Correio braziliense, n. 19926, 12/12/2017. Política, p. 4

 

Combate às noticias falsas 

Renato Souza e Deborah Fortuna

12/12/2017

 

 

CONGRESSO » Juristas, parlamentares e especialistas discutem hoje, no Senado, a difusão das fake news

A difusão de notícias falsas ameaça o funcionamento da democracia em quase todos os países. No Brasil, esse risco não é diferente e está levantando debates sobre a segurança de processos eleitorais e da qualidade da informação. Por conta disso, integrantes do Poder Legislativo, Judiciário e especialistas do setor se reúnem hoje, a partir das 10h, no Senado, para estudar alternativas com a finalidade de reduzir o impacto desse problema. Mirando as eleições do próximo ano, que devem ter forte influência da internet, o presidente do Senado, Eunício Oliveira, convocou um seminário para debater a criação de leis para proibir a prática. Entre os participantes está o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal.

A propagação das chamadas fake news (notícias falsas, em inglês) já é mais grave no Brasil do que os especialistas previam. Um estudo da Universidade de São Paulo (USP) apontou que 12 milhões de pessoas compartilham informações erradas pelas redes sociais todos os meses. Levando em consideração o alcance de um perfil no Facebook, por exemplo, onde cada pessoa tem, em média, 200 amigos, informações inventadas podem alcançar 107 milhões de internautas.

O professor e consultor de comunicação e marketing digital Marcelo Vitorino destaca que é possível amenizar o problema com algumas medidas. “As fake news já estão moldando a nossa realidade e afetando a sociedade de forma negativa. Uma ação importante para combater isso seria exigir o CPF na hora da criação de perfis nas redes sociais. Dessa forma, seria possível saber quem e por qual motivo está criando as informações falsas. O documento deveria ser exigido pelas empresas, como o Facebook, por exemplo”, afirmou.

A quantidade de pessoas influenciadas por notícias falsas cria uma realidade que nunca existiu, mas acaba moldando os conceitos e ações da população. O cenário remete ao apresentado no filme Matrix, em que a população é levada a acreditar em uma realidade criada virtualmente. Essa manobra pode ser usada para prejudicar políticos, instituições e empresas. Mas também pode ocorrer o contrário, colocando em dúvida condenações, distorcendo fatos e investigações contra agentes públicos e candidatos.

“Censura”

O assunto entrou em debate depois que a Rússia foi acusada pelo serviço secreto dos Estados Unidos de influenciar nas eleições norte-americanas. Quando a polêmica chegou ao Brasil, o tema acabou incluído na reforma política por meio de um projeto do deputado Aureo Lídio (SD-RJ). No entanto, os itens apresentados por ele foram vetados pelo presidente Michel Temer após causarem polêmica e serem alvo de acusações de censura. O parlamentar afirma que o debate terá de ser retomado em breve, mas admite que teria feito alterações no texto que apresentou, se tivesse a oportunidade. “O debate sobre o assunto foi bastante acalorado, mas acabou interpretado de uma forma diferente, como se fosse censura. Eu nunca criaria um projeto para censurar ninguém. Esse debate tem que ser feito, pois é um problema mundial. Mas se eu fosse apresentar a proposta hoje, cortaria a parte que obriga o Facebook a remover conteúdos denunciados e daria essa tarefa ao Poder Judiciário, com prazo para a retirada de conteúdos falsos ou ofensivos”, destacou.

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) analisa mudanças nas regras das eleições para combater práticas abusivas. Os maiores problemas são boatos que se espalham pela internet, o uso de robôs para difundir informações inverídicas e posts patrocinados. Como o assunto ainda é recente, a advogada Ângela Cignachi destaca que a Justiça ainda tem muitas dificuldades de identificar e combater a prática “Nós temos mais dúvidas do que respostas. A Justiça Eleitoral tem investido no assunto, fazendo parcerias para conseguir combater na medida do possível. Evitar eu acho difícil, mas pelo menos podemos tentar controlar essa disseminação a tempo e tentar reprimir”, disse.