Valor econômico, v. 18, n. 4368, 25/10/2017. Política, p. A8.

 

 

Moro afirma que corrupção não será solucionada apenas pela via judicial

André Guilherme Vieira

25/10/2017

 

 

O juiz federal titular da Operação Lava-Jato no Paraná, Sergio Moro, afirmou ontem que a corrupção no Brasil não será solucionada apenas pela via judicial. O magistrado considerou que são necessárias reformas para diminuir a incidência de crimes e os desvios de recursos públicos.

"São necessárias reformas para diminuir incentivos e oportunidades [para os crimes]. Não falo isso como bandeira política, mas como cidadão", afirmou. Para Sergio Moro, a "grande questão" a partir de agora é saber "como ir adiante". Segundo o magistrado, "já há efeitos colaterais positivos, como naqueles grandes ajustes em contratos com empreiteiras com a Petrobras, por exemplo. Existia uma relação de confiança que acabou", disse.

O juiz federal também manifestou esperança de que, no longo prazo, ocorra o "amadurecimento da nossa democracia e do governo de leis do Brasil".

Moro participou de seminário em São Paulo organizado pelo jornal "O Estado de São Paulo" com a presença do procurador da República Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa da Lava-Jato em Curitiba, e dos juízes italianos Piercamillo Davigo e Gherardo Colombo - que integraram a Operação Mãos Limpas na Itália, na década de 90. A investigação italiana de combate à corrupção foi fonte de inspiração para o juiz Sergio Moro.

Dallagnol também afirmou que a Operação Lava-Jato, por si só, não será capaz de provocar mudanças. Em entrevista coletiva, o procurador da República afirmou haver um movimento encabeçado por "entidades da sociedade civil" que buscam a aprovação de um novo pacote anticorrupção no Congresso e a renovação dos parlamentares que ocupam o Legislativo.

"Esse pacote anticorrupção aproveita grande parte das 10 medidas anticorrupção [propostas pelo MPF no ano passado e não aprovadas pelo Legislativo] e vai além, promovendo regras que melhoram a transparência, as licitações, o sistema eleitoral e assim por diante", disse.

Segundo Dallagnol, a ideia é que " essas mesmas entidades estejam à frente de uma campanha que possa incentivar a sociedade a votar em pessoas que tenham passado limpo, que comunguem de valores democráticos e que tenham compromisso de apoio a esse pacote anticorrupção", explicou. Dallagnol, no entanto, esquivou-se de relacionar quais entidades integram o movimento. "Eu prefiro deixar para essas entidades trazerem isso a público".

Durante o evento, Dallagnol foi indagado sobre a forma como foi conduzida a negociação das delações premiadas dos sócios e executivos da J&F e afirmou ter ressalvas ao acordo. As delações garantiram imunidade aos irmãos Joesley e Wesley Batista, que agora são acusados de omitir informações dos investigadores e estão presos preventivamente por suposta prática de uso indevido de informação privilegiada - ambos respondem à ação penal pelo delito na Justiça Criminal Federal de São Paulo.

"Neste caso algumas coisas deveriam ter sido melhores. É só comparar com o processo de delação da Odebrecht, que teve mais de 50 reuniões, foi mais longo e mais discutido. Vou me abster de críticas, embora tenha algumas ressalvas ao modo como foi negociado", afirmou.