O Estado de São Paulo, n. 45284, 11/10/2017. Política, p.A6

 

 

 

 

 

 

Maia promete retaliar governo na Câmara

Deputado do DEM e presidente da Casa tenta manter distância do Planalto e diz que não vai colocar para votar nenhuma medida provisória

Por: Isadora Peron / Fabrício de Castro / Vera Rosa

 

Isadora Peron

Fabrício de Castro

Vera Rosa / BRASÍLIA

 

Em um novo capítulo de embate com o governo Michel Temer, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), anunciou ontem que não vai colocar em votação mais nenhuma medida provisória enviada pelo Palácio do Planalto. O episódio tem como pano de fundo as movimentações do parlamentar para guardar distância regulamentar da impopularidade do presidente.

Maia não esconde a irritação com as idas e vindas do Planalto e tenta mostrar marca própria como presidente da Câmara, às vésperas da votação da segunda denúncia contra Temer.

O Planalto evitou entrar na polêmica ontem com o presidente da Câmara. No palácio, a avaliação é de que, nestes momentos, Maia tem tentado se preservar e mostrar sua independência. Para auxiliares do presidente, não há motivo para um novo desgaste.

O presidente da Câmara fez a declaração sobre as MPs ao encerrar a sessão ontem à tarde e impor uma derrota ao governo por não votar a MP 784, que tratava da leniência do Banco Central. Segundo ele, a medida não voltará à pauta da Casa até que seja analisada a proposta de emenda à Constituição (PEC) que regulamenta a tramitação desse tipo de matéria no Congresso Nacional.

 

Meta fiscal. Maia criticou ainda o fato de o Planalto não ter enviado até agora ao Congresso o pacote de medidas para cumprir a meta fiscal de 2018, o que deve acontecer somente após a votação da segunda denúncia no plenário da Casa. E ainda ironizou: “Daqui a pouco vai querer encaminhar ajuste fiscal por MP, por falta de prazo”.

Durante toda a tarde de ontem, o presidente da Câmara insistiu para que o plenário votasse a MP e ignorou os apelos de líderes da base para que a sessão fosse encerrada para que a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) pudesse votar o parecer apresentado sobre a segunda denúncia contra o presidente e os ministros Eliseu Padilha (Casa Civil) e Moreira Franco (Secretaria-Geral da Presidência) por organização criminosa e obstrução da Justiça. Pelo regimento interno, uma comissão não pode realizar uma votação se uma sessão plenária estiver em curso.

Ao anunciar que não colocaria mais a MP em votação, Maia criticou a base e disse que a falta de empenho do governo em aprovar a matéria era um desrespeito ao presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn. “É uma pena ver os esforços do presidente do Banco Central sendo jogados no lixo.”

 

MP 784. Além de tratar do acordo de leniência – espécie de colaboração premiada para empresas – a MP 784 estabelece novas regras de punição a instituições financeiras e instituições do mercado de capitais, reguladas pelo BC e pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM).

Quando foi editada, no início de junho, a MP foi alvo de duras críticas do Ministério Público Federal, que viu na proposta o risco de cerceamento do trabalho do órgão. Após meses de discussões entre BC e MPF, o texto foi alterado e aprovado em comissão mista do Congresso.

Para fontes da área econômica ouvidas pelo Estadão/Broadcast, as críticas do presidente da Câmara ao envio de propostas de ajuste fiscais por meio de medidas provisórias aumentam as incertezas em relação ao Orçamento de 2018.

 

Devolução. O presidente da Câmara também enviou recado ao Planalto. “Se o governo não teve interesse de votar, é porque não tinha urgência para o Executivo”, afirmou. “As próximas MPs editadas, se não tiverem relevância e urgência, serão devolvidas ao governo quando chegarem à Câmara.”

Desde que chegou à Presidência, em maio do ano passado, Temer já editou 79 medidas provisórias. Os governos costumam lançar mão desse instrumento porque as MPs tramitam mais rapidamente já que trancam a pauta do Congresso.

“O governo está fazendo tudo errado. Tem de parar de editar MPs, e já falei isso com o Michel algumas vezes”, disse o presidente da Câmara ao Estado. Questionado se a relação entre seu partido, o DEM, e o PMDB de Temer estava pacificada, Maia respondeu: “Não, mas isso não é relevante agora”.

Para um aliado, Maia – primeiro na linha sucessória caso Temer seja afastado – aproveitou o momento para demonstrar a sua insatisfação com a maneira com que ele vem sendo tratado pelo governo e, ao mesmo tempo, fazer um aceno a parlamentares que cobram uma posição de distanciamento do Planalto. / COLABORARAM TÂNIA MONTEIRO E ADRIANA FERNANDES

 

Plenário. Rodrigo Maia comanda Mesa Diretora em sessão na Câmara dos Deputados

 

Insatisfação

“O governo está fazendo tudo errado. Tem de parar de editar MPs, e já falei isso com o Michel (...) Tudo o que falo vocês dizem que é atrito com o governo. Não é isso. Estou insatisfeito com o fato de combinarem uma coisa e depois, na última hora, tirarem o pé.”

