucesso na ampliação do faturamento. Uma das medidas é a "extinção de mais empresas públicas". Nesse item, o órgão sugere até a "revisão da oferta do ensino superior".

Apesar das ressalvas, o secretário-executivo da Fazenda, Eduardo Guardia, reforçou que a conclusão do parecer é pela aprovação. "O Tesouro está mostrando que precisa executar e aponta alternativas. Então ele é muito claro na consistência do plano e recomendou a aprovação."

Para assinar o acordo com o Rio, o presidente em exercício Rodrigo Maia (DEM-RJ) organizou uma cerimônia no Palácio do Planalto e chegou a chorar na hora do discurso, elogiando a equipe técnica e até o presidente Michel Temer pela "humildade" em deixá-lo anunciar o acordo. Já o governador do Rio, Luiz Fernando Pezão, disse que o Estado enfrentou uma "tempestade perfeita" nas contas públicas por causa da queda do preço do petróleo. "Mas encontramos aqui sempre um porto seguro [referindo-se ao Planalto]".

Apesar do clima de festa, o deputado estadual Carlos Osório (PSDB), vice-líder da oposição no Estado, afirmou "não haver nada a comemorar". "O ajuste é necessário, mas confirma a falência e a má gestão. Essa comemoração não cabe. Queríamos nunca ter que assinar um acordo como esse", afirmou. O próximo na fila dos acordos com a União é o Rio Grande do Sul, que já começou a conversar com a Fazenda.

O Estado necessitará de seis anos dentro do Regime de Recuperação Fiscal para reequilibrar totalmente suas finanças, disse ontem o secretário de Fazenda fluminense, Gustavo Barbosa, citando um parecer do Tesouro Nacional.

A adesão do Estado ao regime se deu inicialmente por um prazo de três anos, mas que pode ser renovado por mais três. Barbosa frisou, no entanto, que caberá ao governador a ser eleito em 2018 decidir se renova ou não o acordo.

O déficit orçamentário previsto para este ano para o Estado era de R$ 21 bilhões antes da homologação do acordo. No plano de recuperação fiscal entregue à STN no fim de julho, a Fazenda fluminense projetava resultado primário fiscal (receitas primárias realizadas menos despesas primárias liquidadas) positivo apenas em 2020.

As previsões de resultado primário para eram negativas em R$ 2,76 bilhões (2017) e R$ 4,96 bilhões (2018). Para 2020, o resultado primário fiscal estimado era positivo em R$ 2,67 bilhões, alcançando R$ 13,53 bilhões em 2023, na esteira da implementação de medidas de ajuste ao longo de seis anos. Com o leilão dos serviços da folha de pagamento, vencido pelo Bradesco, o Rio arrecadou R$ 1,31 bilhão, suficiente para colocar em dia o pagamento do funcionalismo. Mas parte do 13º salário de 2016 ainda não foi paga. O Estado necessita mais R$ 1,2 bilhão para cobrir essa despesa em aberto.