Título: BC baixará juros a 9%
Autor: Cristino, Vãnia
Fonte: Correio Braziliense, 16/03/2012, Economia, p. 11

Ata do Comitê de Política Monetária indica mais um corte de 0,75 ponto, em abril, da taxa Selic

Descobrir para onde vai a taxa básica de juros (Selic) perdeu, momentaneamente, a emoção. A diretoria do Banco Central inovou mais uma vez na comunicação com o mercado ao dizer claramente, na ata do Comitê de Política Monetária (Copom) divulgada ontem, que definiu um piso para o indicador e é “elevada a probabilidade de concretização de um cenário em que os juros se deslocam para patamares ligeiramente acima dos mínimos históricos”. O patamar mínimo a que se referiu o Copom é a taxa Selic de 8,75%, vigente no período de julho de 2009 a março de 2010.

O mercado, que apostava em uma baixa da taxa atual de 9,75% para até 8,50%, ficou estarrecido com essa comunicação explícita e imediatamente mudou, de forma uniforme, a projeção para uma Selic de 9% ao ano, com nova queda de 0,75 ponto percentual na reunião do Comitê marcada para abril. “Já que avisou qual será o nível da taxa, não vejo por que não chegar a esse patamar na próxima reunião”, disse José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do Banco Fator. A mesma posição foi defendida pelos analistas do HSBC e por Eduardo Velho, economista-chefe da Prosper Corretora. “O mecanismo usado para ancorar as expectativas está claro. A taxa Selic vai parar em 9% em abril”, afirmou Velho.

No entender de Luís Otávio de Souza Leal, economista-chefe do Banco ABC Brasil, o recado direto do Copom, apesar de surpreendente, parece ser uma marca da administração de Alexandre Tombini à frente do BC. A seu ver, a autoridade monetária aproveitou uma “janela de oportunidade” para antecipar os cortes e, mesmo tendo deixado em aberto a questão da redistribuição temporal, tudo leva a crer que haverá só mais uma redução de 0,75 ponto.

Para Leal, a novidade da ata fica por conta do ineditismo de apontar o nível da taxa de juros que se quer chegar, uma vez que o BC listou os motivos que o levaram a acelerar o ritmo da queda na última reunião. São eles: o crescimento decepcionante da economia brasileira no segundo semestre do ano passado e o deteriorado quadro internacional, com destaque para uma expansão menor da China, que contribuirá para mitigar os riscos inflacionários. “O Copom avalia que a desaceleração da economia brasileira no segundo semestre foi maior do que se antecipava”, destacou a ata.

O Copom também ressaltou que o cenário traçado para a evolução da inflação foi o esperado pelos seus membros. E, apesar de a inflação acumulada em 12 meses apresentar claro declínio, a decisão de promover uma queda mais acentuada na taxa de juros este mês não foi unânime. O BC explicou que dois de seus membros avaliaram que seria oportuna a manutenção do ritmo de ajuste da taxa Selic, que vinha sendo feito à razão de 0,50 ponto. Venceu, no entanto, a maioria sob o argumento de que “a redistribuição temporal do ajuste total das condições monetárias”, ou seja, o corte mais rápido dos juros, seria a estratégia mais adequada para o momento. Nas contas do BC, a inflação estimada para este ano já está abaixo do centro da meta, de 4,5%. Mas, para 2013, o índice tende a superar o objetivo definido pelo governo.

O economista-chefe da Gradual Investimentos, André Perfeito, chamou a atenção para o fato de o BC contar com o aperto fiscal para não só cortar juros mas também atingir a inflação na meta. “A geração de superavits primários compatíveis com as hipóteses contempladas nas projeções de inflação solidificará a tendência de redução da razão dívida pública sobre o PIB.”

Só Tombini fala A presidente Dilma Rousseff voltou a ressaltar ontem que, no seu governo, quem fala sobre juros é o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini. “Vou responder uma coisa que eu disse lá na Alemanha: no meu governo, fala sobre juros o ministro, fala sobre juros e política monetária o ministro do Banco Central, Alexandre Tombini”, disse ela, após reunião sobre a ferrovia Norte-Sul, em Goiás. Dilma não respondeu se o novo patamar de juros obrigaria o governo a mudar as regras da caderneta de poupança.

Dólar atrás de juro alto Depois que o Comitê de Política Monetária (Copom) fixou um piso para os juros, em ata, deixando claro que este não ficará inferior a 8,75% este ano, o país passou a ser atraente e seguro para investidores em busca de ganhos maiores num momento de crise em diversos mercados. Resultado: dois leilões de dólares foram realizados com o intuito de evitar uma alta ainda maior do real, que já compromete as exportações brasileiras. Com as intervenções, o dólar encerrou o dia cotado a R$ 1,8038 na venda, um recuo de 0,18%.

"Acho que foi uma combinação de fluxo e dólar testando o patamar de R$ 1,80 para baixo. Essas duas coisas combinadas chamaram o BC de volta ao mercado", disse o consultor financeiro da PreviBank Jorge Lima.

O BC realizou um primeiro leilão de compra de dólar no mercado à vista pouco após as 12h, com taxa de corte de R$ 1,8057. A moeda norte-americana, que estava em queda, chegou a subir, mas logo retomou a trajetória de baixa. Às 15h33, O BC voltou ao mercado e fez o segundo leilão do dia.

O BC não atuava no mercado desde 5 de março. No período, o governo intensificou as ações contra a chamada "guerra cambial", com a aplicação da alíquota de 6% do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) para os financiamentos externos de até cinco anos, de modo a evitar uma valorização excessiva do real para não prejudicar ainda mais a indústria brasileira.

Perdas na indústria A perda de participação da indústria no Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro significa uma desindustrialização precoce da economia, segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). O instituto, vinculado ao Ministério do Planejamento, divulgou ontem o Boletim Conjuntura em Foco explicando que o fenômeno não pode ser considerado uma evolução natural, como a que aconteceu nos países desenvolvidos, porque não foi acompanhado de aumento considerável na renda per capita. "É preciso destacar os processos diferentes que aconteceram em economias avançadas e na brasileira face a uma redução da participação da indústria na economia e no emprego. Essa perda começa a acontecer justamente quando essas economias se defrontam com um nível de renda elevadíssimo, incomparavelmente mais elevado do que o nível de renda per capita no Brasil", disse Roberto Messenberg, coordenador do Grupo de Análise e Previsões do Ipea.

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