O Estado de São Paulo, n. 45299, 26/10/2017. Política, p. A5.

 

 

Dia tenso mostra um presidente fragilizado duplamente

Vera Magalhães

26/10/2017

 

 

O clima na Câmara e no Palácio do Planalto ontem não era de comemoração nem mesmo de alívio. A vitória apertada na votação da segunda denúncia contra Michel Temer foi mais apertada do que na primeira, e a intercorrência médica pela qual passou o presidente mostra um homem – além do político – fragilizado.

Nas conversas com ministros, líderes e assessores a apreensão era o tom que se sobressaía às tentativas de minimizar a internação de emergência do presidente e a constatação de que o placar dificilmente chegaria aos 263 votos de agosto. Foi pior ainda: Temer não obteve apoio de 257 deputados, o que configuraria a maioria da Casa.

A crônica da vitória não celebrada começa pelo PSDB: o partido se manteve no muro, mas colocou um pé a mais no lado de oposição ao presidente. São Paulo de Alckmin e Doria só deu um voto pelo arquivamento da denúncia, como da primeira vez. E na Bahia do ministro Antonio Imbassahy os outros dois tucanos votaram pelo prosseguimento do processo.

Fora o mico: bastou que Ricardo Tripoli (SP) dissesse que o parecer não deveria ser considerado do PSDB para que praticamente todos os deputados que se seguiram a ele – contrários ou favoráveis a Temer – fizessem questão de dizer “voto contra/a favor do relatório do PSDB”. Eis o preço de uma legenda não ter espinha vertebral nem coerência, para que lado seja.

Minas Gerais, Estado de Aécio Neves e do relator Bonifácio de Andrada, deu uma votação massiva a favor do presidente. Foi o único Estado em que prevaleceu, ainda, a influência minguante do presidente licenciado do PSDB, que na semana passada recebeu ajuda do Planalto para se manter no exercício do mandato.

A despeito dessas ilhas de apoio ao Palácio do Planalto, a desobstrução fisiológica de canal a que se submeteu Temer não encontra um equivalente político.

Para o governo, os caminhos seguem interrompidos, e sua abertura dependerá da reconstrução da base de sustentação, alimentada nas últimas semanas com concessões generosas que não resultaram numa vitória expressiva. O mais significativo recuo foi quanto à privatização de Congonhas, joia da Coroa do pacote de privatizações empenhada no prego da fisiologia.

Neste momento, não há entusiasmo para o pouco mais de um ano que o presidente tem pela frente. Muito menos por sua agenda calcada na necessidade de cumprir a meta fiscal e pela tentativa de fazer alguma reforma na Previdência.

Se esta sair, será uma versão desidratada e dependerá da mediação de Rodrigo Maia (DEM-RJ), o presidente da Câmara cujo comportamento pendular nas últimas semanas o leva a sair fortalecido novamente.

Não bastasse ter de se ajoelhar até o fim do mandato no altar da negociação com Maia e o Congresso, Temer não poderá dormir tranquilo enquanto aliados da vida toda estiverem presos e tentados a fazer delação premiada.

Será necessário monitorar o pulso de Geddel Vieira Lima, Rodrigo Rocha Loures, Eduardo Cunha e Henrique Eduardo Alves até a reta final do mandato. Vem aí uma convalescença política prolongada para Temer.

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PSDB, DEM e até PMDB dão menos votos

Daiene Cardoso / Felipe Frazão / Isadora Peron / Renan Truffi

26/10/2017

 

 

Além dos tucanos, DEM, PSD, PTB e o até o PMDB, partidos que compõem a base aliada, registraram menos votos ontem, na votação que barrou a segunda denúncia contra o presidente Michel Temer, por obstrução da Justiça e organização criminosa, do que em agosto, quando apreciaram a admissibilidade da primeira acusação formal da Procuradoria-Geral da República, por corrupção passiva.

No caso do PSDB, o cenário foi ainda pior para o governo, já que a maioria da bancada votou contra Temer desta vez. Foram 23 votos a favor da continuidade da investigação e 21 pelo arquivamento. Na primeira votação, a bancada tucana já havia rachado, mas na época os tucanos deram 22 votos favoráveis ao presidente da República e 21 contra.

O resultado final na bancada tucana mostrou um distanciamento entre o partido e o governo. O desfecho foi interpretado como uma derrota do senador Aécio Neves (PSDB-MG), considerado o principal responsável pela manutenção do partido na base aliada. E dá força ao senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), presidente interino da sigla e alinhado à ala que defende o desembarque dos tucanos do governo.

No DEM, partido do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (RJ), Temer obteve 23 votos em agosto e 20 agora. O deputado Abel Mesquita (RR) foi um dos que havia votado contra o prosseguimento da denúncia e, desta vez, votou a favor da continuidade da investigação.

Temer também perdeu votos no PSD do ministro Gilberto Kassab (Ciência e Tecnologia). O líder da bancada, deputado Marcos Montes (MG), já havia avisado que o número de descontentes na bancada havia crescido. Os deputados Heuler Cruvinel (PSD-GO), Delegado Éder Mauro (PSD-PA), Jaime Martins (PSD-MG) e João Paulo Keinübing (PSD-SC) mudaram os votos desta vez e retiraram o apoio a Temer.

No PMDB, partido do presidente, a quantidade de votos favoráveis ao governo foi menor do que em agosto, mas isso aconteceu porque a bancada do partido na Câmara diminuiu.

 

Aumento. Outros partidos, no entanto, registraram mais votos favoráveis a Temer. Esse foi o caso do PR, PSC e PRB. No partido do ministro Marcos Pereira (Indústria, Comércio Exterior e Serviços), o PRB, por exemplo, Carlos Gomes (RS), Ronaldo Martins (CE) e César Halum (TO) votaram contra o governo na primeira denúncia e, agora, ajudaram a enterrar a segunda denúncia.