O Estado de São Paulo, n. 45301, 28/10/2017. Política, p.A14

 

 

 

 

Maia prioriza lei de abuso de autoridade

Presidência da Câmara cria comissão especial para avaliar projeto que estava parado havia quase seis meses; CCJ vai analisar o fim do foro

Por: Daiene Cardoso Igor Gadelha

Daiene Cardoso

Igor Gadelha / BRASÍLIA

Passada a votação que suspendeu a denúncia contra o presidente Michel Temer, a Câmara deve se debruçar sobre temas que podem afetar diretamente as investigações envolvendo políticos. O presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), criou uma comissão especial para analisar pro- jeto de lei que trata do abuso de autoridade, enquanto a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) deve pautar nas próximas semanas a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que acaba com o foro privilegiado.

Após deixar a proposta parada na Casa por quase seis meses, Maia assinou, anteontem, o ato que cria a comissão especial que vai analisar o projeto que trata de abuso de autoridade. Pelo despacho, a proposta deverá tramitar com “prioridade”, como exige o regimento interno da Câmara em caso de propostas que vêm do Senado.

A comissão deverá ter 34 integrantes titulares e igual número de suplentes. As vagas são distribuídas proporcionalmente ao tamanho das bancadas das siglas. O presidente da Câmara negou que a instalação da co- missão seja uma retaliação ao Judiciário. “A comissão foi um pedido de associações de juízes e procuradores para garantir o debate. O mesmo pedido foi feito e atendido no PL do teto ( salarial)”, afirmou.

Maia disse ter recebido a demanda da juíza Renata Gil, presidente da Associação dos Magistrados do Rio de Janeiro, e do procurador José Robalinho Cavalcanti, presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR). A juíza confirmou o pedido a Maia. Segundo ela, há uma preocupação dos magistrados que eles não sejam devidamente ouvidos sobre o projeto. A reportagem não conseguiu contato com o presidente ANPR.

Maia ressaltou que havia um temor entre juízes e procuradores de que a urgência do projeto fosse aprovada e a proposta, votada diretamente no plenário da Câmara, sem passar pelas comissões. “Com a comissão, está garantido o debate”, afirmou.

Foro privilegiado. O presidente da CCJ, deputado Rodrigo Pacheco (PMDB-MG), também vai liberar para a pauta a votação da admissibilidade da PEC que acaba com o foro privilegiado por prerrogativa de função em casos de crimes comuns. O relator Efraim Filho (DEM-PB) liberou a parecer há um mês. A proposta já foi aprovada no Senado e se passar pela CCJ, também será formada uma comissão es- pecial por se tratar de mudança constitucional.

A PEC que restringe o foro especial valerá para crimes comuns cometidos por deputados, senadores, ministros de Estado, governadores, prefeitos, ministros de tribunais superio- res, desembargadores, embaixadores, comandantes das Forças Armadas, integrantes de tribunais regionais federais, juízes federais, membros do Ministério Público, procurador-geral da República e membros dos conselhos de Justiça e do Ministério Público. O foro permanecerá para presidente e vice-presidente da República, chefe do Judiciário e os presidentes da Câmara e do Senado.

Pacheco também quer colocar em votação outros temas polêmicos, como a PEC que dá autonomia funcional, administrativa e orçamentária à Polícia Federal.

 

- Debate

“A comissão foi um pedido de associação de juízes e procuradores para garantir o debate.”

Rodrigo Maia (DEM-RJ)

PRESIDENTE DA CÂMARA

 

 

 

 

CNBB condena ‘barganha de emendas’ para barrar denúncia

Nota de entidade diz que momentos como este ‘ameaçam a democracia’ e abrem espaço para ‘salvadores da pátria’
Por: Ricardo Galhardo

Ricardo Galhardo

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) divulgou uma nota anteontem, dois dias depois da sessão da Câmara dos Deputados que impediu a investigação do presidente Michel Temer por obstrução à Justiça, na qual condena a “barganha na liberação de emendas parlamentares pelo governo” e faz um alerta sobre a situação social e política do País. De acordo com a CNBB, existe um divórcio entre a classe política e a so- ciedade brasileira.

“A barganha na liberação de emendas parlamentares pelo governo é uma afronta aos brasileiros (…). O divórcio entre o mundo político e a sociedade brasileira é grave”, disse a nota.

O Estado revelou na última quarta-feira que o custo das medidas e concessões feitas a parlamentares para barrar as duas de- núncias contra Temer pode chegar a R$ 32 bilhões.

De acordo com a CNBB, as práticas políticas causam apatia e descaso pela democracia na população em geral e até nos movimentos sociais, tradicionalmente mais engajados. O cenário, dizem os bispos, propicia o surgimento de salvadores da pátria, “radicalismo e fundamentalismos” e coloca em risco a democracia.

“Tais práticas ferem a política e a esperança dos cidadãos que parecem não mais acreditar na força transformadora e renovadora do voto. É grave tirar a esperança de um povo. Urge ficar atentos, pois, situações como esta abrem espaço para salvadores da pátria, radicalismos e fundamentalismos que aumentam a crise e o sofrimento, especialmente dos mais pobres, além de ameaçar a democracia no País”, disse o texto da CNBB.

Os bispos afirmam ainda que só a reação do povo é capaz de “purificar a política”. A nota incentiva que a população se manifeste de forma pacífica contra a retirada de direitos.

 

- Eleições

“Tais práticas ferem a política e a esperança dos cidadãos que parecem não mais acreditar na força transformadora e renovadora do voto. É grave tirar a esperança de um povo.”

NOTA DA CNBB