Correio braziliense, n. 19924, 10/12/2017. Brasil, p. 7

 

General é afastado do cargo após defender intervenção

Bernardo Bittar 

10/12/2017

 

 

SOCIEDADE » Exército decide deixar Antonio Hamilton Mourão sem função na corporação depois de repetir em palestra a necessidade da volta da ditadura e de criticar o presidente Temer

Em ofício enviado ao presidente Michel Temer e ao ministério da Defesa, o Exército destituiu ontem o general Antonio Hamilton Mourão, defensor da intervenção militar no Brasil, do cargo. Ele era o secretário de Economia e Finanças da corporação e seguiu para a Secretaria-Geral neste sábado. Segundo militares ouvidos pelo Correio, Mourão vai ficar sem função à espera do tempo de ir para a reserva, em março de 2018. Para o lugar dele, o comandante do Exército, Eduardo Villas Bôas, indicou o general Luiz Eduardo Ramos Baptista Pereira.

Em setembro, Mourão foi criticado ao declarar, em nome do Exército, que, “diante da crise enfrentada pelo país, pode haver uma intervenção militar, caso a situação não seja resolvida pelas próprias instituições”. A afirmação foi feita em palestra, no dia 15 daquele mês, na Loja Maçônica Grande Oriente, em Brasília, após o então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, denunciar pela segunda vez o presidente Michel Temer por participação em organização criminosa e obstrução de Justiça.

Embora tenha sido afastado de suas funções, o general vai continuar recebendo salário por ser oficial de carreira. A mudança, no entanto, é vista como uma punição da Força, mais especificamente de Villas Bôas, pelas declarações controversas de Mourão. Desde o caso ocorrido há três meses, uma equipe estudava alternativas discretas para fazer com que Hamilton Mourão perca visibilidade, mas ele só foi retirado do cargo após falar, na última quinta-feira, sobre a possibilidade de atuação das Forças Armadas, caso haja uma situação de “caos” no país.

Ele comentou a situação com uma plateia no Clube do Exército, onde estava a convite do grupo Terrorismo Nunca Mais (Ternuma). A palestra, com o tema “Uma visão daquilo que me cerca”, reuniu críticas aos governos Lula e Dilma Rousseff (ambos do PT) e também a Michel Temer (do PMDB). “Não há dúvida de que atualmente nós estamos vivendo a famosa ‘Sarneyzação’. Nosso atual presidente vai aos trancos e barrancos, buscando se equilibrar, e, mediante o balcão de negócios, chegar ao fim do mandato”, afirmou ele.

Sobre a possibilidade de intervenção, Mourão repetiu o raciocínio que gerou repercussão há três meses, dizendo que a instituição poderia ter o papel de “elemento moderador e pacificador”, agindo “dentro da legalidade”. Segundo ele, o Exército tem como missão defender a pátria e tem a democracia e a paz social como valores supremos. “Se não houver mais um ordenamento correto, as forças institucionais não se entenderem, terá que haver um elemento moderador e pacificador nesse momento... Mantendo a estabilidade do país e não mergulhando o país na anarquia.”

Punição

Em outubro de 2015, Mourão já havia protagonizado outro episódio polêmico ao criticar o governo e a então presidente Dilma Rousseff. Na ocasião, ele perdeu o Comando Militar do Sul e foi transferido para a Secretaria de Economia e Finanças, um cargo burocrático. Pelo Regulamento Disciplinar do Exército, Mourão poderia ser punido por dar declarações de cunho político, sem autorização de seu superior hierárquico. O ministro da Defesa, Raul Jungmann, sempre esteve a par do ocorrido. A pasta não comentou sobre o caso. O Exército Brasileiro também preferiu não se manifestar.