Valor econômico, v. 17, n. 4338, 12/09/2017. Especial, p. A16.

 

 

Fatia no PIB cresce mais que carga de impostos para setor de serviços

Rodrigo Carro

12/09/2017

 

 

Desenhada na década de 60, a atual estrutura tributária brasileira vem se mostrando incapaz de acompanhar a expansão do setor de serviços, principalmente no segmento digital. Apesar de responder por cerca de um quinto do PIB brasileiro nos últimos dois anos, a indústria contribuiu com mais de um terço da arrecadação federal, segundo indica levantamento feito pelo Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão. Já o setor de serviços, mesmo tendo participação crescente na economia, ainda paga menos impostos em relação à sua participação no Produto Interno Bruto.

No biênio 2015/2016, a indústria foi responsável, em média, por 34,20% da arrecadação federal, embora sua participação no PIB tenha sido de 21,8% no período, conforme mostram dados da Receita Federal e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) compilados pelo Planejamento. No caso das atividades agropecuárias, a participação no PIB (5,2%) foi quase 20 vezes maior em relação à fatia do setor na arrecadação federal (0,27%) nos últimos dois anos. Para os serviços, a desproporção é menor, mas significativa. Embora tenham representado 73% do PIB em 2015 e 2016, em média, geraram 65,53% da arrecadação.

"Com mais de meio século, o sistema tributário brasileiro foi desenhado em cima de impostos sobre mercadorias e produtos industriais, o que era consistente para uma economia de bens", explica José Roberto Afonso, professor do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP) e pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre-FGV).

Quando foi criado, o sistema tributário brasileiro sobrecarregava a indústria que, na época detinha uma parcela do PIB muito superior à atual. "A economia e a sociedade mudaram radicalmente no Brasil e no mundo. Primeiro, se tornando uma economia de serviços. Agora, está em curso outra revolução, a digital", acrescenta Afonso.

Ao longo década de 2010, o avanço dos serviços como principal motor da economia brasileira diminuiu muito pouco a distância entre o que o setor gera de riquezas e sua contribuição dentro da arrecadação federal. Na comparação entre os biênios de 2011/2012 e 2015/2016, a participação dos serviços no produto interno bruto passou de 68,4% para 73%, em média.

Paralelamente, a fatia do setor no montante de impostos arrecadados pela União subiu de 59,98% para 65,53% nos períodos pesquisados. A distância, portanto, caiu de 8,42 pontos percentuais para 7,47. Fazendo a mesma comparação para o setor industrial, a distância caiu ainda menos: passou de 13,14 pontos percentuais para 12,4%, tomando por base também os períodos de 2011/2012 e 2015/2016.

"A estrutura tributária não acompanhou as novas tecnologias e mesmo o projeto de reforma proposto pelo deputado Luiz Carlos Hauly já nasce obsoleto, pois a criação do IVA [Imposto sobre Valor Agregado] Federal vem com atraso de dez anos e não prepara o país para a tributação dos serviços digitais e intangíveis, embora tenha a virtude de conferir maior racionalidade ao sistema tributário quando comparado ao modelo arcaico atual", opina o tributarista Pedro Bello, sócio do escritório Bichara Advogados. "O caminho a ser seguido parece ser o mesmo lançado na reforma do [presidente americano] Donald Trump onde a tributação é sobre fluxos de caixa - não interessa a residência do contribuinte - e, especialmente, um tributo que grave as operações digitais - sim, algo como a velha e boa CPMF."

Economista-chefe da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), Guilherme Mercês lembra que a indústria brasileira paga em impostos o equivalente a 47% do PIB do setor. Para as empresas de serviços, esse percentual é de 23% do PIB setorial. "No Brasil, os impostos incidem de forma concentrada sobre bens e serviços. No resto do mundo, recaem sobre renda e patrimônio", compara. Na visão dele, não seria necessária uma "revolução" no sistema tributário nacional e sim uma simples evolução. "O país não precisa necessariamente de uma reforma para reequilibrar as alíquotas entre os setores. Isso acontece naturalmente ao se balancear melhor os tributos [direcionando-os para renda e patrimônio]", sustenta Mercês.

Para a indústria nacional, o principal imposto continua a ser o ICMS, criado em 1965. De todo o montante de tributos pago pela indústria, o ICMS corresponde a 36% do total, segundo a Firjan.