Valor econômico, v. 17, n. 4363, 18/10/2017. Brasil, p. A5.

 

 

Repasse da Lei Kandir pode ser atrelado a investimento

Fabio Graner

18/10/2017

 

 

O relator da comissão especial que discute regulamentar as compensações da Lei Kandir, senador Wellington Fagundes (PR-MT) disse ao Valor que considera a possibilidade de vincular eventuais aumentos nos repasses da União a investimentos em infraestrutura. A ideia está em uma versão preliminar de relatório, em fase de elaboração, a partir das discussões com o governo federal e com os Estados.

"É um assunto que estamos estudando. É uma possibilidade que estamos considerando porque poderia até ter mais apoio do governo federal", disse Fagundes. "Qualquer Estado precisa de infraestrutura, estradas, ferrovias, principalmente nas novas fronteiras agrícolas", disse o parlamentar. Anteontem, ele voltou a discutir a questão dos ressarcimentos da lei Kandir em audiência pública da comissão mista, realizada na assembleia legislativa do Rio Grande do Sul.

Por determinação do Supremo Tribunal Federal (STF), o Congresso precisa regulamentar os critérios e as regras de compensação relativas à desoneração das exportações estabelecida nos anos 90 pela Lei Kandir. Todo ano, o tema enseja disputa entre os Estados e o governo federal sobre o volume de repasses que a União deve fazer. Já houve anos em que sequer houve pagamentos pela União.

Fagundes diz buscar a construção de um texto que consiga alinhar as demandas dos Estados e a restrição fiscal da União, que se tornou mais grave nos últimos anos. O senador afirma que não quer ter um texto que, caso seja aprovado no Congresso, venha a ser vetado pelo Executivo e, no limite, judicializado, mantendo o problema sem solução.

O problema é que não há ainda qualquer sinal de acordo entre as partes. O ministério da Fazenda sinaliza concordar em colocar na lei um repasse próximo de R$ 4 bilhões por ano, que na prática é o que tem acontecido nos últimos anos. Fagundes considera uma evolução que a equipe econômica já aceite que o repasse seja impositivo. Os Estados, por sua vez, apontam que os repasses devidos seriam da ordem de R$ 40 bilhões anuais, valor considerado inviável pela Fazenda federal.

Nesse ambiente, o senador considera a possibilidade de colocar no seu relatório, previsto para ficar pronto até o fim deste mês, que os repasses da União aos Estados tenham crescimento gradual ao longo do tempo, à medida que diminua a restrição fiscal do país. E quer atrelar este aumento aos investimentos na infraestrutura, de forma que os recursos não banquem elevação de despesas de custeio e obrigatórias. Fagundes ressalta que ainda não tem decisão final tomada, o que depende de uma série de reuniões sobre o tema nas próximas semanas.

O prazo para o Congresso deliberar termina no próximo mês. Após a votação do relatório na comissão especial, a discussão passará pelos plenários da Câmara e do Senado. Se o Congresso não resolver, o STF determinou que o Tribunal de Contas da União (TCU) estabeleça os critérios e os valores de repasses para os Estados, o que, de acordo com o senador, pode levar mais de um ano para ocorrer, empurrando uma solução para 2019.

A discussão sobre a lei Kandir inclui outro aspecto com poucas chances de prosperar: a regularização do passado. Os Estados alegam que têm cerca de R$ 500 bilhões a receber da União, que não reconhece a dívida e não aceita sequer discutir o tema. Os governos regionais gostariam de fazer um "encontro de contas", abatendo esse suposto crédito da dívida que têm com a União. Fagundes reconhece que há muita dificuldade de avançar nesse ponto e avalia apenas a possibilidade de colocar na lei um comando que obrigue as duas partes a negociarem uma solução sobre o passado.

O senador avalia também que não cabe nesse contexto discutir uma tributação sobre exportação dos produtos básicos, para recompor a base de arrecadação dos Estados e fomentar a exportação de produtos mais elaborados. Para ele, a discussão é válida, mas deve ser feita no âmbito da reforma tributária e não nesse projeto.

Fagundes ponderou ainda que uma tributação sobre exportações de básicos pode afetar a competitividade desses produtos e prejudicar os produtores brasileiros, que investem em tecnologia para aumentar sua produtividade.