Valor econômico, v. 17, n. 4349, 27/09/2017. Política, p. A7.

 

 

Provas da JBS podem ser usadas diz Raquel

Murillo Camarotto

27/09/2017

 

 

Na primeira vez em que se manifestou sobre a Operação Lava-Jato desde que assumiu o cargo, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, indicou que as provas produzidas na delação premiada da JBS podem ser aproveitadas. Ela indicou, entretanto, que o cenário pode mudar caso o acordo com os irmãos Batista seja anulado e não rescindido.

Sem dar maiores detalhes, a titular da PGR lembrou que há diferenças jurídicas entre rescisão e nulidade do processo e que essa questão está sob análise de sua equipe. Ela ressaltou, entretanto, que falou de forma genérica, não tratando especificamente da JBS.

Após a divulgação de uma conversa entre Joesley Batista e o executivo Ricardo Saud, o antecessor de Raquel na PGR, Rodrigo Janot, determinou a rescisão dos acordos de ambos. Enfatizou, no entanto, que as provas continuariam válidas. Questionada ontem, Raquel afirmou que a regra sobre o uso das provas "é clara".

"Me parece que a lei é clara no sentido de que a rescisão do acordo não invalida a prova produzida no âmbito da delação premiada", disse ela. "No tocante às delações [da JBS], estamos conhecendo melhor o conteúdo e compreendendo a importância e o impacto delas. É um momento ainda de estudo e reflexão sobre o que faremos", completou.

Sobre a Lava-Jato, ignorada em seus primeiros discursos, a titular da PGR afirmou que a operação apresentou resultados importantes e que transformou a percepção das pessoas sobre o combate à corrupção. Garantiu, ainda, que as investigações prosseguirão "naturalmente" e terão apoio de sua administração.

"O compromisso do Ministério Público com o combate à corrupção, especialmente a Lava-Jato, que tantos benefícios tem trazido, é o meu compromisso", disse.

Raquel Dodge afirmou que sua equipe não teve acesso a documentos sigilosos da Lava-Jato até ela tomar posse, motivo pelo qual todos os procuradores do gabinete ainda estão tomando pé da situação. O objetivo, no entanto, é que as ações penais propostas sejam aceleradas.

Questionada se concordava com a opinião de Janot, que acusou o presidente Michel Temer de liderar uma organização criminosa e de obstruir a Justiça, Raquel disse que não faria avaliações personalizadas, mas garantiu que a denúncia apresentada vai seguir seu caminho se a Câmara dos Deputados autorizar.

"Não me cabe dar opinião sobre o que fará a Câmara, porque respeito essa instituição. Se a Câmara aprovar a continuidade [da denúncia], exercerei meu papel com clareza e transparência. [A denúncia] Será submetida ao plenário pelo STF e, se recebida, deverá ter continuidade porque a ação penal é indisponível. Nenhum procurador pode voltar atrás. Uma vez recebida, darei a ela a continuidade que é mister do meu cargo", afirmou ela.

A nova PGR também comentou sobre a política que adotará para a retirada do sigilo dos acordos de delação. Também sem dar detalhes, ela disse que a divulgação das informações obedecerá o que determina a lei. A gestão de Raquel promete ser mais cautelosa com a publicidade das ações da procuradoria. Por mais de uma vez em sua fala, ela mencionou as palavras "temperança", "sobriedade" e "equilíbrio".

Há dez dias no cargo, Raquel Dodge concedeu ontem sua primeira entrevista coletiva, após se reunir com os ministros Raul Jungmann (Defesa), Torquato Jardim (Justiça) e Sérgio Etchegoyen (Segurança Institucional). Os quatro trataram da crise no Rio de Janeiro e da possibilidade de um trabalho conjunto de combate ao crime na cidade.

Raquel disse que as conversas ainda estão no início, mas que uma das possibilidades é a criação de uma força-tarefa para tratar do problema. Nesse contexto, a PGR atuaria no combate aos crimes federais, como associação para o tráfico internacional de armamento e de drogas.

"Não está definido ainda os moldes como será essa força-tarefa. Fizemos um diagnóstico da situação. A situação ali é bastante complexa, é duradoura e já entranhou-se por diversos locais do Rio de Janeiro, de modo de que exige cautela", afirmou Raquel.