O Estado de São Paulo, n. 45292, 19/10/2017. Política, p. A8.

 

Tucanos cobram saída de Aécio do comando do PSDB

 Julia Lindner / Renan Truffi / Thiago Faria

19/10/2017

 

 

No dia seguinte à decisão do Senado, presidente interino do PSDB diz que mineiro não tem condições de continuar à frente da sigla

 

 

Aécio Neves (PSDB-MG) voltou ontem ao Senado após 21 dias de afastamento e recolhimento noturno determinados pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) e, em discurso, disse não guardar “rancor ou ódio”. Em seu partido, apesar da vitória do tucano com a derrubada da decisão da Corte, cresce a pressão para que ele deixe a presidência nacional da sigla, da qual se licenciou desde maio após vir à tona o caso J&F.

O senador atacou o Ministério Público Federal e fez críticas aos irmãos Joesley e Wesley Batista, donos do Grupo J&F. Aécio afirmou ser vítima de uma armação “ardilosa” e “criminosa”, preparada por “empresários inescrupulosos” e por “homens de Estado”. O presidente interino do PSDB, Tasso Jereissati (CE), porém, defendeu ontem a renúncia do mineiro do comando do partido.

“Eu acho que é ( caso de renúncia). Agora ele não tem condições, dentro das circunstâncias que está, de ficar como presidente do partido. E nós precisamos ter uma solução definitiva e não provisória”, afirmou Tasso, em declaração que surpreendeu alguns tucanos.

O senador mineiro evitou polemizar. “Não trato de questões partidárias pela imprensa”, disse. Aécio está afastado da presidência do partido desde maio, após divulgação da delação da J&F, que o implica diretamente. Em conversa gravada por Joesley, o tucano pede R$ 2 milhões. Ele nega que o dinheiro seja propina e alega que foi um pedido de empréstimo para pagar sua defesa na Operação Lava Jato.

Um eventual afastamento definitivo de Aécio do comando do PSDB abre espaço para uma mudança de postura do partido em relação ao governo Michel Temer. Mesmo afastado, Aécio continuou a ter influência na legenda e foi um dos principais fiadores da manutenção do PSDB na base aliada. Já Tasso defende publicamente a ruptura com o governo, tese defendida pela ala mais jovem do partido, chamada de “cabeças pretas”. O PSDB comanda quatro ministérios (Cidades, Relações Exteriores, Secretaria de Governo e Direitos Humanos).

A posição do presidente interino da sigla foi ratificada pelo vice-presidente do Senado, Cássio Cunha Lima (PSDB-PB). “É um ato unilateral, mas existe um sentimento no partido de que ele deve formalizar a saída. Isso é inegável. Acho que a manifestação pública que eu fiz e o senador Tasso fez vai ter algum efeito na reflexão ( de Aécio Neves), mas isso não retira o caráter unilateral da decisão”, afirmou o senador.

O resultado da votação de anteontem foi apertado. Foram 44 votos a favor do tucano, que precisava de ao menos 41 para reverter a decisão do STF e retomar o mandato, além de derrubar a imposição do recolhimento noturno, da qual também era alvo. Aécio contou com apoio do partido. Dez dos 12 senadores da sigla votaram a favor. Somente o senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES), que estava viajando, não votou.

 

Reunião. Ontem à noite, a bancada do PSDB se reuniu para conversar com Aécio sobre o assunto. Participaram nove dos 12 senadores tucanos. De acordo com alguns presentes, Aécio foi “enquadrado” para que encontre uma saída da presidência da sigla. A ideia é que ele ganhe tempo suficiente para que a polêmica diminua e, assim, encontre um caminho para se afastar da presidência de forma satisfatória tanto para ele quanto para a legenda.

Na saída da reunião, Tasso disse que o partido vai aguardar que o próprio Aécio tome a decisão. “Fizemos uma avaliação profunda dos últimos acontecimentos e sobre o futuro próximo do partido e que rumos o partido deve tomar nos próximos dias. A decisão final sobre qualquer medida que venha a ser tomada para essa definição ficará a critério do senador Aécio Neves, que vai fazer uma avaliação política e pessoal sobre todas essas questões que foram colocadas por todos os senadores e vai, em cima dessa sua avaliação, tomar uma decisão. E nós vamos aguardar.”