Rodrigo Maia (DEM-RJ)

PRESIDENTE DA CÂMARA

 

 

 

Relator arquiva investigação contra peemedebistas

Inquérito se baseava em áudios gravados por Sérgio Machado; em um deles, Jucá fala em ‘estancar essa sangria’
Por: Carla Araújo / Breno Pires

 

Carla Araújo

Breno Pires / BRASÍLIA

 

O ministro do Supremo Tribunal Federal Edson Fachin determinou o arquivamento de inquérito que investigava o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), o senador Renan Calheiros (PMDB-AL), o ex-presidente José Sarney (PMDB-AP) e o ex-diretor da Transpetro Sérgio Machado por supostamente terem atuado para obstruir a Lava Jato.

Fachin atendeu ao pedido do então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, com base em recomendação da Polícia Federal. Em despacho, Fachin ressaltou que “o arquivamento deferido com fundamento na ausência de provas suficientes de prática delitiva não impede a retomada das investigações caso surjam novas evidências”.

 

Gravações. A investigação tinha como base áudios gravados por Machado. Em um dos diálogos, Jucá afirma ser necessário “mudar o governo para estancar essa sangria”. A declaração foi interpretada como uma referência ao avanço da Lava Jato.

As gravações foram tornadas públicas em maio do ano passado e foram determinantes para o afastamento de Jucá do Ministério do Planejamento do governo interino de Michel Temer.

Em outra gravação feita por Machado, Renan, então presidente do Senado, fala sobre a necessidade de regulamentar a delação premiada. Já Sarney diz que uma delação da Odebrecht seria uma “metralhadora .100”.

Em relatório, a PF sustentou que não há como comprovar o cometimento de crimes por parte do ex-presidente e dos senadores. A delegada Graziela Machado da Costa e Silva afirmou ainda que Machado não “merecia” os benefícios da delação premiada porque “a colaboração mostrou-se ineficaz”.

Para Janot, em decorrência das gravações, “sabe-se que os eventuais projetos de lei apresentados sob roupagem de aperfeiçoamento da legislação terão verdadeiramente por fim interromper as investigações de atos praticados por organização criminosa”. No entanto, disse, “tais atos não são penalmente puníveis”.

Ontem, em nota, Renan afirmou que a decisão “foi uma demonstração de que vazamentos mentirosos e delações forçadas não se sobrepõem aos fatos reais”. Advogado de Machado, Antônio Pitombo disse, por meio de nota, que o acordo do ex-presidente Transpetro “é bem mais amplo que os fatos investigados no inquérito que apurou obstrução à Lava Jato”.

 

Decisão. Ontem, Renan se livrou de inquérito e acusação

 

Denúncia rejeitada

A Segunda Turma do STF rejeitou denúncia contra o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) na Lava Jato. Ele era acusado de receber R$ 800 mil em propina. “Nunca cometi ato ilícito”, disse Renan.

 

 

 

 

 

Raquel defende desmembrar caso Geddel

Por: Beatriz Bulla

 

Beatriz Bulla / BRASÍLIA

 

A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, enviou manifestação para o Supremo Tribunal Federal (STF) na qual defende o desmembramento das investigações relacionadas ao exministro Geddel Vieira Lima no caso do “bunker” que guardava o equivalente a R$ 51 milhões. Se o relator do caso, ministro Edson Fachin, decidir na linha apresentada pela procuradora, a apuração sobre o ex-ministro e aliado do presidente Michel Temer deve voltar à Justiça de primeira instância.

Geddel e o advogado Gustavo Ferraz foram presos no dia 8 de setembro na Operação Tesouro Perdido, quando o dinheiro foi achado em um apartamento em Salvador. Cinco dias depois, o juiz Vallisney Oliveira, da 10.ª Vara da Justiça Federal em

Brasília, remeteu as investigações ao Supremo ao identificar a menção ao deputado Lúcio Vieira Lima – o único dos três que tem foro privilegiado. Segundo depoimentos colhidos pela PF, o apartamento onde foram encontradas as malas com dinheiro foi emprestado a Lúcio.

 

Celeridade. A manifestação de Raquel é mantida em sigilo e será analisada por Fachin, que recebeu o parecer anteontem. Na primeira instância, a tendência é de que as investigações tenham desfecho mais rápido do que no STF – tanto pelo procedimento célere em relação à Corte como pelo fato de que os investigadores no primeiro grau já conduziam o caso.

O Ministério Público Federal (MPF) aguarda a decisão para oferecer provável denúncia contra os envolvidos. As defesas também esperam o desmembramento para discutir a estratégia a ser tomada – como eventuais negociações de delação.