Valor econômico, v. 17, n. 4346, 22/09/2017. Finanças, p. C1.

 

 

BC projeta inflação na meta mesmo com Selic a 7% em 2018

Alex Ribeiro

22/09/2017

 

 

O Relatório de Inflação de setembro, divulgado ontem, projeta o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) dentro das metas nos próximos três anos, mesmo que o Banco Central corte os juros dos atuais 8,25% ao ano para 7% ao ano e mantenha-os nesse patamar até o fim de 2018.

O documento apoia as previsões do mercado financeiro de que, se não houver nenhuma surpresa, os juros poderão cair aos menores percentuais da história nos próximos meses. Mas, desta vez, seria uma queda mais sustentável do que a ocorrida no governo Dilma Rousseff, quando a taxa básica ficou em 7,25% ao ano entre o fim de 2012 e o começo de 2013.

As projeções do BC mostram que a inflação ficará em 3,2% em 2017 e em 4,3% em 2018 - nos dois casos abaixo da meta de inflação, de 4,5% - caso sejam confirmadas as expectativas do mercado de corte dos juros a 7% até o fim deste ano e a alta da taxa de juros só em 2019, para 8% ao ano.

Nesse mesmo cenário, o relatório do BC prevê uma inflação de 4,2% em 2019, bem perto da meta de 4,25% definida para o ano, e de 4,1% em 2020, levemente acima da meta do ano, de 4%.

No documento, o BC descreve um cenário em geral positivo para cortes de juros, com o ambiente internacional favorável a economias emergentes e, dentro do país, perspectivas de inflação sob controle apesar da retomada gradual da economia, que cresceria 0,7% em 2017 e 2,2% em 2018.

O diretor de política econômica do BC, Carlos Viana de Carvalho, foi questionado, após a divulgação do relatório, se não houve excesso de conservadorismo na política monetária, já que os cálculos apresentados no RI indicam um risco de 36% de a inflação ficar abaixo do piso da meta em 2017, definida em 3%. Ele atribuiu o recuo da inflação não a um eventual conservadorismo do BC, mas sim à inesperada queda de preços de alimentos. Viana explicou que o importante é enfatizar o caráter condicional da política monetária. A condução depende da evolução do cenário base, balanço de risco, projeções e expectativas. "Ninguém tem bola de cristal para saber o que vai acontecer", disse.

Se a inflação ficar abaixo do piso, o presidente do BC, Ilan Goldfajn, terá que escrever uma carta aberta ao ministro da Fazenda apresentando as justificativas e detalhando as providências para fazê-la voltar ao objetivo.

"Se isso ocorrer, faremos [uma carta] com serenidade. A condução da política monetária tem que mirar mais adiante", disse, lembrando que não havia tempo para reagir a esse choque inesperado para colocar a inflação na meta ainda em 2017. Segundo ele, devido a choques como a queda ou alta de preços de alimentos "a inflação oscila acima ou abaixo da meta".

No relatório, o BC renovou a indicação de que, depois de quatro cortes de juros de um ponto percentual, a tendência é uma "redução moderada na magnitude da flexibilização monetária".

Especialistas tem entendido isso como uma indicação de que, em outubro, o corte será de 0,75 ponto percentual. O relatório também repete que o BC terminará de forma gradual o atual ciclo de distensão monetária.

Apesar de as projeções do relatório indicarem que há espaço para os juros ficarem baixos por um bom tempo, Viana evitou dar sinalizações mais concretas sobre o que vai ocorrer com a taxa básica depois que o ciclo de distensão terminar. Ele disse que a evolução da taxa de juros, a partir de então, dependerá das estimativas sobre a taxa de juros estrutural da economia - também chamada "taxa neutra", que é a que mantém a economia em pleno emprego sem acelerar nem desacelerar a inflação.

Segundo Viana, o BC comunicou que hoje considera adequado manter os juros abaixo da taxa neutra para estimular a economia. Os juros reais, segundo estimativas apresentadas pelo BC, estão em cerca de 3% ao ano. Mas ele disse que, ao longo do tempo, o natural é que a Selic oscile em torno da taxa neutra, ficando abaixo dela em alguns períodos e acima em outros.

Ilan Goldfajn, em entrevista ao Valor na semana passada, disse que depois do fim do ciclo as hipóteses são o BC subir a Selic, a taxa estrutural recuar ou uma combinação de ambos.

Neste relatório, o BC apresentou um box com o resultado de uma pesquisa que fez em abril com os participantes do Focus sobre a percepção com relação à taxa neutra. Os resultados apontam mediana em 5% para o curto prazo, 4,5% para um horizonte de dois anos e 4% em um prazo de cinco anos.

Viana disse não saber o quão abaixo do neutro a taxa está e nem por quanto tempo vai ficar assim. "O tempo dirá. A evolução da conjuntura vai ditar a condução da política monetária ao longo do tempo", explicou.

Mas, em termos qualitativos, Viana disse que o cenário do BC embute o entendimento de que as reformas na área de crédito, como a Taxa de Longo Prazo (TLP), registro de ativos, cadastro positivo e as reformas de natureza fiscal contribuem para uma queda dessa taxa ao longo do tempo. "Por isso, comunicamos a importância dessas reformas", explicou.

Sobre o balanço de riscos, Viana destacou que ele é simétrico e que os riscos citados nos comunicados do BC não somem completamente. "Ressaltamos os riscos mais relevantes. No momento atual, com relação ao passado recente, os riscos mais relevantes são a inflação baixa que pode se perpetuar e, do outro lado, a possível frustração com reformas e medidas", disse. A recuperação da atividade e o cenário externo já estavam no balanço de risco do relatório de junho.