Tasso não quis colocar um prazo para Aécio anunciar sua decisão, mas disse que isso deve acontecer na próxima semana. “Acho que nós vivemos um momento muito delicado e esse momento exige uma definição, qualquer que seja, definitiva. Não podemos mais ficar em situações provisórias, mesmo com o curto prazo quando nós vamos ter eleição em dezembro”, defendeu.

Aécio deixou a reunião antes do fim e se recusou a falar com a imprensa. “Ele saiu mais cedo porque tinha que viajar”, justificou Tasso. Apesar de pregar a renúncia de Aécio do comando tucano, o senador cearense defendeu a votação que derrubou as medidas cautelares. Tasso considera, porém, que a decisão foi mal interpretada.

Para ele, apesar de poder retomar o mandato, os problemas de Aécio não acabaram, uma vez que ele terá que enfrentar o Conselho de Ética no Senado, além das investigações no STF.

 

Denúncia. Ontem, a Executiva Nacional do PSDB negou, em nota, que os votos a favor de Aécio tenham sido fruto de acordo relacionado à votação da denúncia contra Temer na Câmara.

 

De volta. O senador Aécio Neves (PSDB-MG) retorna às suas funções de parlamentar

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Cassado pelo Senado, Delcídio diz que foi ‘boi de piranha’

Samantha Klein / Leonardo Augusto

19/10/2017

 

 

Ex-senador afirma que ‘acrobacias jurídicas’ livraram Aécio; Para Lula, tucano “plantou ódio” e “colhe tempestade”

 

 

Cassado por unanimidade no ano passado, o ex-senador Delcídio Amaral (sem partido-MS) criticou ontem a decisão na qual o Senado autorizou o senador Aécio Neves (PSDB-MG) a retomar o mandato e derrubou o recolhimento noturno que havia sido imposto pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

Para Delcídio, enquanto “há provas de que Aécio é culpado”, ele foi julgado de forma injusta. “Infelizmente, acrobacias jurídicas livraram a cara do Aécio Neves. O caso dele é gravíssimo, envolvendo malas de dinheiro e pedido de empréstimo de R$ 2 milhões a um empresário. No meu caso, nem uma perícia dos áudios foi realizada. Não pude me defender”, disse o senador cassado à Rádio Guaíba, de Porto Alegre.

“Eles quiseram entregar um boi para as piranhas, pois o restante da boiada passaria. Agora com Aécio, não tiveram o mesmo entendimento e acharam que sobraria para todo mundo. Por isso o livraram”, afirmou.

Em 2015, quando era senador pelo PT, Delcídio foi preso em flagrante sob acusação de tentar evitar que o ex-diretor da Petrobrás Nestor Cerveró fizesse delação premiada. O Senado votou pela manutenção da prisão determinada pelo STF e cassou o mandato do ex-petista.

 

Lula. Às vésperas de iniciar uma caravana por Minas Gerais, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que Aécio “plantou ódio e está colhendo tempestade”. Em entrevista à Rádio Super Notícia, de Belo Horizonte, Lula disse que nas campanhas em que saiu derrotado não vendeu “ódio como o Aécio vendeu quando perdeu para a Dilma ( Rousseff, em 2014)”. “Vendi paz e amor”.

O ex-presidente voltou a afirmar que vai ser candidato novamente ao Palácio do Planalto no ano que vem “só porque não querem”, mas disse que está “nu” diante das investigações das quais é alvo no âmbito da Operação Lava Jato.

Lula disse ser vítima de um “pacto maquiavélico” entre Polícia Federal, o Ministério Público, Poder Judiciário e a imprensa para tirá-lo da disputa de 2018. O ex-presidente disse estar hoje, politicamente, igual ou melhor do que antes. “Quem está pior é o pessoal da Lava Jato, que contou mentira a meu respeito”, disse. Segundo Lula, o juiz Sérgio Moro “está me julgando e está me condenando por coisa que ele próprio diz que eu não fiz”. 

 

Unanimidade. Mandato de Delcídio foi cassado em 2016

 

Diferença

“Eles ( senadores) quiseram entregar um boi para as piranhas, pois o restante da boiada passaria. Agora, com Aécio, não tiveram o mesmo entendimento e acharam que sobraria para todo mundo. Por isso o livraram”.

Delcídio Amaral

SENADOR CASSADO (SEM PARTIDO-MS)