Valor econômico, v. 17, n. 4349, 27/09/2017. Política, p. A7.

 

 

Palocci sai do PT e acusa Lula de sucumbir ao 'pior'

Cristiane Agostine e André Guilherme Vieira

27/09/2017

 

 

Preso há quase um ano, o ex-ministro Antonio Palocci desfiliou-se ontem do PT. Em carta à direção nacional do partido, o ex-ministro criticou a decisão da legenda de suspendê-lo e acusou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva de ter sucumbido "ao pior da política". Palocci disse que nos "piores atos de ilicitude" nunca esteve sozinho e afirmou que acompanhou de perto não só o "acúmulo de eventos de corrupção" nos governos petistas, mas também a "deterioração moral" da sigla.

"Sei dos erros e ilegalidades que cometi e assumo minhas responsabilidades. Mas não posso deixar de destacar o choque de ter visto Lula sucumbir ao pior da política no melhor dos momentos de seu governo", disse Palocci. Para o ex-ministro, Lula "dissociou-se definitivamente do menino retirante para navegar no terreno pantanoso do sucesso sem crítica, do 'tudo pode', do poder sem limites, onde a corrupção os desvios, as disfunções que se acumulam são apenas detalhes, notas de rodapé no cenário entorpecido dos petrodólares que pagarão a tudo e a todos".

Nas quatro páginas da carta encaminhada à presidente nacional do PT, senadora Gleisi Hoffmann (PR), Palocci disse que o conteúdo de seu depoimento prestado no dia 6 ao juiz federal Sergio Moro é verdadeiro. Entre as acusações feitas ao magistrado e reiteradas no documento enviado ao PT estão supostas irregularidades na compra do prédio do Instituto Lula e em doações da Odebrecht ao PT, ao instituto e ao ex-presidente. "São situações que presenciei, acompanhei ou coordenei normalmente junto ou a pedido do ex-presidente Lula", escreveu. "Tenho certeza que cedo ou tarde o próprio Lula irá confirmar tudo isso, como chegou a fazer no mensalão", disse, citando que o ex-presidente reconheceu o uso do caixa dois pelo PT.

"Até quando vamos fingir acreditar na autoproclamação do 'homem mais honesto do país' enquanto os presentes, os sítios, os apartamentos e até o prédio do Instituto são atribuídos a dona Marisa?", disse, em referência à mulher de Lula, Marisa Letícia, que morreu no início do ano.

Na sexta-feira, o Diretório Nacional do PT suspendeu Palocci por 60 dias, depois do pedido de expulsão contra o ex-ministro apresentado pelo diretório de Ribeirão Preto. A sigla alega que o ex-ministro quebrou a ética partidária com o depoimento prestado ao juiz Moro, no âmbito da Operação Lava-Jato, contra Lula. Ao magistrado, Palocci acusou Lula de práticas ilícitas e disse que o ex-presidente supostamente teria feito um "pacto de sangue" com a Odebrecht para receber propina.

Na carta enviada ontem ao PT, Palocci disse estranhar a decisão do partido por punir "quem fala a verdade" e varrer "para debaixo do tapete" os erros e ilegalidades.

Nas críticas a Lula, o ex-ministro citou a ex-presidente Dilma Rousseff e o ex-presidente da Petrobras José Sergio Gabrielli. "Um dia, Dilma e Gabrielli dirão a perplexidade que tomou conta de nós, após a fatídica reunião na biblioteca do Alvorada, onde Lula encomendou as sondas e as propinas no mesmo tom, sem cerimônias, na cena mais chocante que presenciei do desmonte moral da mais expressiva liderança popular que o país construiu em toda nossa história", afirmou na carta.

O ex-ministro disse ainda que há pouco mais de um ano conversou com Lula e o então presidente do PT, Rui Falcão, sobre a proposta de o ex-tesoureiro do partido João Vaccari, também preso, "buscasse um processo de leniência na Lava-Jato".

Em nota, o PT disse que a carta de Palocci "repete as falsas acusações feitas diante do juiz Sergio Moro" e é destinada "aos procuradores da Lava-Jato" e não ao partido. "É a mensagem de um condenado que desistiu de se defender e quer fechar negócio com o MPF [Ministério Público Federal], oferecendo mentiras em troca de benefícios penais e financeiros", afirmou. "A forma desrespeitosa e caluniosa como se refere ao ex-presidente Lula demonstra sua fraqueza de caráter e o desespero de agradar seus inquisidores. Política e moralmente, Palocci já está fora do PT". A sigla disse ainda que o ex-ministro "rompeu com sua história" e "renegou causas" defendidas no passado.

A assessoria de Lula disse, em nota, que o "ex-presidente já respondeu sobre Palocci em seu depoimento". "Palocci inventa acusações sem provas para obter um acordo de delação premiada".