O Estado de São Paulo, n. 45285, 12/10/2017. Economia, p.B3

 

 

 

 

 

Sem MPs, governo terá dificuldade de cumprir meta fiscal

Atraso na aprovação de medidas provisórias exigirá novas ações da equipe econômica para que o déficit de 2018 não supere os R$ 159 bi

Por: Eduardo Rodrigues / Adriana Fernandes / Lorenna Rodrigues

 

Eduardo Rodrigues

Adriana Fernandes

Lorenna Rodrigues / BRASÍLIA

 

A ameaça do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), de não colocar mais em pauta no plenário da Casa medidas provisórias do governo Michel Temer coloca em risco uma série de ações já anunciadas pela equipe econômica. Somadas, elas teriam um efeito fiscal positivo de R$ 17,3 bilhões em 2018, segundo levantamento do ‘Estadão/Broadcast’. Foram consideradas nesse cálculo medidas para aumentar a arrecadação e para reduzir despesas.

A declaração de Maia é um problema para o governo porque as Medidas Provisórias têm efeito imediato. Elas começam a valer assim que são publicadas pelo Poder Executivo e só depois são analisadas pelo Congresso. O outro mecanismo legal que pode ser usado pelo governo são os Projetos de Lei, mas a tramitação deles é bem mais desgastante: precisam ser aprovados na Câmara e no Senado e só passam a valer depois que são sancionados pelo presidente.

Medidas Provisórias que tratam de aumento de tributos ou de corte de despesas, por exemplo, podem ter impacto imedia- to no caixa da União. O atraso na aprovação dessas MPs, caso Maia cumpra sua ameaça, pode exigir medidas adicionais além das que foram anunciadas para evitar o descumprimento da meta fiscal do ano que vem, que permite déficit de até R$ 159 bilhões, afirmam fontes da área econômica.

Além do risco para as contas públicas, travar a votação das MPs deixa em suspenso o programa de financiamento estudantil (Fies), a possibilidade de o governo firmar acordos de leniência com bancos e a ampliação de investimentos no setor de petróleo ( leia mais na pág. B4).

O desabafo feito por Maia nesta semana sobre a forma como o atual governo exagera no envio de MPs ao Congresso ocorreu antes mesmo de o Planalto enviar um pacote de medidas provisórias que teriam o maior impacto para as contas públicas no próximo ano. As propostas Henrique Meirelles de aumento de receita foram antecipadas pelo governo em agosto, mas, quase dois meses depois, o pacote não foi encaminhado ao Congresso para não prejudicar as negociações que tentam barrar a segunda denúncia contra Temer na Câmara.

Segundo uma fonte da equipe econômica, quanto mais tempo o governo adia o envio das medidas, maior é a perda de receitas em relação ao que foi estimado. Apenas a tributação de fundos de investimentos exclusivos tem o objetivo de gerar receitas extras de R$ 6 bilhões no próximo ano. A medida provisória com o tema está pronta – mas ainda não foi enviada – e tem de ser aprovada até o fim do ano para entrar em vigor em 2018.

Entre as MPs que já tramitam no Congresso, e portanto já estão em vigor, o efeito fiscal para 2018 é menor, mas não desprezível. A medida provisória que cria o Programa de Desligamento Voluntário (PDV) do Governo Federal, pode trazer uma economia de R$ 1 bilhão no próximo ano.

O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, disse ontem que o governo está analisando essas questões. “Já há discussão de permitir cada vez menos MPs. Vamos levar em conta essa manifestação do presidente da Câmara, muito relevante.”

 

Em estudo

“Esperamos até a próxima semana ter uma estratégia bem definida para isso e ver qual seria o curso da apresentação de projetos de lei, se for o caso.”

