Valor econômico, v. 17, n. 4339, 13/09/2017. Brasil, p. A3.

 

 

Investidores pedem mais proteção cambial em concessões

Daniel Rittner

13/09/2017

 

 

A queda da taxa básica de juro abre novas perspectivas de financiamento para projetos de infraestrutura, mas o governo poderia avaliar mais instrumentos de mitigação dos riscos cambiais, segundo representantes do setor privado que participaram ontem do 10º Congresso Brasileiro de Rodovias e Concessões.

Para o diretor de project finance do Santander, Edson Ogawa, a participação do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) foi importante em empreendimentos do passado recente para conter um pouco as tarifas de energia ou de pedágio com crédito subsidiado. Agora, com a diminuição da Selic, o executivo vê condições para que esse papel do banco de fomento seja gradualmente reduzido.

Segundo ele, fundos de pensão e de asset management tendem a aumentar o apetite pelo risco, mas outra iniciativa interessante seria seguir a experiência de outros países da América Latina e contemplar a hipótese de indexação em dólar de uma parte das tarifas. Na avaliação de Ogawa, isso permitiria às concessionárias de infraestrutura ter acesso ao mercado de crédito externo.

"O Brasil talvez seja o único país que não aplicou esse tipo de modelo", disse o diretor do Santander, citando os exemplos do Peru e da Colômbia. Ele lembrou que o mercado internacional está com recursos de sobra e trabalha com taxas muito mais baixas, mas é preciso ter instrumentos para bancar o risco cambial pelo menos parcialmente. "Não conseguimos sequer ter essa discussão [no Brasil]. Esse é um debate que vale a pena ser colocado."

O presidente da Arteris, David Díaz, seguiu a mesma linha. Ele elogiou mecanismos introduzidos nos últimos leilões de aeroportos pela União e de rodovias no Estado de São Paulo. "São mecanismos que podem funcionar para oscilações muito pequenas, mas insuficientes para desvalorizações de 20% ou 30%", afirmou.

A Arteris arrematou a concessão da Rodovia dos Calçados (SP), em abril, com ágio superior a 400% e pagamento de R$ 1,2 bilhão em outorga. O ativo já tinha um mecanismo de proteção cambial, mas considerado ainda tímido. No caso dos quatro aeroportos leiloados pelo governo federal em março - Fortaleza, Salvador, Porto Alegre e Florianópolis -, variações súbitas do real são parcialmente compensadas no valor de outorga variável a ser pago pelas novas concessionárias. "Assumir riscos de câmbio não é o nosso objetivo. É um risco que não queremos assumir", disse Díaz, reforçando o pedido para discussões mais profundas.

O chefe do departamento de transportes e logística do BNDES, Cleverson Aroeira, lembrou que a instituição financiou 40 das 59 concessões de rodovias já feitas no país. Em alguns casos, até 70% foi com base na TJLP. Hoje os projetos têm sido contemplados pela taxa para cerca de 50% dos itens financiáveis. "Isso tende a ser menos. A intenção do banco é ser coadjuvante, é preciso haver cofinanciamento com outras instituições."

Um consenso é que o mercado de capitais, com a emissão de debêntures, terá participação cada vez maior. O desafio, porém, é como lidar com os riscos de construção e de demanda associados aos primeiros anos de contrato.