Correio braziliense, n. 19927, 13/12/2017. Economia, p.7

 

Até 2,5 milhões terão restituição da poupança

Hamilton Ferrari

13/12/2017

 

 

CONJUNTURA » Acordo entre bancos e poupadores encerra quase 30 anos de disputa na Justiça em torno de prejuízos provocados por planos econômicos. Cerca de 60% das pessoas tem R$ 5 mil a receber e serão ressarcidas de uma só vez. Texto precisa ser homologado pelo STF

Depois de quase 30 anos de impasse judicial, titulares de depósitos em cadernetas de poupança poderão receber parte do dinheiro perdido nas décadas de 1980 e 1990 com os planos econômicos implementados na época. Entre 2 milhões  e 2,5 milhões de pessoas devem ser beneficiadas com o acordo entre bancos e entidades representativas dos poupadores, que devolverá até R$ 12 bilhões às contas dos prejudicados. O texto foi enviado ontem ao Supremo Tribunal Federal (STF). Caso a Corte homologue o documento, 60% dos alcançados pelo acordo, ou até R$ 1,5 milhão de depositantes, terão o problema judicial e financeiro solucionado já na primeira parcela de pagamento.

O trato envolve três planos econômicos — Bresser (1987), Verão (1989) e Collor II (1991). O Collor I (1990) foi deixado de fora porque já há um entendimento jurídico na Corte. Como mostrou o Correio há mais de uma semana, os mais velhos terão preferência na fila. O cronograma de adesão vai ser dividido em lotes de acordo com a data de nascimento dos interessados. Ao todo, serão 11 grupos. As pessoas que iniciaram as ações em 2016 vão ficar de fora da agenda por idade.

Como muitos dos beneficiados já morreram, os herdeiros poderão receber o montante devido. Apesar disso, só terá direito ao ressarcimento aqueles que estão com processo em tramitação na Justiça, em ações coletivas ou individuais. A informação também foi antecipada pelo Correio. Os cinco maiores bancos do país aderiram ao acordo — Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Itaú, Bradesco e Santander. Outras instituições financeiras podem pedir adesão em até 90 dias.

O acordo prevê o pagamento das restituições em até cinco parcelas. Aqueles que têm direito a receber até R$ 5 mil terão o total devolvido na primeira prestação. Cerca de 60% das pessoas com ações na Justiça entram nesse critério, ou seja, receberão tudo de uma vez. Quem tem mais do que esse montante a receber será contemplado com parte do total na primeira parcela, mas terá divisão diferenciada de acordo com o volume de recursos. Os créditos serão feitos semestralmente, com a correção da inflação.

O acerto foi firmado entre a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) e a Federação Brasileira dos Poupadores (Febrapo). As negociações duraram mais de 13 meses sob a coordenação da Advocacia-Geral da União (AGU). Também participaram o Banco Central e o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec).

Cabe, agora, ao STF decidir se aprova ou não o trato final. A expectativa da AGU é de que o texto seja homologado ainda neste ano pelos ministros. Se aceito, os poupadores prejudicados precisam decidir se aceitam ou não o acordo. O Idec aconselha as pessoas a aguardarem a decisão do STF e a conversarem com os advogados encarregados do caso. A adesão será feita por meio de um sistema eletrônico a ser criado pelas partes envolvidas no processo.

O poupador ou herdeiros devem comprovar que mantêm uma ação judicial em tramitação e que tinham saldo na conta de poupança na época, através da cópia de extratos bancários ou da declaração do Imposto de Renda.

Quem já perdeu a ação judicial precisa ver se é possível entrar com recurso para se beneficiar do acordo. Os herdeiros precisam levar dados cadastrais do falecido e do advogado, como nome completo, RG, CPF, data de nascimento, inscrição na OAB, telefone e e-mail. Todos os honorários judiciais serão pagos pelos bancos, que são os réus das ações. No caso de casas bancárias que foram absorvidas por outras instituições financeiras, a responsabilidade pelos pagamentos é da empresa incorporadora.

Página virada

O acerto pode pôr fim a um dos maiores imbróglios financeiros do país. Cerca de 1,2 milhão de processos tramitam no STF sobre as perdas na poupança decorrentes dos planos econômicos. A intenção da AGU é de que a Corte aceite o acordo ainda neste ano para que os pagamentos sejam efetuados no primeiro semestre de 2018.

A ministra da Advocacia-Geral da União (AGU), Grace Mendonça, disse que “as negociações encerraram a primeira fase de um processo que busca virar uma página importante na história do país”. “Esse capítulo da hiperinflação (da época), que tinha ficado em aberto, ficou para trás, e o acordo coloca um termo final nisso”, frisou. Ela lembrou ainda que o entendimento vai contribuir “para a redução do volume de processos no Judiciário”.

O presidente da Febraban, Murilo Portugal, disse que o acordo beneficia tanto os poupadores quanto as instituições financeiras. “Para os bancos, o principal benefício é a possibilidade de eliminar um risco potencial grave que estas demandas geravam, ao encerrar, por transação judicial, as ações civis públicas. Este é um importante risco sistêmico potencial que pode vir a ser eliminado com a homologação e implementação deste acordo”, apontou. O presidente da Febrapo, Estevan Pegoraro, elogiou o papel da AGU na conciliação.