MINISTRO DA FAZENDA

 

 

 

 

 

Temer tenta negociar trégua com Maia com ajuda de Imbassahy

Câmara vai apresentar projeto em regime de urgência para substituir medida provisória da leniência dos bancos
Por: Vera Rosa / Isadora Peron

 

AMEAÇA DE MAIA DE IGNORAR MPS PÕE EM RISCO R$ 17 BILHÕES

 

Congresso. Impacto fiscal considera medidas provisórias para aumentar a arrecadação e para reduzir despesas; declarações do presidente da Câmara, Rodrigo Maia, foram feitas antes mesmo de o governo enviar o pacote de medidas anunciado em agosto

 

Vera Rosa

Isadora Peron / BRASÍLIA

 

A ameaça do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), de não mais pautar medidas provisórias do governo Michel Temer no plenário coloca em risco ações já anunciadas que teriam efeito fiscal positivo de R$ 17,375 bilhões em 2018. O levantamento leva em conta medidas para aumentar a arrecadação e reduzir despesas. O atraso das votações pode exigir medidas adicionais para evitar o descumprimento da meta fiscal.

Preocupado com mais uma rebelião na base aliada, o presidente Michel Temer escalou ontem o ministro da Secretaria de Governo, Antonio Imbassahy, para conversar com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e conter a nova crise. Às vésperas da votação da segunda denúncia contra Temer pela Câmara, o Planalto tenta de toda forma apaziguar a desgastada relação com Maia.

Depois que a própria base boicotou a votação da medida provisória que regulamenta os acordos de leniência do Banco Central, tirando Maia do sério, a saída política encontrada para desfazer o mal-estar com o presidente da Câmara foi a confecção de um projeto de lei. A proposta vai recuperar os principais pontos da MP e será apresentada nos próximos dias pela Câmara, em regime de urgência, jogando os holofotes sobre Maia.

A intenção do governo é prestigiar o deputado, que nos últimos dias não tem escondido a contrariedade com Temer. Na terça-feira, por exemplo, Maia disse estar cansado da “falta de respeito” do Planalto e anunciou que não mais aceitará medidas provisórias até que o Congresso analise a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que regulamenta a tramitação de matérias desse tipo.

A escalada de tensão fez com que Temer enviasse Imbassahy para dialogar com Maia, de quem o ministro é amigo. O governo também se comprometeu com ele a reduzir o número de medidas provisórias.

 

Romaria. Mesmo assim, descontentes com o Planalto, deputados aliados transformaram ontem a residência oficial da presidência da Câmara em um “muro de lamentações”. Com a segunda denúncia sendo analisada pela Casa, diversos parlamentares têm procurado Maia para se queixar do governo.

Integrantes de partidos do chamado Centrão, especialmente do PR, PP e PSD, dizem que Temer não cumpriu todos os acordos feitos durante a tramitação da primeira denúncia. Cobram a liberação de mais emendas e a saída do tucano Imbassahy da articulação política. Para o Centrão, o PSDB não pode ocupar quatro ministérios após ter rachado e demonstrado infidelidade ao presidente na votação da primeira denúncia, em 2 de agosto.

O PR, agora, começou a dar sinais mais evidentes de rebeldia. O partido trocou um dos seus integrantes na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Giovani Cherini (PRRS) deixou a vaga, que passará a ser ocupada por Alexandre Valle (PR-RJ).

Embora ambos sejam governistas, Valle integra o grupo de parlamentares mais insatisfeitos com o governo. Na prática, a tendência é que a bancada do PR comece a indicar dificuldades para o governo na CCJ. Uma das estratégias é tentar obstruir o andamento dos trabalhos.

“Eu não acredito que haverá instabilidade”, afirmou o líder do governo na Câmara, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB).

Nos bastidores, deputados do PMDB comentam que não há intenção de desembarque de partidos da base, embora todos aproveitem o momento para criar um “clima de caos” e apresentar uma fatura mais alta para a permanência de Temer na Presidência. /COLABOROU DAIENE CARDOSO

 

Narrativa

“Eu não acredito que haverá instabilidade. Os deputados já fizeram o seu juízo, entendendo que há uma narrativa reiterada de criminalização da política como um todo.”

Deputado Aguinaldo Ribeiro

LÍDER DO GOVERNO NA CÂMARA