O Estado de São Paulo, n. 45297, 24/10/2017. Política, p. A6.

 

Lava Jato em Curitiba tem ações até o fim de 2018

Ricardo Brandt / Julia Affonso

24/10/2017

 

 

Moro ainda precisa julgar mais ações do que o total já finalizado em 3 anos e meio

 

 

Embora já tenha declarado publicamente em mais de uma ocasião que a Operação Lava Jato “caminha para o final” em Curitiba, o juiz titular da 13.ª Vara Federal Criminal da capital paranaense, Sérgio Moro, não deve encerrar os trabalhos antes do fim de 2018. A eleição do próximo ano, quando serão escolhidos presidente, governadores, senadores e deputados, portanto, será a primeira a ocorrer sob influência direta de prisões, indiciamentos e condenações de políticos – em outubro de 2014, as investigações não haviam atingido esse núcleo do esquema de corrupção.

Em mais de três anos e meio atuando exclusivamente nos casos relacionados à Lava Jato, Moro já julgou 35 processos. Nesse período, condenou 109 pessoas. Entre elas estão o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (9 anos e 6 meses de prisão), os ex-ministros Antonio Palocci (12 anos e 2 meses) e José Dirceu (32 anos) e o empresário Marcelo Odebrecht (29 anos e 4 meses).

No momento em que a operação chega à sua 46.ª fase, deflagrada na sexta-feira passada, Moro ainda tem pela frente 44 processos penais abertos relativos a crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa em negócios da Petrobrás.

Um deles, que está em fase inicial, é o que trata de suposta prática de corrupção e lavagem de dinheiro no caso das obras do sítio de Atibaia, no interior de São Paulo – que a força-tarefa diz que é de Lula, mas ele nega. A ação deve ser julgada – se não houver imprevistos – em meados de 2018, às vésperas das eleições de outubro.

Lula, que recorre da primeira condenação ao Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF4), se declara candidato do PT.

As investigações já desnudaram esquemas de loteamento de cargos, corrupção, desvios de dinheiro e superfaturamento de contratos da Petrobrás durante os governos Lula (20032010) e Dilma Rousseff (20112016). Foram constatados desvios de mais de R$ 40 bilhões da estatal para compra de apoio político, financiamento de campanhas e enriquecimento ilícito. Agora, a investigação se volta para líderes do PMDB e do PSDB nos processos que envolvem alvos com foro privilegiado, em fase inicial no Supremo Tribunal Federal (STF).

“Em Curitiba a investigação sempre foi sobre os contratos da Petrobrás que geraram valores e as pessoas que pagavam ( propinas). Grande parte já foi processada. As que recebiam e não tinham foro privilegiado, igualmente. Daí a minha afirmação de que acredito que está indo para o final em Curitiba”, afirmou Moro no dia 2 deste mês, em São Paulo. “Ainda há investigações e casos relevantes em andamento”, afirmou.

 

Abertas. Além das ações penais já em instrução, outras serão abertas em 2018 por Moro decorrentes de investigações ainda não encerradas pelo Ministério Público Federal. Responsáveis pelas acusações criminais apresentadas a Moro, os 13 procuradores da Lava Jato de Curitiba continuarão a trabalhar em esquema de força-tarefa até setembro de 2018 – quando vence o prazo aprovado em agosto pelo Conselho Superior do Ministério Público Federal.

“As penas totalizam mais de 1,7 mil anos de prisão. É expressivo o montante de pena totalizado nesses três anos de operação e, talvez, esse fator denote a importância de que a investigação e os processos se deem em primeira instância, em condições nas quais o Estado pode melhor responder”, afirmou o procurador Roberson Pozzobon, integrante da força-tarefa de Curitiba.

Para o procurador da República Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa, o interesse público nas investigações deve continuar mesmo na fase posterior às investigações, para que não se repita o que aconteceu na Itália, na Operação Mãos Limpas, onde foi baixo o índice de punições efetivas aos réus.

