Valor econômico, v. 17, n. 4353, 03/10/2017. Política, p. A10.

 

 

Moraes devolve voto sobre foro privilegiado

Luísa Martins

03/10/2017

 

 

Após quase quatro meses, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes concluiu seu voto sobre a questão de ordem que discute interpretação restritiva do chamado foro privilegiado, isto é, se a prerrogativa deve ou não se limitar a crimes cometidos durante e em razão do exercício do cargo.

Em 1º de junho, durante o julgamento do caso, ele havia pedido vista dos autos, para ganhar mais tempo de analisar a questão. Agora, liberou a ação para que volte a ser apreciada pelo plenário da Corte. A data de retomada deve ser definida pela presidente do Supremo, ministra Cármen Lúcia.

Ontem, o próprio ministro informou sobre a devolução do voto em sua conta no Twitter. "No dia 29, após a análise de questões importantes do foro privilegiado, devolvi pedido de vista para o plenário", escreveu.

Na ocasião do julgamento, ainda que, pelo regimento interno da Corte, Moraes fosse o primeiro a votar após o relator, seu pedido de vista não impediu outros ministros de se manifestarem. Três deles adiantaram seus votos: Marco Aurélio Mello, Rosa Weber e Cármen Lúcia acompanharam o relator, Luís Roberto Barroso, e formaram placar de 4 votos a 0 para que o foro se restrinja a crimes cometidos em função do mandato - caso contrário, a competência é da primeira instância. Eles podem, no entanto, mudar seus pontos de vista a qualquer momento.

Moraes problematizou a questão de ordem por quase duas horas antes de pedir vista. "Não se trata meramente de uma norma processual, mas de um complexo de garantias com reflexos importantíssimos. Alterar uma delas é como um jogo de varetas: ao mexer uma, você mexe as demais", disse. "Eu pretendo analisar cada um desses reflexos. Em virtude disso, eu peço vista."

Na ocasião, Marco Aurélio afirmou que, caso os crimes cometidos pelas autoridades com foro não estejam relacionados ao mandato, eles devem "passar a ter o tratamento que é reservado aos cidadãos comuns, pouco importando se amanhã ou depois sejam eleitos para um novo cargo". "O dia a dia revela que essas pessoas acabam logrando mandatos até mesmo mais importantes", alfinetou.

O relator disse, em seu voto, que o foro privilegiado, do jeito que está, revela uma "disfuncionalidade" do sistema, causando indignação na sociedade e trazendo desprestígio ao STF.

"Se não fizesse diferença o foro privilegiado, não haveria este empenho em disputar cargos que têm foro. Manter a jurisdição no Supremo é uma bênção, porque supõe-se, com acerto, que a jurisdição de primeiro grau vai ser mais rápida. Não há argumento capaz de desfazer a realidade óbvia", argumentou.

De acordo com pesquisa da Fundação Getulio Vargas (FGV) citada por Barroso em seu voto, caso a interpretação do relator seja aprovada pela Corte, 90% dos processos cairão para instâncias judiciais inferiores.

O então procurador-geral da República Rodrigo Janot concordou com a proposta em manifestação no início do julgamento. Na retomada do caso em plenário, entretanto, caso entenda necessário, sua sucessora no cargo, Raquel Dodge, também poderá se manifestar.