Valor econômico, v. 17, n. 4346, 22/09/2017. Brasil, p. A2.

 

 

Irmãos Batista fraudaram mercado, conclui PF

André Guilhemer Vieira

22/09/2017

 

 

Sócios da J&F, os irmãos Joesley e Wesley Batista foram indiciados como autores dos crimes de manipulação de mercado e uso indevido de informação privilegiada, tendo como agravante o abuso de poder de controle e administração. O indiciamento foi concluído na quarta-feira pela Polícia Federal (PF) de São Paulo. O entendimento dos investigadores é que os irmãos se aproveitaram do fato de suas delações premiadas terem sido noticiadas no dia 17 de maio, pelo jornal 'O Globo', para obterem vantagem no mercado de capitais.

A conclusão é que Joesley cometeu, de forma continuada, manipulação de mercado e uso indevido de informação privilegiada por oito vezes, em razão da venda de ações da JBS S.A. pela controladora FB Participações.

A Wesley, a PF atribuiu a participação, de forma continuada e por cinco vezes, no delito de uso indevido de informação privilegiada pela venda e compra de ações da JBS S.A, além da aquisição de contratos futuros e contratos a termo de dólares.

O delegado Edson Garutti Moreira elencou 9 razões que explicou terem levado ao seu "convencimento" de que os Batista são culpados pelos crimes.

Um dos motivos listados é a venda de ações da JBS pela sua controladora, a FB Participações, no mesmo período em que a empresa foi ao mercado para recomprar suas ações. "Representa uma combinação de interesses que caracteriza manipulação de mercado", concluiu.

Para o delegado, "as pessoas que determinaram as operações no mercado de capitais tinham conhecimento desta 'informação relevante''' [delações premiadas], que estava "acobertada por sigilo".

Garutti Moreira também relacionou como razão para os indiciamentos o fato de que o crime de uso indevido de informação privilegiada não exige que a vantagem ocorra, mas apenas que a informação seja capaz de gerá-la. "Não há relevância se as operações foram realizadas com finalidade especulativa ou protetiva (hedge) - nos dois casos haveria uma vantagem em se utilizar a informação privilegiada", afirmou o delegado no despacho de indiciamento dos Batista.

Ontem, o criminalista que representa os Batista criticou o indiciamento dos irmãos pela PF.

"O indiciamento era desnecessário, dada a evidente condição de investigados de ambos", disse o advogado Pierpaolo Cruz Bottini.

Com os indiciamentos, a investigação criminal está praticamente concluída. Caberá ao Ministério Público Federal (MPF) oferecer denúncia contra Joesley e Wesley, solicitando ao juiz João Batista Gonçalves, da 6ª Vara Federal Criminal de São Paulo, a abertura de uma ação penal. Gonçalves foi o responsável pelo decreto das prisões preventivas, a pedido da Operação Tendão de Aquiles, da PF.

Como estão presos preventivamente (por prazo indefinido), a expectativa é que a acusação aos Batista seja formalizada até o final do mês. O prazo máximo para a apresentação da denúncia em inquérito com investigados presos é de 30 dias.

A apuração teve início em conjunto com a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), órgão regulador do mercado, depois que vieram à tona informações de que os irmãos Batista teriam lucrado nos mercados de ações e dólares, na véspera da divulgação de que ambos fecharam acordo de delação premiada com a Procuradoria-Geral da República (PGR). Os benefícios aos delatores poderão ser revogados, porque a PGR afirma que Joesley e o executivo da JBS, Ricardo Saud, também delator, omitiram informações dos investigadores. Uma gravação de conversa de quatro horas de Saud com Joesley, recuperada pela PF, dá a entender que, além de omitir fatos, os delatores tentaram induzir os procuradores a erro.

Joesley e Wesley Batista estão presos na custódia da PF em São Paulo. Contra Joesley pesa ainda outro decreto de prisão preventiva, expedido pelo ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF). Essa decisão de Fachin também colocou Ricardo Saud atrás das grades. Ele está preso no Complexo Penitenciário da Papuda, em Brasília.

Ontem, a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou, por maioria de votos, pedido de habeas corpus ajuizado pela defesa dos irmãos Joesley e Wesley Batista, mantendo-os em prisão preventiva.

Os ministros Rogério Schietti, Nefi Cordeiro, Antonio Saldanha e Maria Thereza Moura confirmaram a decisão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) de que a prisão é necessária, diante dos suficientes fundamentos que, segundo os magistrados, mostram a "reiteração delitiva" dos empresários - o que representaria "risco à ordem pública".

Ficou vencido o relator do processo, ministro Sebastião Reis. Na avaliação dele, não há indícios de que Joesley e Wesley possam prejudicar o andamento das investigações. Por isso, para o ministro, a prisão poderia ser convertida em medidas cautelares alternativas.

Responsável pela defesa dos Batista nos tribunais superiores, o advogado Antonio Carlos de Almeida Castro disse que vai recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF).

A primeira condenação no Brasil por uso de informação privilegiada ocorreu em fevereiro de 2011, por decisão do então juiz federal de São Paulo Marcelo Cavali.

Na época os sentenciados foram um ex-diretor e um ex-integrante do conselho de administração da Sadia.