“O momento em que vivemos se aproxima muito de um ponto-chave no destino das duas operações. Depois de alguns anos de Mãos Limpas, as investigações estavam se encerrando, embora vários processos ainda estivessem começando. A diferença entre o tempo da mídia e o tempo dos processos judiciais ficou bastante perceptível. A população começou a se cansar da sequência de escândalos”, afirmou Dallagnol.

“Nessa mesma época, as investigações já haviam alcançado políticos importantes de todos os partidos, que se uniram para atacar os investigadores”, disse o coordenador da força-tarefa.

 

Operação. O juiz federal Sérgio Moro é o responsável pela Lava Jato em Curitiba

 

Comparação

"O momento em que vivemos se aproxima muito de um ponto-chave no destino das duas operações. (...) Houve uma diminuição do interesse da sociedade italiana  pela operação".

Deltan Dallagnol

PROCURADOR DA LAVA JATO

________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Após depoimento tenso, Cabral vai para presídio federal 

Constança Rezende

24/10/2017

 

 

Pedido é feito pelo Ministério Público Federal depois de o ex-governador discutir com juiz Marcelo Bretas

 

 

Após um depoimento tenso, o juiz da 7.ª Vara Federal Criminal, Marcelo Bretas, determinou a transferência do ex-governador do Rio Sérgio Cabral (PMDB) para um presídio federal. A decisão foi tomada ontem a pedido do procurador Sergio Pinel, em nome do Ministério Público Federal.

O depoimento de Cabral a Bretas teve até discussão. Bretas chegou a suspender por cinco minutos a oitiva, tamanha a tensão entre os dois. A decisão de transferir o ex-governador foi tomada logo após Cabral insinuar que Bretas tentava se promover com seu processo. “Eu estou sendo injustiçado. O senhor está encontrando em mim uma possibilidade de gerar uma projeção pessoal, me fazendo um calvário”, disse Cabral.

Bretas perguntou ao advogado de Cabral se a orientação de fazer essas declarações contra o juiz teriam partido da defesa. O advogado negou, dizendo que a pergunta era uma ofensa.

No depoimento, Cabral disse que Bretas tem parentes que vendem bijuterias. A afirmação ocorreu quando o ex-governador justificava as compras de joias feitas por ele e pela mulher, Adriana Ancelmo, na H.Stern supostamente com dinheiro oriundo de corrupção. A informação, porém, não é sigilosa e já foram veiculadas reportagens sobre o fato de parentes de Bretas terem uma loja de adereços no Saara, no centro do Rio.

Bretas disse que a declaração de Cabral poderia até ser subentendida como uma ameaça. “É no mínimo suspeito e inusitado o acusado, que não só responde a este processo como outros, venha aqui trazer em juízo informações sobre a rotina da família do magistrado”, disse o juiz.

Já Pinel declarou que o MPF achou muito grave que Cabral tenha obtido na prisão informações sobre a vida da família do magistrado. “A prisão não tem sido suficiente para afastar o réu de informações de fora da cadeia. Não sei como ele chegou a essa informação, mas foi indevida. O preso está na cadeia justamente para se afastar do convívio da sociedade, não ter informações das testemunhas e dos atores do processo, como, por exemplo, o magistrado.”

 

‘Arbitrário’. O advogado Rodrigo Roca considerou arbitrária a decisão de transferência. “É evidente que ele ( Bretas) esticou muito o conceito do que pode ser entendido como ameaça. Não teve ameaça. Se tivesse tido alguma ameaça, o magistrado teria tomado alguma atitude que não essa. Ele ( Cabral) é vigiado no presídio 24 horas, com cerca de 30 câmeras. Os presos entram e saem e levam informações que querem”, afirmou.

Ainda não foi escolhida a prisão para onde Cabral será transferido – ele está detido na Cadeia Pública José Frederico Marques, na zona norte do Rio.